10 A RECOMPENSA DO CONQUISTADOR DE ALMAS

Conquistador de almas


Quando vinha vindo para esta reunião, notei no quadro de avisos do posto policial um letreiro bem visível oferecendo grande RECOMPENSA a quem pudesse descobrir e levar à justiça os perpetradores de um tremendo crime. 


Sem dúvida os nossos legisladores sabem que a esperança de uma enorme recompensa é a única força motivadora que terá poder sobre os companheiros dos assassinos. O informante comum é alvo de tanto desprezo e ódio, que poucos podem ser induzidos a ocupar esse lugar, mesmo quando se oferecem montões de ouro. O melhor que se pode dizer disso é que é um pobre negócio. 


É muito mais agradável lembrar que há recompensa para o trabalho de levar os homens a misericórdia, recompensa de classe muito mais elevada do que o prêmio por levar homens à justiça. Além disso, e há muito mais ao nosso alcance, sendo este um ponto prático que merece a nossa atenção. 


Nem todos podemos sair à caça de criminosos, mas todos podemos tratar de resgatar os que perecem. Graças a Deus, que os assassinos e ladrões são relativamente poucos, mas os pecadores que precisamos buscar e salvar são verdadeiros enxames à nossa volta, em toda parte. Eis ai o campo de ação de vocês todos. E ninguém precisa considerar-se excluído das recompensas que o amor confere a todos os que lhe prestam serviço. 

À simples menção da palavra RECOMPENSA, alguns tapam os ouvidos e resmungam: "Legalismo!" Mas a recompensa de que falamos não se refere a dividas, e sim à graça, e é desfrutada, não como orgulhosa presunção de merecimento, mas, sim, com o agradecido deleite da humildade. 

Outros amigos murmurarão: "Não é este um motivo baixo e mercenário?" Replicamos que é tão mercenário como o foi o espírito de Moisés, que "contemplava o galardão". Nesta matéria, tudo depende de qual a recompensa; e se acontece tratar-se da alegria de fazer o bem, o consolo de ter glorificado a Deus, e a bem-aventurança de ter agradado ao Senhor Jesus – então a aspiração por obter a permissão de empenhar-nos na salvação dos nossos semelhantes impedindo-os de cair no abismo, é em si mesma uma graça dada pelo Senhor. E se não tivermos bom êxito nessa aspiração, ainda assim o Senhor dirá dela o que disse da intenção que Davi teve de edificar um templo: "Foi bom estar isso no teu coração". Ainda que as almas que buscamos hajam de persistir na incredulidade, ainda que todas elas nos desprezem, nos rejeitem e nos ridicularizem, não obstante será uma obra divina fazer ao menos a tentativa de ganhá-las. Ainda que não caiam chuvas da nuvem, ela serve para amainar o calor do sol. Não está tudo perdido, se não se realiza o propósito maior. Se tão somente aprendermos a juntar-nos ao Salvador em Suas lágrimas, e clamar com Ele: "Quantas vezes quis eu ajuntar-vos e não quisestes!" É sublime ter a permissão de ficar na mesma plataforma de Jesus, e chorar com Ele. Nós somos os beneficiados com tais tristezas, mesmo que outros não o sejam. 

Graças a Deus, porém, os nossos trabalhos não são vãos, no Senhor. Acredito que, dentre vocês, a maior parte dos que já experimentaram de fato, no poder do Espírito Santo, mediante o ensino da Escritura e a oração, levar outros a Jesus, teve sucesso. Talvez esteja falando a uns poucos que não se saíram bem. Se for este o caso, recomendo a estes que examinem com zelo e sinceridade o seu motivo, o seu espírito, o seu trabalho e a sua oração, e então comecem de novo. Talvez venham a lançar-se ao trabalho com mais sabedoria, com mais fé, com mais humildade e com mais poder do Espírito Santo. Devem agir como agricultores que, depois de uma colheita pobre, tomara a lavrar à terra, cheios de esperança. Não devem desanimar. Muito ao contrário, devem erguer-se com ânimo forte. Devemos estar desejosos de encontrar logo a razão do nosso fracasso, e estar dispostos a aprender de todos os nossos colegas. Mas temos que erguer com firmeza a rosto, se é que por algum meio podemos salvar alguns; decididos a, aconteça o que acontecer, fazer todas as tentativas possíveis com vistas á salvação daqueles que nos cercam. Como poderemos suportar sair do mundo sem levar conosco em regozijo os feixes? Acredito que a maioria dos que aqui nos reunimos para orar, tem tido êxito, além da nossa expectativa. Deus nos tem abençoado, não além dos nossos desejos, mas ainda além das nossas esperanças. 

Muitas vezes fico surpreso diante da misericórdia de Deus para comigo. Pobres sermões meus, que me fizeram chorar depois de chegar em casa, levaram dezenas à cruz. E coisa mais maravilhosa ainda, palavras que pronunciei em conversações comuns, simples sentenças casuais, como os homens lhes chamam, têm sido, não obstante, quais setas aladas vindas de Deus, atingido o coração dos homens e levando-s feridos aos pés de Jesus. Muitas vezes, cheio de espanto, levantei minhas mãos, dizendo: "Como pode Deus abençoar tão frágil instrumento?" Este é o sentimento da maioria dos que se dedicam ao bendito oficio de pescar homens, e o desejo desse tipo de sucesso dá-nos um motivo tão puro que poderia comover o coração de um anjo. Motivo na verdade tão puro que influiu no Salvador: pelo gozo que estava posto diante dEle, suportou a cruz, desprezando a afronta. "Porventura teme Jó a Deus debalde?", disse Satanás. Se a resposta pudesse ser afirmativa, se se pudesse provar que o homem integro e justo não encontrou recompensa para o seu santo viver, então Satanás teceria críticas contra a justiça de Deus e incitaria os homens a renunciarem a um serviço tão sem proveito. 

Verdadeiramente há recompensa para o justo, e nas elevadas atividades da graça há prêmios de infinito valor. Quando nos esforçamos para levar homens a Deus, realizamos um trabalho muito mais proveitoso do que o mergulho do pescador de pérolas e a busca do garimpeiro de diamantes. Nenhuma ocupação dos mortais se pode comparar com a de ganhar almas para Cristo. Sei o que digo quando os concito a considerar essa atividade como os homens consideram o entrar no quadro dos ministros de Estado, ou o ocupar um trono. É uma carreira real, e os que a seguem com êxito são verdadeiros reis.

A seara do serviço dos fiéis ainda não está pronta para a ceifa; "com paciência esperamos por ela". Mas temos penhores da remuneração que nos cabe, reanimadoras promessas daquilo que é depositado no céu para nós. Em parte, essa recompensa está na própria obra que realizamos. Muitos vão caçar e atirar por puro amor ao esporte. Por certo, numa esfera infinitamente mais alta, podemos sair à caça de almas para Cristo para simples satisfação da nossa boa vontade. Para alguns de nós seria uma desgraça insuportável ver pessoas afundando no inferno, e não fazer nenhum esforço a favor da sua salvação. É-nos recompensa poder dar expressão ao nosso zelo interior. Causar-nos-ia pena e aborrecimento sermos excluídos daquelas santas atividades que visam a tirar tições das chamas. Profundamente compassivos para com os nossos semelhantes, sentimos que, em certa medida, o seu pecado é o nosso pecado, e o perigo que correm e o que corremos. 

Se da rota sai alguém, 

meus pés se perdem também.

Se outro cai na perdição, 

também dói meu coração. 

Portanto, é um alivio expor o evangelho, para que nos livremos desse sofrimento empático, que faz ecoar em nossos corações o estrondo da queda da alma. 

A conquista de almas é um serviço que traz grande benefício á pessoa que a ele se consagra. O homem que vela por uma alma, ora em seu favor, elabora planos para ganhá-la, fala-lhe com temor e tremor, e se esforça para causar-lhe impressão, edifica-se mediante o esforço feito. Se sofre decepção, clama a Deus com maior fervor, tenta de novo, ergue os olhos para a promessa com vistas à solução do problema do réu convicto, volve para aquele ponto do caráter divino que parece ter mais probabilidade de fortalecer a fé vacilante, e em cada passo ele próprio está recebendo beneficio. Quando conta a velha história da cruz ao penitente a chorar, e afinal toma pela mão alguém que pode dizer coisas como esta : "Eu creio sim, sim eu crerei, que Jesus Cristo morreu por mim" – digo que tem sua recompensa no processo que a sua própria mente seguiu. 

Esse processo o faz recordar a sua própria condição de perdido; mostrar-lhe as lutas travadas pelo Espírito para levá-lo ao arrependimento; fá-lo recordar aquele precioso momento em que olhou para Jesus pela primeira vez; e o fortalece em sua firme confiança de que Cristo salva pecadores. Quando vemos Jesus salvar alguém, e vemos aquela maravilhosa transfiguração que perpassa o rosto do salvo, a nossa fé recebe grande confirmação. Os céticos e os chamados homens modernos têm pouco que ver com os convertidos, pois os que labutam por conversões crêem em conversões. Os que observam os processos decorrentes da regeneração, vêem a realização de um milagre e estão certos de que "isto é o dedo de Deus". É o mais bem-aventurado exercício para uma alma, o mais divino enobrecimento do coração, gastar-nos no labor de buscar e levar outros aos pés do Redentor. Se a obra terminasse aí, seria o bastante para darmos graças a Deus por nos haver chamado para um serviço tão consolador, tão fortalecedor, tão enaltecedor e tão excelente para confirmar-nos, como o de levar outros a converter-se dos seus maus caminhos. 

Outra valiosa recompensa acha-se na gratidão e no afeto daqueles que vocês levam a Cristo. Esta é uma dádiva seleta – a bem-aventurança de alegrar-nos com a alegria de outrem, a bênção de saber que levamos uma alma a Jesus. Meçam a doçura desta recompensa com o amargor do seu oposto. Homens de Deus há que levaram muitos a Jesus, e tudo correu bem na igreja; até que, devido à idade ou às mudanças da moda, o bom homem foi lançado na sombra, e então os próprios filhos espirituais do ministro se mostraram impacientes a ponto de pô-lo para fora. 

De todos os ferimentos recebidos, o mais doloroso foi causado por aqueles que lhe deviam suas almas. Com o coração quebrantado, ele suspirava: "Eu poderia ter suportado isto, se não fossem as pessoas que levei ao Salvador que se voltaram contra ruim". Essa angústia não me é desconhecida. Nunca posso esquecer certa casa de família no seio da qual o Senhor me deu a grande alegria de levar quatro patrões e várias pessoas que trabalhavam para eles aos pés de Jesus. Arrancados do mais descuidado mundanismo, esses que antes nada sabiam da graça de Deus, eram agora jubilosos adeptos da fé. Depois de algum tempo, absorveram certas opiniões diferentes das nossas e, a partir dessa ocasião, alguns deles não tinham senão duras palavras para mim e minha pregação. Eu tinha feito o melhor que pudera para ensinar-lhes toda a verdade que eu conhecia e, caso tivessem encontrado mais do que eu descobrira, podiam ao menos lembrar-se de onde aprenderam os princípios elementares da fé. Faz anos que isto aconteceu, e eu nunca falara tanto sobre o fato, até hoje. Mas a ferida me doeu muito. Menciono estas ferroadas agudas somente para demonstrar quão doce é ter ao seu redor aqueles que vocês levaram ao Salvador. 

É grande o prazer que a mãe sente em relação aos filhos, pois um amor intenso surge através do relacionamento natural. Mas é muito mais profundo o amor ligado ao parentesco espiritual, amor que dura a vida toda e continua na eternidade, pois mesmo no céu cada um dos servos do Senhor dirá : "Eis aqui estou eu, e os filhos que Deus me deu". Na cidade do nosso Deus não se casam nem se dão em casamento, mas a paternidade e a fraternidade em Cristo subsistirão. Aqueles doces e benditos laços que a graça formou continuam para sempre, e as relações espirituais desenvolvem-se, em vez de se dissolverem, com a transferência para a terra melhor. 

Se vocês anseiam por alegria real que sempre ocupa o seu pensamento e com a qual sonham, estou persuadido de que nenhuma alegria causada pela riqueza, nenhuma alegria provinda do conhecimento progressivo, nenhuma alegria dada pela capacidade de influir nos semelhantes, nem qualquer outra espécie de alegria se pode jamais comparar com o júbilo que vem de salvar da morte uma alma, e de ajudar nossos irmãos desviados a se reintegrarem na casa do Pai. Falam em um milhão de recompensa! Isso não é nada. Qualquer pessoa poderia gastar facilmente essa quantia. Mas ninguém pode esgotar os indescritíveis deleites provenientes da gratidão das almas convertidas do erro dos seus caminhos. 

A mais rica recompensa, porém, consiste em agradar a Deus, e propiciar ao Redentor que veja o fruto do trabalho da Sua obra. Compete ao Pai Eterno ver que Jesus obtenha a Sua recompensa. Mas o maravilhoso é que devemos ser empregados pelo Pai para compensar a Cristo pelas Suas agonias. É maravilha das maravilhas! Ó minha alma, esta é uma honra demasiado grande para ti! Bênção profunda demais para as palavras! Caros amigos, ouçam e me respondam. Que dariam para causar um estremecimento de agrado no coração do Bem-amado? Recordem o preço de aflição que Ele pagou por vocês, a agonia que O atravessou para que pudesse livrá-los dos seus pecados e de suas conseqüências. Não é seu desejo deixá-lo contente? Quando levam outros aos pés de Cristo, dão-lhe alegria, e não pequena. 

Não é maravilhoso aquele texto que diz: "Há alegria diante dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende"? Qual é o seu significado? Que os anjos se alegram? Geralmente o entendemos assim, mas não é a intenção do versículo. O que diz é : "Há alegria diante dos anjos de Deus" – isto é, alegria no coração de Deus, ao redor de cujo trono os anjos estão. É alegria que os anjos contemplam com prazer. Que alegria é? Será Deus capaz de ter alegria maior do que a Sua ilimitada felicidade? Espantoso linguajar este! Não podendo ser aumentada, a infinita bem-aventurança de Deus é manifestada mais eminentemente. Podemos nós ser instrumentos disto? Podemos fazer algo que alegre o Bem-aventurado eterno? Sim, pois se nos diz que o grande Pai regozija-se acima de toda medida quando o Seu filho pródigo, que estava morto, reviveu, o que se perdera foi achado. 

Se eu pudesse dizê-lo como devia, faria todo cristão bradar: "Então eu vou labutar para levar almas ao Salvador", e faria aqueles de nós que temos levado muitos a Jesus, lançar-nos ao urgente empenho, a tempo e fora de tempo, em levar outros mais a Ele. Dá-nos grande satisfação fazer alguma amabilidade a um amigo terreno, mas fazer definidamente algo por Jesus, algo que, de todas as coisas do mundo, mais O agrade, é um grande prazer! É boa ação construir um prédio para reuniões e doá-lo prontamente à causa de Deus, se se faz isto por motivo justo e apropriado. Mas uma pedra viva, assentada sobre o sólido alicerce por nossa instrumentalidade, dará maior satisfação ao Senhor do que se levantássemos uma enorme pilha de pedras naturais que só poderia atravancar o terreno. Portanto, caros irmãos, é bom ir, procurar e levar aos pés do Salvador os seus filhos, vizinhos, amigos e parentes, pois nada agradará mais a Cristo do que vê-los voltar-se para Ele e viver. Pelo amor que têm a Jesus eu lhes rogo: sejam pescadores de homens.