NA tentativa infeliz de defender o dia espúrio, o opositor se vale da tecla surradíssima dos "acontecimentos" que se deram no dia em que Jesus ressuscitou. A que se reporta para citar estes "acontecimentos"? Às informações dos evangelistas, interpretando-as a seu modo.
De início, lembremo-nos do seguinte: Embora variem as opiniões quanto às datas em que se escreveram os Evangelhos, o fato é que foram escritos depois da metade do primeiro século. Um autor atribui as seguintes datas:
S. Marcos em 61 A. D., ou 30 anos depois da ressurreição.
S. Mateus em 62 A. D., ou 31 anos depois da ressurreição.
S. Lucas em 64 A. D., ou 33 anos depois da ressurreição.
S. João em 97 A. D., ou 66 anos depois da ressurreição.
Isto é importante. Se o dia de repouso houvesse sido alterado, e o domingo fosse ponto líquido e certo naquela época, sem dúvida os evangelistas a ele se refeririam de modo especial. Pelo menos o nome do dia seria mudado. Tal, porém, não te deu. Os apóstolos não se referem a ele como dia santificado, dia de guarda, ou que devesse substituir o sábado. Referem-se apenas, incidentalmente, ao "primeiro dia da semana"... Mera referência circunstancial necessária a uma descrição pormenorizada com o objetivo de provar que Jesus quebrou os grilhões da morte e apareceu redivivo a muita gente.
A autorizada Schaff-Herzog Encyclopedia of Religious Knowledge, vol. 4, 3.ª edição, pág. 2.559, artigo "Sunday" declara:
"O domingo (dies solis, do calendário romano, 'dia do Sol', por ser dedicado ao Sol), o primeiro dia da semana, foi adotado pelos primitivos cristãos como dia de culto. O 'Sol' da adoração dos latinos, era por eles interpretado como o 'Sol da Justiça'... Nenhuma forma para sua observância consta do Novo Testamento, nem, na verdade, esta observância é sequer imposta."
Quanto ao fato em si da ressurreição de Cristo, já estudamos em capítulo anterior, onde vimos que ela não se relaciona com nenhuma mudança do sábado do Decálogo. Cremos que a obra redentora se consumará na Sua segunda vinda, quando os remidos serão efetivamente trasladados para o reino eterno, naquele "sabatismo que resta para o povo de Deus." (Heb. 4:9. Versão Brasileira).
Diz o oponente que Jesus apareceu cinco vezes aos discípulos, e que isso é motivo para a ab-rogação do sábado do decálogo, ou justifica a observância do domingo, o que é a mesma coisa. Ora, de uma leitura atenta, imparcial, despreconcebida dos próprios textos que citou, se depreende que seriam bem naturais aqueles encontros. Os discípulos se reuniram. Nem podia ser de outra forma. Pessoas com os mesmos ideais, aquecidas pela amizade, todas decepcionadas com a morte brutal do Mestre... Era natural que se encontrassem e se reunissem para conforto recíproco. Notemos contudo, de que maneira e para que se reuniram. Acaso seria com o propósito de inaugurarem o novo dia de guarda, o domingo? Teriam o propósito deliberado de comemorar a ressurreição da Senhor? De modo nenhum! Isso nem lhes passava pela mente. Ora, contentemo-nos com o que a Bíblia diz. Segundo a relato escriturístico (único que merece fé) depreendemos:
Reuniram-se para cear. Prova: S. Mar. 16:14.
b) Reuniram-se para fugir à perseguição, ao escárnio e à crítica, a portas trancadas "com medo dos judeus". Prova: S. João 20:19.
c) Reuniram-se orem NÃO ACREDITAVAM na ressurreição. Prova: S. Luc. 24:37; S. Mar. 16:11, 13 e 14. (Mesmo dias depois, um deles não era na ressurreição. S. João 20:24-27).
d) A fórmula "Paz seja convosco" é saudação oriental comum (S. Luc. 10:5), e naquele momento Jesus a proferiu com o objetivo de acalmar os temores das discípulos, pois se achavam em grande angústia e atemorizadas.
e) A ceia deles era tão normal, que o próprio Jesus participou dela, comendo parte de um peixe assado e mel. S. Luc. 24:43. Cristo não a transformou em solenidade religiosa, nem lhes sugeriu que comemorassem Sua ressurreição, ou ainda que fizessem daquele dia um dia de guarda em substituição ao sábado. Seria a oportunidade para isso.
f) O soprar cristo sobre eles, outorgando-lhes o Espírito Santo, significou ordená-los para a grande obra que haveriam de fazer, porém a plenitude do Espírito, ou melhor, do poder lhes sobreveio por ocasião do Pentecostes. Mesmo isso não tem a menor relação com o dia de repouso.
Em S. João 20:26 há a expressão: "E oito dias depois". Sobre isto há diversidade de opiniões, o que não autoriza a afirmar que se refere ao domingo seguinte. É uma temeridade firmar doutrina sobre ponto que não é pacífico. É mais razoável que fosse um segunda-feira.
O encontro de Jesus com os discípulos junto ao mar de Tiberíades, relatado em S. João 21 não autoriza nada em matéria de dia e repouso. As Escrituras não dizem que dia era esse. Se fosse no domingo, comprometeria os advogados da observância desse dia porquanto os discípulos estavam trabalhando.... Haviam retornado à profissão de pescadores. Certamente não estavam guardando o dia.
Os oponentes do sábado bíblico procuram tecer a defesa dominguista nestas pouquíssimas passagens em que consta acidentalmente o "primeiro dia da semana".
O DR. WILLIAM SMITH, teólogo protestante e doutor de leis, em seu célebre Dicionário da Bíblia, pág. 366, embora advogando a vigência do domingo, reconhece a escassez de provas e admite honestamente o seguinte em relação a esses textos:
"Tomadas separadamente, talvez, ou mesmo todas em conjunto, estas passagens se nos afiguram não muito adequadas para provar que a dedicação do primeiro dia da semana ao propósito acima mencionado [dia de repouso em honra da ressurreição] fosse matéria de instituição apostólica, ou mesmo uma prática dos apóstolos".
Os evangélicos mais esclarecidos reconhecem a fragilidade da base dominguista em textos bíblicos. Não a usam mais.
O oponente menciona o Pentecostes como tendo ocorrido sem sombra de dúvida no domingo e pretende que isso também abone a observância desse dia. Temos aí outro castelo de cartas. Não há prova de que o derramamento o Espírito tenha ocorrido exatamente num "primeiro da semana". As Escrituras não o afirmam. Há grande número de comentaristas e estudiosos que discordam dessa opinião, citemos alguns:
OLSHAUSEN, festejado comentador alemão, analisando Atos 2, conclui:
"Ora, desde que, de acordo com as informações de que dispomos quanto à época da Festa, a Páscoa, no ano da morte do Senhor, ocorreu de modo que o primeira dia da Festa durou de quinta-feira às seis horas da tarde até sexta-feira à tarde à mesma hora, segue-se naturalmente que a partir de sexta-feira às seis horas da tarde é que deviam começar a ser contados os cinqüenta dias. O qüinquagésimo dia ocorreu, ao que parece, num sábado."
JENNINGS, no livro Jewish Antiquities, conclui seu argumento em torno deste assunto, afirmando:
"O dia de Pentecostes deve ter caído no sábado, o dia judaico de repouso."
O DR. ALBERTO BARNES, festejado comentarista presbiteriano, afirma: "Se fossem seguidas as idéias dos fariseus, e o Senhor Jesus com eles tivesse observado a Páscoa na terça-feira – como muitos supõem –então o dia de Pentecostes teria ocorrido no dia judaico de repouso, ou seja, na sábado. É impossível determinar a verdade neste assunto."
O Prof. H. B. HACKETT, lente de Literatura Bíblica no famoso Instituto Teológico Newton, no seu Commentary on the Original Text of the Acts, à pág. 40, diz:
"Supõe-se geralmente que este Pentecostes, assinalado Pelo derramamento da Espírito, recaiu no dia judaico de repouso, ou sábado."
O Deão ALFORD, no seu New Testament for English Readers, afirma:
"Esta questão a respeito de que dia de semana ocorrera este dia de Pentecostes, é cercada de dificuldades, tendo em vista a questão da última Páscoa de nosso Senhor. ... Parece provável, contudo, que ocorreu no sábado, isto é, se contarmos a partir do sábado 16 de Nisan,"
Poderíamos alinhar outras citações de autores eminentes como LIGHTFOOT, KUINOL, HITZIG, WEISLER e outros que sustentam a mesma opinião.
À vista disso, é uma temeridade afirmar que o Pentecostes mencionado em Atos 2 tenha ocorrido no domingo.
E ainda que se pudesse provar que tal acontecera, nada justifica a mudança do dia de repouso, pois no relato dos acontecimentos desse Pentecostes não há a mais leve alusão a isso, e a aglomeração de pessoas em Jerusalém oferecia excelente oportunidade para o poderosíssimo trabalho missionário que os apóstolos realizaram. Não importava o dia, mas a oportunidade...