Versões antigas da Bíblia Sagrada em português


Biblias antigas

QUAL a melhor versão da Bíblia em nossa língua? Eis uma indagação dificílima de ser satisfatoriamente respondida, mesmo porque entram em jogo preferências pessoais nem sempre guiadas por evidências científicas. Como disse abalizado mestre de Crítica Textual: "Nenhuma tradução é perfeita, nem quanto ao presente, nem quanto ao futuro." 

Isto, contudo, não invalida a inerrância bíblica como a Revelação de Deus ao homem, e ela é nossa única regra de de Deus. Isto é paz, mas "para os perversos, diz o meu Deus, não há paz." 

Que o Príncipe da Paz seja convidado de honra da ONU a fim de indicar o verdadeiro caminho da paz, e só então haverá paz na Terra. Mas se o homem não seguir o caminho da verdadeira paz, segundo a vontade de Deus, Ele intervirá, pois S. Pedro explica: 

"Os céus em fogo se desfarão, e os elementos ardendo se fundirão. Mas nós, segundo a Sua promessa, aguardamos novos céus e nova Terra, em que habita a justiça"* 1 S. João 14:27. 2 Isaías 48:18. 3 Isaías 57:21 . 4 I I S. Pedro 3:12 e 13.

A promessa não falha. Jesus voltará para restaurar o Paraíso perdido. Mas, ainda pensando nessa lei internacional, será que com uma lei assim, haverá liberdade de consciência, liberdade para adorar a Deus no Seu dia, conforme ordenou desde a fundação do mundo? Não seria essa lei indício do cumprimento de Apocalipse 13:15? 

BÍBLIAS ANTIGAS


Deixo com o amigo leitor a resposta.  fé e prática. Graças a Deus pela Sua Revelação! Alinhemos, de relance, as principais versões da Palavra de Deus em língua portuguesa. 

Edição Trinitária de 1883 


Tão logo se fundou a Trinitarian Bible Society, em Londres, cuidou de verter o Livro Santo em vários idiomas, inclusive em português, que saiu a lume em 1883. Esta primeira edição da Trinitária é muito disputada pelos adventistas da fala portuguesa, ao ponto de se pagarem somas fabulosas por um exemplar, hoje raríssimo. E por quê? Porque ela registra assim S. Luc. 23:43: 

"E Jesus lhe disse: Na verdade te digo hoje, que serás comigo no Paraíso." 

E Apoc. 22:14: 

"Bem aventurados aqueles que guardam os seus Mandamentos, para que tenham acesso à árvore da vida, e para que entrem na Cidade pelas portas." 

E assim I S. João 3:4: "... pecado é quebrantamento da Lei." 

Estes três textos, assim traduzidos, casam-se maravilhosamente com certos aspectos da doutrina adventista. Também Isa. 42:21: "... engrandecerá Ele a hei, e a fará ilustre." 

Entretanto, tirante esta aparente vantagem, a tradução, no demais, do ponto de vista técnico e diante de novas descobertas da Crítica Textual, deixa muito a desejar, não é recomendável como um todo. A crítica especializada aponta-lhe sérios deslizes tradutórios no Velho Testamento, principalmente em alguns Salmos. 

A parte do Novo Testamento baseou-se no texto Receptus de 1624, que não é bom, e foi superado pelo trabalho de Tischendorf e posteriormente por Westcott and Hort, pelos papiros de Beatty, e mais recentemente pelo famoso e atualíssimo texto de Ebherard Nestle. Ora, os textos gregos modernos estão escoimados de interpolações e inexatidões dos textos antigos, pois o trabalho da Crítica Textual consiste em restaurar, tanto quanto possível, o texto original. 

À guisa de exemplo, citemos a interpolação de I S. João 5:7 e 8, denominada, entre os estudiosos, de comma johanneum, e que consiste nas seguintes palavras: uno Céu, o Pai, o Verbo, e o Espírito Santo: e estes três são um. E três são os que dão testemunho na Terra." 

Estas expressões foram colocadas na margem de uma cópia por um escriba, como comentário exegético, e outro copista as inseriu no texto. O fato é que nenhum manuscrito grego antigo a contém, embora Erasmo a tenha registrado no seu texto, mas devido a uma fraude de que foi vítima. 

Só depois dos séculos 15 e 16 é que apareceu, com freqüência, o "comma johanneum," embora a Vulgata o tenha inserido antes. Ver o que diz nosso SDA Bible Commentary a respeito. A Versão Trinitária traz, embora em grifo, o "comma johanneum," falsa base para a prova da doutrina da Trindade. 

O português desta primeira edição da Trinitária é simplesmente horroroso, arcaicíssimo e deselegante. É freqüente o emprego de termos obsoletos e desusados, como "capros" (Lev. 16:8), "hum," "huma" (em vários passos), "olíbano" (Isa. 66:3), "grança" (Sal. 1: 4 ), "adjurar" (Cant. 2:7), "grã" (Apoc. 17:3), "pontífice" (Heb. 2:17, e outros passos), e sobretudo a inadmissível grafia dos verbos no futuro ("virão," por exemplo). Cacófatos dos piores encontram-se por exemplo em II Sam. 1:3, Gên. 25:30, Ezeq. 45:24; 46:11; Sal. 102:6, Isa. 62:8, I I Cor. 11: 33; Heb. 11:27. 

E um verbo de sentido chulo em S. Luc. 2:6 e 7. A Versão Trinitária de 1883 jamais é referida pelos eruditos, que a consideram destituída de valor crítico. Contudo, para nós adventistas, possui ela valor inestimável por causa da redação de alguns textos que nos são caros. 

Trinitária Revista 


Circula em Portugal, há já algum tempo, uma edição revista da Trinitária, com a linguagem melhorada e atualizada, de acordo com a reforma ortográfica oficializada pela Academia de Ciências de Lisboa. 

Mas não melhorou o conteúdo, e foram alteradas certas redações, inclusive de S. Luc. 23: 43, que agora está como as demais versões: "Na verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso." E ainda conserva boa parte dos cacófatos, e incorreções tradutórias. 

Os próprios evangélicos brasileiros não a apreciam. Fundou-se recentemente em nosso país, a Sociedade Trinitariana do Brasil, com sede em S. Paulo, com permissão de fazer nova revisão da Bíblia Trinitária. No entanto, esta entidade, composta de fundamentalistas extremados e agressivos, ao que indicam suas circulares e publicações, propuseram-se a fazer uma versão bíblica para satisfazer determinada corrente de pensamento evangélico. 

Não creio que nós, adventistas, iremos lucrar com essa anunciada versão. No entanto, aguardemos. 

A Bíblia de Figueiredo 


Erudito português e padre, Antônio Pereira de Figueiredo, teve sua Bíblia completa publicada em 1819. Com base na Vulgata, fez uma tradução péssima, com notórios erros de sentido, além de cacófatos e palavras chulas, ilegíveis em público, como em Êxo. 29:14, Lev. 4:11, Núm. 19:5 e outras que foram retiradas por revisões posteriores. 

Traduziu tendenciosamente I S. Ped. 5:5: "apoiando a honra dos padres," ultimamente revisado e alterado para "obedecei aos mais velhos." Numerosos outros exemplos podiam ser citados. Figueiredo foi o primeiro a verter em português o kuriakê hemera de Apoc. 1:10 por "domingo." É interessante como obra de estudo comparativo de textos, mas não a tenho como a Bíblia de leitura diária. Acho-a deformadíssima. 

Os católicos a reimprimem. Houve editora nacional que a imprimiu em muitos volumes, com comentários e notas. 

Tradução Brasileira 


Feita por uma comissão mista de estrangeiros e nacionais, à qual pertenceram o famoso gramático Eduardo Carlos Pereira, o matemático Antônio Trajano, Hipólito de Campos, e os americanos W . C. Brown, J. R. Smith e J. M . Kyle. 

Em 1917 publicou-se a primeira edição completa, feita diretamente dos originais com o auxílio dos textos de Figueiredo e Almeida. Linguagem primorosa e até poética em alguns pontos. Grave erro foi manter os nomes próprios exatamente como nos originais o que, a meu ver, a condenou à repulsa do povo, que achava estranho e difícil ler, por exemplo Nebuchadnezzar, em vez de Nabucodonosor. 

Devido à pouca aceitação, sua reedição foi sustada. O que é pena, pois é boa tradução. 

Bíblia do Padre Matos Soares 


Feita em Portugal, difundida a partir de 1932, com notas explicativas no rodapé, algumas absurdas e até ingênuas, mas com evidente objetivo de marcar a teologia romana. 

O próprio texto é entremeado de palavras acrescentadas em grifo, entre parêntesis, aparentemente para elucidar o sentido, mas na verdade para forçar a teologia católica. Por exemplo: para querer provar a vingança de Deus, assim verte I I Tim . 2:13: "Se não crermos (se formos infiéis), ele permanece fiel (às suas promessas e às suas ameaças"), não pode negar-se a si mesmo (deixando de nos castigar). Absurdo! 

Coisas piores há nessa versão. Muda arbitrariamente o tempo dos verbos em I Tim . 3:12; 3:2 e Tito 1:6, dizendo que o bispo e o diácono "tenham desposado" uma só mulher, ou "tenha tido" uma só mulher, sugerindo que, no momento da ordenação, deviam estar viúvos. 

Isto para combinar com o dogma do celibato clerical. Tradução péssima. Incorreta e tendenciosa. Só serve para comparações críticas. Para leitura diária é inviável. 

Editora Ave Maria 


Presentemente está sendo muito difundida, entre católicos, essa versão. Feita sob os auspícios do Centro Católico de S. Paulo, com base na versão francesa dos monges beneditinos da Bélgica. Na verdade é tradução de tradução. Bem melhor do que a de Matos Soares. Em Ecles. 12:7 traduz "Sopro de vida" em vez de "espírito." Das edições católicas, em português, é a melhor que conhecemos, embora com muitas incorreções. 

Almeida Antiga 


João Ferreira de Almeida escreveu sua Bíblia em Batávia, então capital de Java, onde se achava por medida de segurança, temendo a Inquisição. Do texto original de Almeida pouca coisa resta, tantas foram as revisões que sofreu. 

O preparo acadêmico de Almeida era discutível, o texto grego de que se serviu para o Novo Testamento não era bom, embora fosse 0 melhor da época: o Receptus. Antes fizera um N T baseado no Códice de Beza, parte latina, depois abandonado. 

Almeida sofreu influência holandesa, de seus coadjutores. O Velho Testamento ficou inacabado até Ezequiel, quando Almeida faleceu em 1691. Só em 1753 foi publicada a Bíblia toda. Novas edições e revisões ocorreram em 1765, 1773, 1811, 1875, 1879 e 1894. 

A mais importante se fez no Brasil, em 1942, pela Casa Publicadora Batista, que a imprime presentemente para um organismo denominado Imprensa Bíblica Brasileira. A linguagem da Almeida Antiga deixa muito a desejar, é dura, e não foi totalmente escoimada de disfonias e cacófatos, alguns bem grosseiros, como em Rute 1:15; I I Sam. 1:3; Ezeq. 45:24; Isa. 62:8 e outros passos. 

Mantém inexplicavelmente a interpolação de 1 S. João 5:7 e 8, denominada "comma johanneum," a falsa prova da Trindade. Acontece que o povo evangélico brasileiro, de mais de uma geração, acostumou-se a ela, decorando muitos de seus versículos, plasmando-os no pensamento. Daí o não acostumar-se com uma versão moderna e alterada, embora para melhor. Muitos a preferem a qualquer outra. Mas é sofrível. 

Almeida Revista e Atualizada 


Revisão revolucionária feita pela Sociedade Bíblica do Brasil, totalmente escoimada de malsonâncias e cacofonias, redigida em vernáculo castiço e primoroso. As últimas edições indicam entre colchetes textos ou porções que não constam dos mais antigos manuscritos. Foi eliminado o "comma johanneum" de I S. João 5:7 e 8. 

A Bíblia completa foi primeiramente publicada em 1959. Afora alguns preciosismos literários, isto é, emprego de termos rebuscados e eruditos como: "sachar" (Isa. 5:2 e 6 ), "acrisolar" (Sal. 66:10; Jer. 9:7), "excogitar" (Sal. 64:6), "prevaricações" (Êxo. 33:10), "inculcando-se" (Rom. 1:22), "adágio" ( I I S. Ped. 2:22), "gazofilácio" (S. Luc. 21:1), a linguagem é a melhor que conhecemos de quantas versões bíblicas existem em nossa língua. Contudo, ainda não é a tradução ideal. 

Padece de muitos senões. A tradução de alguns salmos é discutível, principalmente Sal. 91:1-3, e a crítica especializada aponta-lhe outros lapsos de tradução, além da acusação de caminhar para o ecumenismo *e o modernismo teológico. 

Alguns senões, contudo, estão sendo sanados, como Atos 17:2 que voltará a registrar "por três sábados" em vez de "por três semanas." Ainda, a nosso ver, poderiam ser revistos Sal. 77:13, Prov. 18:24, Apoc. 20:13, Lev. 16:8 e outros passos. 

Concluindo direi que, apesar dos senões que contém, a Almeida Revista e Atualizada é ainda o melhor texto da Bíblia em português. O mais gostoso de se ler. 

Outras Versões Ultimamente têm surgido novas versões católicas, em grandes volumes, e até em fascículos, como A Bíblia Mais Bela do Mundo, e outra editada pela Barsa. O texto é bom de se ler, mas todas padecem da tendenciosidade peculiar das edições católicas, que é abonar os dogmas da Igreja. Devem ser lidas como obras de consulta e comparação.


FONTE: A. B. CHRISTIANINI Rev. Adventista Dez/1969