Irmãos, por diversas vezes lhes falei sobre a conquista de almas – o ofício mais nobre de todos. Oxalá vocês todos se tornem, neste sentido, poderosos caçadores diante do Senhor, levando muitos pecadores ao Salvador. Desta vez quero dizer-lhes algumas palavras sobre os obstáculos existentes em nosso caminho quando procuramos ganhar almas para Cristo.
São muitos. Não posso nem tentar classificá-los por completo. Mas o primeiro e o mais difícil deles é, sem dúvida, a indiferença e a inércia moral dos pecadores. Nem todos os homens são igualmente apáticos. Na verdade, existem pessoas que parecem ter uma espécie de instinto religioso que as influencia para o bem, muito tempo antes de terem algum amor para com as coisas espirituais.
Mas há distritos, principalmente distritos rurais, onde prevalece a indiferença. E o mesmo estado de coisas existe em várias partes de Londres. Não se trata de incredulidade; é que o povo ali vive tão despreocupado da religião, que nem chega a opor-se a ela. Não se preocupa como que pregarmos, nem com o lugar onde pregamos, porquanto não tem o menor interesse pela questão.
Não pensa em Deus nem se ocupa de nada concernente a Ele nem a Seu serviço. Usa o nome de Deus somente de modo profano. Já observei muitas vezes que todo lugar em que as pessoas têm pouco que fazer é ruim para o esforço religioso. Entre os nativos da Jamaica, sempre que escasseava o trabalho, havia pouca prosperidade nas igrejas. Posso indicar distritos que não ficam longe daqui, onde há estagnação na esfera do trabalho. E ali poderão verificar que pouco bem se faz. Ao longo do vale do Tâmisa há lugares em que um homem poderia pregar até pôr os bofes de fora, e até se matar. Nessas regiões se faz pouco ou nenhum bem, como também as atividades comerciais e industriais são quase inexistentes.
Agora, caro irmão, toda vez que você deparar com a indiferença onde pregar – quer seja a indiferença afetando o seu rebanho, quer parecendo influir até nos líderes da sua igreja – que deverá fazer? Bem, a única esperança de sobrepujá-la é dobrar o seu próprio fervor. Seja o seu zelo sempre vívido, veemente, ardente, chamejante, consumidor Desperte a igreja de algum modo. E se todo o seu empenho ardoroso parecer vão, continue a chamejar e a arder. E se isso não produzir efeito em seus ouvintes, porta para outro lugar, seguindo a direção do Senhor. É bem provável que esta indiferença ou apatia exerça má influência sobre a nossa pregação. Mas temos que reagir e pelejar contra ela, e que procurar despertar-nos e também os ouvintes. Prefiro enfrentar um ardente e ativo adversário do Evangelho a enfrentar alguém negligente ou apático. Não podemos fazer muito com a pessoa que não quer falar de religião, nem quer vir ouvir-nos o que temos para dizer-lhe sobre as coisas de Deus. Seria melhor lidar com um incrédulo declarado, mesmo que fosse um verdadeiro leviatã. recoberto de escamas de blasfêmia, do que com um simples verme da terra que se esquiva, fugindo ao nosso alcance.
Outro enorme obstáculo à tarefa de ganhar almas é a incredulidade. Vocês sabem o que está escrito sobre o Senhor Jesus, que "chegando à Sua terra. . . não fez ali muitas maravilhas, por causa da incredulidade deles". Este mal existe no coração de todos os não-regenerados, mas em alguns assume forma por demais pronunciada. Pensam em religião, mas não crêem na verdade de Deus que lhes proclamamos. Consideram de maior peso e mais digna de crédito a sua própria opinião do que as declarações inspiradas de Deus. Não aceitam nada do que está revelado nas Escrituras. É difícil persuadir essas pessoas. Advirto-os, porém, a que não as combatam com as armas delas. Não creio que os incrédulos possam ser conquistados por meio de argumentos; ou se acontece isso é raro.
O argumento que convence os homens da veracidade da religião é aquele que eles deduzem da santidade e do fervor dos que se professam seguidores de Cristo. Geralmente levantam barricadas em sua mente contra os assaltos da razão. E se usarmos o púlpito para discutir com eles, freqüentemente estaremos fazendo mais mal do que bem. Com toda a probabilidade, uma diminuta parte ao nosso auditório compreenderá aquilo de que estivermos falando. E conquanto estejamos tentando fazer-lhes bem, o mais provável é que estejamos ensinando incredulidade a outros que nada sabem dessas coisas, e o primeiro conhecimento que estes obtêm de certas heresias chega-lhes vindo dos nossos lábios. É possível que nossa refutação do erro não seja bem feita, e a mente de muitos jovens poderá ficar tingida de descrença após ter-nos ouvido tentar expor o mesmo. Creio que vocês derrotarão a descrença com sua fé, antes que com sua razão. Mediante a fé e um procedimento coerente com a sua convicção da verdade, vocês conseguirão mais do que através de qualquer argumentação, por poderosa que seja.
Tenho um amigo que me vem ouvir praticamente todos os domingos. Um dia me perguntou: "Sabe de uma coisa? Você é o único que me liga às realidades superiores, mas o considero um homem terrível, pois não tem a menor simpatia por mim". Respondi: "Não, de fato não tenho. Ou melhor, não tenho a menor simpatia por sua incredulidade". "Isto me leva a apegar-me a você", disse ele, "pois temo que continuarei sendo sempre o que sou. Mas quando vejo sua fé serena, e entendo como Deus o abençoa pelo exercício dessa fé, e sei quanto consegue realizar pelo poder dela, digo a mim mesmo: 'João, você é tolo.' " Disse-lhe: "Está bem certa essa sua opinião. E quanto mais depressa passe a pensar como eu, melhor. Porque não há maior tolo do que aquele que não crê em Deus". Um dia destes espero vê-lo convertido. Há uma batalha contínua entre nós, mas nunca respondo aos deus argumentos. Uma vez lhe disse: "Se me acha mentiroso, tem liberdade de pensar assim, se quiser. Mas testifico o que conheço, e afirmo o que tenho visto, provado, apalpado e sentido. Você devia acreditar-me, pois enganá-lo não me dá lucro nenhum".
Eu teria sido derrotado por esse homem há muito tempo, se o tivesse alvejado com as bolinhas de papel da razão. Portanto , aconselhe-os a combaterem a incredulidade com a fé, a falsidade com a verdade, jamais cortando e desbastando o Evangelho na tentativa de encaixá-lo nas tolices e fantasias dos homens.
Um terceiro obstáculo no caminho da conquista de almas é aquela fatal protelação muito comum entre os homens. Não sei se, em termos gerais, este mal não está mais espalhado e não é mais nocivo do que a indiferença, a inércia moral e a incredulidade de que falei, Muita gente nos diz o que Félix disse a Paulo: "Por agora vai-te, e em tendo oportunidade te chamarei". Esse tipo de gente chega na fronteira e parece estar a alguns passos da terra do Emanuel; todavia, esquivam de nossas arremetidas e nos despacha dizendo: "Muito bem, vou pensar nisso; logo tomarei uma decisão". Não há nada como pressionar os homens a que tomem rapidamente uma decisão, e levá-los a resolver prontamente esta importantíssima questão. Não importa se achem defeito em nosso ensino; é sempre certo pregar o que Deus diz, e Sua Palavra convida: "Eis agora o tempo sobremodo oportuno, eis agora o dia da salvação".
Isto me induz a mencionar outro obstáculo à conquista de almas, obstáculo semelhante ao anterior mas que toma outra forma, a saber, a segurança carnal. Muitos se imaginam inteiramente a salvo. Não submeteram à prova o alicerce sobre o qual edificam para ver se é sólido e firme, mas supõem que tudo vai bem. Se não são bons cristãos, podem
ao menos dizer que são melhores do que alguns que são ou se dizem ser cristãos. E se lhes falta algo, podem a qualquer momento dar o retoque vital e ficar prontos para comparecer à presença de Deus. Deste modo, nada temem; ou se chegam a ter algum medo, não vivem com medo constante daquela perdição eterna que sofrerão os alienados da presença de Deus e da glória do Seu poder – que com toda a certeza será o seu destino, a menos que se arrependam e creiam no Senhor Jesus Cristo.
Contra em gente devemos trovejar dia e noite. Proclamemos-lhes claramente que o pecador descrente "já está condenado" e que por certo perecerá eternamente se não puser sua confiança em Cristo. De tal moda devemos pregar que façamos cada pecador tremer no banco em que se assenta. E se não se achegar ao Salvador, pelo menos terá maus momentos enquanto ficar distanciado dEle. Receio que às vezes preguemos coisas suaves, demasiado suaves e agradáveis, e que não expomos como devíamos diante dos homens o real perigo que correm. Se neste aspecto deixamos de declarar todo o conselho de Deus ao menos uma parte da responsabilidade pela ruína deles jazerá à nossa porta.
Outro obstáculo à conquista de almas é o desespero, O pêndulo pende ora para cá, ora para lá, e o homem que ontem não tinha temor, hoje não tem esperança. Há milhares que já ouviram o Evangelho e ainda vivem numa espécie de desesperança de que seu poder se exerça neles. Talvez tenham crescido no meio de gente que lhes ensinou que a obra da salvação é realizada por Deus, inteiramente à parte do pecador. Assim, dizem que se hão de ser salvos o serão. Vocês sabem que este ensino contém uma grande verdade, e contudo, se for deixado só, sem explicação, é uma terrível falsidade, O que leva os homens a falarem como se nada lhes restasse fazer, ou como se não houvesse nada que possam fazer, é o fatalismo, não a doutrina da predestinação. Não há nenhuma probabilidade de que uma pessoa seja salva enquanto diga que sua única esperança é esta : "Se é que eu hei de ser salvo, a salvação virá a mim no devido tempo".
Vocês poderão encontrar pessoas que falam desse modo. E depois de lhes dizerem tudo que puderem, continuarão como que revestidas de aço, sem nenhum senso de responsabilidade, porque nenhuma esperança aviva o seu espírito. Que bênção seria, se simplesmente tivessem a esperança de receber misericórdia se a pedissem, sendo assim levados a lançar suas almas cheias de culpa nos braços de Cristo! Preguemos a salvação plena e de graça a todos quantos confiam em Jesus, de modo que, se possível, alcancemos aquelas pessoas. No entanto, se os que têm segurança carnal forem tentados a permanecer em sua arrogância, alguns dos que sofrem em silêncio o seu desespero podem encorajar-se, encher-se de esperança, e aventurar-se a ir a Cristo.
Sem dúvida, outro grande obstáculo à conquista de almas é o amor ao pecado. "O pecado jaz à porta." Muitos não se salvam por causa de paixões secretas. Pode ser que vivam em adultério.
Lembro-me do caso de um homem que eu achava que com certeza se entregada a Cristo. Tinha plena ciência do poder do Evangelho e parecia estar impressionado com a pregação da Palavra. Mas descobri que ele se havia enredado com uma mulher que não era sua esposa, e que continuava vivendo em pecado embora afirmasse buscar o Salvador. Quando soube disso, entendi logo por que aquele homem não podia ter paz. Por mais que seu coração tivesse amolecido, havia ainda aquela mulher que o mantinha na escravidão do pecado.
Outros carregam a culpa de transações comerciais desonestas. Não os veremos salvos enquanto continuarem agindo assim. Se não abandonarem suas trapaças, não se salvarão. Há outros que bebem demais. Vocês sabem que os que bebem, facilmente são influenciados por nossa pregação. Choram à toa, pois o álcool os deixa de miolo mole e muito sentimentais. Mas enquanto ficarem presos ao "cálice dos demônios" não há possibilidade de se achegarem a Cristo. Com outros a dificuldade está em algum pecado oculto ou em alguma cobiça escondida. Um diz que não pode evitar a cólera, outro afirma que não pode deixar de beber, e ainda outro lamenta que não pode encontrar a paz, sendo que a verdadeira raiz do mal consiste no fato de existir uma prostituta em seu caminho. Em todos esses casos, o que temos de fazer é continuar pregando a verdade, e Deus nos ajudará a atingir com nossas flechas a articulação da armadura do pecador.
A justiça própria do homem é outro obstáculo que se levanta em nosso caminho. Gente que confia em sua própria justiça não cometeu nenhum dos pecados a que me referi, e guarda todos os mandamentos desde a sua mocidade. Que lhe falta? Não há lugar para Cristo num coração cheio. E quando alguém está da cabeça aos pés vestido com sua própria justiça, não tem necessidade da justiça de Cristo ou, pelo menos, não tem consciência de sua necessidade. E se o Evangelho não o convencer disso, Moisés terá que vir com a lei e mostrar-lhe qual é o seu verdadeiro estado. Em muitíssimos casos é esta a verdadeira dificuldade. O homem não vem a Cristo por não ter noção de que está perdido. Não pede que o levantem porque ignora que é uma criatura decaída. Não sente nenhuma necessidade da misericórdia e do perdão de Deus, e portanto não os busca.
Também existem aqueles em quem nossas palavras não produzem nenhum efeito devido ao seu mundanismo total. Este mundanismo assume duas formas. No pobre resulta da pobreza torturante. Quando um homem mal tem o que comer e vestir, e em casa ouve o choro dos filhos pequenos e observa o semblante de sua esposa sobrecarregada de trabalho, é preciso que nossa pregação seja mais que excelente para obtermos a sua atenção e fazê-lo pensar no mundo por vir. "Que comeremos, ou que beberemos ou com que nos vestiremos?" são perguntas que atormentam duramente o pobre. Cristo é agradável ao faminto quando traz nas mãos um pedaço de pão. Foi como o nosso Senhor se apresentou ao seu redor um grupo de pessoas consagradas que o ajudaram a tornar-se a maior força em prol do bem que Birmingham teve naquela época. Façam o mesmo. Não esperem ver de imediato aquilo que aquele e outros ministros só conseguiram realizar com muitos anos de paciente labor.
Para atingir a meta de reunir a seu redor uma equipe de cristãos que sejam, eles próprios, conquistadores de almas, recomendo-lhes que não trabalhem presas a uma regra fixa. Sim, porque aquilo que daria certo numa ocasião, noutra poderia ser imprudente, e o que poderia ser o melhor num lugar, não seria tão bom noutro. Às vezes o melhor plano é convocar todos os membros da igreja, dizer-lhes o que pensamos fazer, e insistir ardentemente com eles, de modo que cada um se torne um conquistador de almas para Deus. Digamos-lhes: "Não quero ser pastor desta igreja simplesmente para pregar-lhes. Meu desejo é ver almas salvas, e ver os salvos procurando ganhar outros para o Senhor Jesus Cristo. Vocês sabem como foi dada a bênção no dia de Pentecoste. Quando toda a igreja estava reunida no mesmo lugar e permanecia unida em oração e súplicas, foi derramado o Espírito Santo, e milhares se converteram. Não podemos nós reunir-nos de igual modo, e clamar vigorosamente a Deus para que nos abençoe?" Isto poderia despertá-los. Reuni-los e pleitear calorosamente com eles quanto a esta questão, expondo ponto por ponto o que desejamos que façam, e pedir a bênção de Deus, pode funcionar como pôr fogo em lenha seca. Mas, por outro lado, pode ser que nada se consiga pela falta de interesse deles pela salvação dos homens. Talvez digam: "Bela reunião, esta! Nosso pastor espera grandes coisas de nós. Todos esperamos que ele consiga isso". E aí termina a sua participação.
Daí, se o processo descrito não der resultado, talvez Deus os leve a começar com um ou dois. Geralmente há algum "jovem de qualidade" em cada congregação. E ao notar mais profundidade espiritual nele do que nos demais membros da igreja, talvez você lhe diga: "Poderá vir à minha casa tal noite para orarmos juntos?" Poderá fazer aumentar o número para dois ou três, de preferência jovens fervorosos, ou quem sabe poderá começar tendo a cooperação de alguma senhora piedosa que talvez viva mais perto de Deus do que qualquer dos homens e cujas orações , lhe seriam de maior ajuda do que a deles.
Havendo conseguido o apoio deles, poderia dizer-lhes: "Agora vamos ver se conseguimos influenciar todos os membros da igreja. Comecemos com nossas irmãos na fé, antes de trabalhar com os de fora. Tratemos nós mesmos de estar assiduamente nas reuniões de oração para dar exemplo aos demais, e façamos reuniões de oração em nossas casas, convidando para elas nossas irmãos e irmãs. Você, irmã, pode receber meu dúzia de irmãs em sua casa, para uma breve reunião. E você, irmão, pode dizer a seus amigos: 'Vamos reunir-nos para orar par nossa pastor?'"
Às vezes, a melhor maneira de queimar uma casa é despejar petróleo na parte central do edifício e atear-lhe fogo como fizeram as "damas e cavalheiros" de Paris nos dias da Comuna. E às vezes o método mais rápido é pôr-lhe fogo nos quatro cantos. Nunca experimentei nenhum desses dois planos, mas é isso que penso. Gostaria de queimar igrejas, não prédios, porque elas não se queimam destruindo-se; queimam-se edificando", e continuam em chamas, quando o fogo é do tipo certo. Quando uma sarça não passa de uma sarça, logo se consome quando pega fogo. Mas quando se trata de uma sarça que se queima e não se consome, sabemos que Deus está ali. Assim sucede com uma igreja inflamada de zelo santo.
Diletos irmãos, cabe-lhes a tarefa de pôr fogo em sua igreja de algum modo. Poderão fazê-lo falando a todos os crentes, como também falando a alguns espíritos seletos. Mas, seja como for, é preciso que o façam. Mantenham uma sociedade secreta com este propósito sagrado, transformem-se num bando de "revolucionários celestiais", tendo como seu objetivo fazer inflamar a igreja toda. Se o fizerem, o diabo não gostará nem um pouco, e o deixarão tão perturbado que ele procurará romper totalmente a união, e é esta luta justamente o que queremos. Não queremos nada senão guerra mortal entre a igreja e o mundo e todos os seus hábitos e costumes. Mas volto a dizer: tudo isso levará tempo. Tenho visto alguns colegas correrem tão velozmente no início que logo ficaram como cavalos anulados pela exaustão, o que é um lamentável espetáculo. Portanto, irmos, dêem tempo. Não queiram obter num instante tudo que desejam.
Imagino que na maioria dos lugares se faz reunião de oração numa noite da semana. Se querem que, como vocês, os membros da sua igreja sejam conquistadores de almas para Cristo, façam tudo que puderem para manter as reuniões de oração. Não sejam como certos ministros dos subúrbios londrinos, que dizem que não conseguem fazer os crentes irem uma noite a uma reunião de oração, e outra a uma reunião de estudo da Bíblia, e assim reúnem-se uma só vez para orar e incluem no programa uma breve pregação. Outro dia, um obreiro preguiçoso disse que o estudo bíblico dá quase tanto trabalho quanto um sermão. Assim, ele faz uma reunião de oração e inclui nela uma palestra. Daí resulta que a reunião não é nem uma coisa nem outra; nem carne nem peixe. Logo a suprimirá de uma vez, porque está convencido que não é boa – e estou certo de que os crentes têm também esta opinião. Depois disso, por que não há de suprimir também um dos cultos dominicais? O mesmo raciocínio sobre o trabalho do meio da semana pode ser aplicado ao do domingo.
Hoje mesmo li num jornal americano o seguinte: "Comenta-se de novo o bem conhecido fato de que na igreja de Spurgeon, em Londres, um domingo de noite em cada três meses, os ouvintes habituais se ausentam para ceder o local aos estranhos. 'É excluída a jactância inglesa' neste ponto. Nosso cristianismo americano é de tão nobre classe que numerosos grupos de crentes de nossas igrejas cedem os seus lugares todos os domingos à noite, o ano inteiro, aos estranhos"! Oxalá não suceda isso com os membros das suas igrejas, quer nos cultos de domingo, quer nas reuniões de oração.
Em seu lugar, eu faria da reunião de oração uma característica distintiva do meu ministério. Façam o possível para que ela seja tal que não haja outra igual num raio de sete mi quilômetros. Não façam como muitos que vão à reunião de oração para dizer qualquer coisa que lhes ocorra no momento. Façam o melhor que puderem para tornar a reunião interessante a quantos compareçam. E não hesitem em dizer ao caro senhor Linguaraz que, com a ajuda que Deus lhes dê, não há de fazer oração de vinte e cinco minutos. Peçam-lhe encarecidamente que a abrevie, e se não atender, interrompam-no. Se um homem entrasse em minha casa querendo cortar a garganta da rainha esposa, procuraria dissuadi-lo do seu erro e depois o impediria de fato de fazer-lhe qualquer mal. Amo a igreja quase tanto como a minha querida esposa. Deste modo, se alguém fizer oração comprida, que vá orar em qualquer outro lugar, não porém numa reunião que eu esteja dirigindo. Se alguém não puder orar em público sem ultrapassar um espaço de tempo razoável, digam-lhe que termine em casa a oração. E se os participantes parecem estar entorpecidos e desanimados, façam-nos cantar hinos populares. Depois, quando já os estejam cantando de cor, façam-nos retornar ao hinário da igreja.
Mantenham a reunião de oração, ainda que tudo mais fraqueje. Este é o grande empreendimento da semana, a melhor atividade realizada entre os domingos. Assegurem-se de que seja mesmo. Se virem que os crentes não podem freqüentar a reunião à noite, procurem fazê-la num horário em que possam vir. Numa região rural, poderiam ter uma boa reunião às quatro e meia ou cinco da manhã. Por que não? Conseguirão mais gente às cinco da manhã do que às cinco do fim do dia. Creio que uma reunião de oração às seis da manhã para agricultores atrairia muitos. Entrariam por um pouco, teriam algumas palavras de oração, e ficariam contentes com a oportunidade. Também poderiam ter uma reunião à meia-noite. Encontrariam gente que não estaria lá em nenhuma outra hora.
Façam-na à uma hora, às duas, às três, a qualquer hora do dia ou da noite, de sorte que, de uma forma ou de outra, façam as pessoas irem orar. E se não conseguirem fazer com que freqüentem as reuniões, vão às suas casas e digam-lhes: "Vou fazer uma reunião de oração em sua sala de visitas". "Meu caro, minha mulher ficará daquele jeito!" "Não, não. Diga-lhe que não se apoquente, pois, podemos usar a cocheira, ou o jardim, ou qualquer outro canto; mas temos que fazer uma reunião de oração aqui". Se não vêm à reunião, temos que ir a eles. Imaginem que cinqüenta de nós fôssemos à rua para fazer uma reunião de oração ao ar livre. Bem, há muitas coisas piores do que isto. Recordem como as mulheres da América lutaram com os traficantes de bebidas alcoólicas, quando lhes rogavam que deixassem de praticar esse contrabando.
Se não podemos despenar as pessoas sem fazer coisas incomuns, pois bem, em nome de tudo que é bom e nobre, façamos coisas incomuns, Mas, de algum modo temos que manter vivas as reuniões de oração, pois elas estão ligadas à verdadeira fonte de poder com Deus e com os homens.
É preciso que nós mesmos sempre sejamos verdadeiro exemplo. Estou certo de que um ministro molenga não terá uma igreja forte e zelosa. Um homem indiferente, que faz o seu trabalho com indolência, quando repartiu o pão e os peixes à multidão, pois Ele mesmo não tinha em pouca conta alimentar os famintos. E quando está ao nosso alcance aliviar as necessidades dos desamparados, talvez estejamos atendendo a algo de que eles precisam de fato, e lhes demos condições de ouvir com proveito o Evangelho de Cristo.
O outro tipo de mundanismo provem do excesso de bens, ou de uma vida demasiado apegada a este mundo. O cavalheiro deve apresentar-se com elegância, as filhas devem vestir-se no melhor estilo, os filhos devem aprender a dançar, e assim por diante. Esta espécie de mundanismo é verdadeiro flagelo em algumas das nossas igrejas.
Vem ainda outro tipo de homem, que fica desde cedo até à noite em sua casa comercial. Parece que todo o seu trabalho é fechar e abrir as partas do estabelecimento. Levanta-se de madrugada, repousa tarde e come o pão de dores – tudo por dinheiro. Que podemos fazer por essas pessoas cobiçosas? Que esperança podemos ter de tocar o coração desses homens cujo único objetivo é enriquecer-se e que, para isso, economizam tostão por tostão? A poupança é boa, mas há uma poupança que se transforma em mesquinharia. E essa gente fica viciada nisso. Alguns desse tipo chegam a freqüentar a igreja, parque isso é um costume conveniente e respeitável, e pode propiciar mais clientes. Judas continuou sendo um inconverso, mesmo na companhia do Senhor Jesus Cristo. Também temos entre nós algumas pessoas em cujos ouvidos as trinta moedas de prata retinem tão alto que elas não conseguem ouvir o som do Evangelho.
Menciono mais um obstáculo para a conquista de almas para Cristo. Refiro-me aos costumes, lugares freqüentados e companhia de alguns. Como podemos esperar que um operário, ao deixar o trabalho, entre em casa e fique no único quarto, que serve de sala de estar e dormitório? Talvez estejam ali dois ou três filhos a chorar, roupas estendidas a secar, e uma série de coisas próprias para produzir desconforto. Chega o pai de família, a mulher está ranzinza, as crianças choram, e há roupas penduradas a secar. Que fariam vocês no lugar dele? Suponhamos que não fossem cristãos. Não iriam a algum outro lugar? Não podem ficar perambulando pelas ruas, sabendo que há salas confortáveis e bem iluminadas no cabaré, e que na esquina há um bar onde tudo é reluzente e agradável, e onde não faltam companhias alegres.
Pois bem, não podem esperar ser instrumentos para a salvação de homens assim enquanto eles continuem a freqüentar tais lugares e a reunir-se com esse tipo de gente. Todo o benefício que recebem dos hinos ouvidos no domingo se desvanece ao ouvirem as canções humorísticas dos bares. E a lembrança que guardem dos serviços do culto no templo apaga-se com as estórias duvidosas que se contam nos salões dos cabarés. Dai a grande bênção de ter-se um lugar onde os operários possam sentar-se em segurança, ou de ter-se uma reunião especial, onde não haja apenas cânticos, pregação e orações, mas haja um pouco disso tudo. Aí o homem vai-se tornando capaz de abandonar os velhos hábitos que pareciam mantê-lo preso, e em pouco tempo acaba por deixar de freqüentar o cabaré para sempre. Em vez disso, talvez venha a conseguir dois cômodos ou uma casa pequena. Sua mulher estenderá as roupas no quintal, e agora ele vê que as crianças não choram tanto como antes, possivelmente parque sua mãe tenha mais que lhes dar. E tudo vai melhorando desde o momento em que o homem abandonou as suas más companhias.
Creio que o ministro cristão tem o direito de usar todos os meios honestos e lícitos para afastar as pessoas de suas más companhias, e às vezes convém fazer algo que parece extraordinário, se com isso pudermos ganhar almas para o Senhor Jesus Cristo. Seja este o nosso único objetivo em tudo quanto fizermos. E sejam quais forem os obstáculos que encontremos em nosso caminho, devemos buscar o auxílio do Espírito Santo para retirá-los, com o fim de que almas se salvem e Deus seja glorificado.