"Eu formo a luz, e crio as trevas; faço a paz, e crio o mal; eu o Senhor faço todas as coisas". Isa. 45:7.
A declaração de Isaías, que Deus cria o mal, tem deixado a muitos leitores da Bíblia desorientados, por entenderem que tal declaração não se coaduna com o caráter divino.
Atentando para alguns princípios exegéticos e certas peculiaridades da língua hebraica tudo se esclarecerá.
"A palavra hebraica para designar o mal é 'ra e pode significar o mal moral, a natureza perversa, como também pode significar males como inundações, terremotos, tempestades de granizo, etc., referidos nos livros da lei como sendo 'atos de Deus'.
Aqui no livro de Isaías a palavra é empregada neste último sentido. Basta comparar com Isaías 47:11, onde o mal se define como uma 'desolação' e 'calamidade' que virá repentinamente. E em Amós 3:6 lemos: 'Sucederá algum mal (calamidade) à cidade, sem que o Senhor o tenha feito?'
"Tanto os profetas maiores como os menores profetizaram de invasões e calamidades, que Deus permitiu que acontecessem sobre Seu povo devido à obstinação deste. Deus tolera por muito tempo homens e nações, mas em Seu ódio ao pecado, permite que desastres finalmente se abatam sobre os impenitentes. E, permitindo isto, se diz que Ele 'cria o mal'.
"Tudo que Deus faz é correto. Satanás é que cria o mal no sentido de originá-lo diretamente, tendo em vista desviar de Deus as almas sinceras". 1
Temos nesta passagem um idiomatismo hebraico, pois, os livros especializados em estudar a linguagem figurada na Bíblia nos informam, que verbos ativos eram usados pelos hebreus para expressar não a execução de algo, mas a permissão disso que se diz que o agente faz.
Os seguintes exemplos são esclarecedores:
Êxo. 4:3 - "Eu, porém, endurecerei o coração de Faraó" (isto é, permitirei ou tolerarei que seu coração seja endurecido)
Êxo. 5: 22 - "Ó Senhor, por que afligiste este povo?" (toleraste que ele fosse afligido).
Jer. 4:10 - Ah! Senhor Deus! verdadeiramente enganaste a este povo e a Jerusalém, dizendo: Tereis paz.." O sentido é este: (Toleraste que este povo fosse enganado pelos falsos profetas, que diziam: Tereis paz).
Os exemplos supracitados confirmam, que em Isa. 45:7 o profeta queria dizer que Deus permite o mal.
" 'Crio o mal'.. Deus é o autor da luz e da paz. Ele permite o mal para que os homens e os anjos possam testificar o resultado do afastamento dos eternos princípios da justiça. Na Escritura, Deus muitas vezes, é representado como causando aquilo que Ele não evita" 2
Se Deus é Bom por que existe o mal no mundo?
Esta pergunta, ou outras mais ou menos semelhantes, sempre nos são apresentadas. Para uma resposta cabal a esta indagação muitas e muitas páginas seriam precisas.
Limitemo-nos às partes principais da resposta dada, na Revista Adventista, janeiro de 1960, pág. 36, a alguém que enfrentava este problema.
Abramos, no entanto, quando mais não seja, um caminho à solução de um assunto tão difícil como este se afigura.
Deus poderia haver feito o homem de duas maneiras: livre, ou não livre. Não há aqui meios termos como não os há entre o ser e o não ser.
Bem, se Deus houvesse feito o homem sem o direito de liberdade, ou livre arbítrio, em nada nos diferenciaríamos de um robô, um boneco mecânico em mãos de nosso dono, nesse caso, Deus.
Não existiria o saber, nem a cultura, nem o progresso feito pelo próprio homem, não poderíamos render culto a Deus nem amá-Lo, porquanto não teríamos vontade própria; nada haveria em nós que a Ele nos assemelhasse, pois nossa semelhança com Deus consiste basicamente em nosso livre arbítrio.
Ora, como Deus não faz as coisas sem significação, fez o homem com livre arbítrio, isto é, fê-lo segundo a outra alternativa.
Deu-lhe a possibilidade de escolher entre o bem e o mal, com a conseqüente possibilidade de fazer o bem e de fazer o mal. Deus fez o homem bom, cumulou-o de todos os dons, pô-lo como senhor de toda a Terra, e deu-lhe inclusive o precioso dom, a possibilidade de amar.
Claro está que necessariamente, como reverso da moeda, esta possibilidade de amar trazia consigo a outra terrível possibilidade – odiar, infelicitar. Mas, se o homem odiava, não era porque Deus o queria, e sim porque empregava mal esse dom único e sagrado da liberdade...
Mas se Deus queria criar um homem, este devia ter a liberdade para amá-Lo e obedecer-Lhe, mesmo com risco da possibilidade do mal. Se há maldade no homem e no mundo, não é porque Deus o haja querido, pois Ele fez o homem bom, e este, ao empregar mal o dom da liberdade, fez-se mau a si mesmo.
Assim, pois, nada afeta a bondade de Deus o fato de o homem se haver tornado mau. Pelo contrário, esse fato mostra até aonde Deus nos amou, visto que nos deu o dom de poder amá-Lo e nos fez semelhantes a Ele no amor, mesmo com risco de que nos rebelássemos contra o Criador e O ofendêssemos em lugar de bendizê-Lo. Pode-se acaso pensar em mais amor e mais bondade?
Referências:
Revista Adventista, maio de 1975, pág. 27.
Seventh-Day Adventist Bible Commentary, vol. IV, pág. 267.