152 Pregar aos Espíritos em Prisão

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Muitos crêem que Cristo, no tempo que decorreu entre Sua crucifixão e ressurreição, foi pregar aos espíritos em prisão. I S. Pedro 3:18 e 19


Diz a passagem:


“Pois também Cristo morreu, uma única vez, pelos pecados, o justo pelos injustos, para conduzir-vos a Deus; morto, sim, na carne, mas vivificado no espírito,   no qual também foi e pregou aos espíritos em prisão,   os quais, noutro tempo, foram desobedientes quando a longanimidade de Deus aguardava nos dias de Noé, enquanto se preparava a arca, na qual poucos, a saber, oito pessoas, foram salvos, através da água” (1 Pedro 3:18-20 RA).


É de admirar que os crentes na imortalidade da alma citem esta passagem. Se ela lhes proporciona auxílio e conforto quanto a essa doutrina, dá-lhes, por outro lado, grande desconforto relativamente a duas outras doutrinas, ou antes, heresias, a saber: o purgatório e um segundo período de graça. 


Se Cristo foi pregar a determinados pecadores após a morte deles, a conclusão que se tira é que Ele lhes ofereceu uma segundo oportunidade, um segundo período de graça. E se houve esse segundo período de graça então o lugar de tortura a qual se achavam confinados não era de modo a nunca dele poderem escapar, idéia que se aproxima bastante da idéia do purgatório.


Demais, se Cristo por ocasião de Sua crucifixão pregou mesmo aos espíritos, por que teria Ele escolhido unicamente os espíritos dos que foram "desobedientes" nos dias de Noé? Não tinham outros igual direito de uma segunda oportunidade? Não apoiemos semelhante interpretação das palavras de Pedro, a qual o representaria abonando grandes heresias!


Pedro ensina justamente o contrário da doutrina de uma segunda época de graça, declarando que a pregação teve lugar "quando a longanimidade de Deus esperava nos dias de Noé." A frase "os quais noutro tempo foram desobedientes" é simplesmente uma explanação intercalada. Se lermos a passagem sem essa frase intercalada, é fácil reconhecer qual foi o tempo da pregação: "Cristo ... foi pregar aos espíritos em prisão... quando a longanimidade de Deus esperava nos dias de Noé".


Cristo disse aos discípulos que o Espírito "convencerá o mundo do pecado" (ver S. João 16:7-9), e que eles deviam, pois, esperar até que recebessem o Espírito, antes de se porem a pregar. Quando os discípulos levaram pecadores à convicção do pecado, na era cristã, a verdadeira fonte de toda a pregação era a posse do "Espírito de Deus".


Ora, houve nos tempos antediluvianos um pregador de Deus pelo qual o Espírito pudesse pregar aos homens? Sim, Pedro diz-nos que Noé era um "pregoeiro da justiça". II S. Pedro 2:5. No inspirado registro do plano de Deus para destruir a Terra por um dilúvio, lemos: "Não contenderá (ou pleiteará) o Meu Espírito para sempre com o homem: porque ele também é carne; porém os seus dias serão como cento e vinte anos. Gen. 6:3. Então segue o relatório do chamado de Deus a Noé, a fim de que se preparasse para o dilúvio. Em outras palavras, o Espírito de Deus pregou àqueles antediluvianos por meio de Noé, um "Pregoeiro da justiça", esperando, em Sua longanimidade, cento e vinte anos antes de destruí-los, afinal.


Por que entretanto, se diz estarem "em prisão essas pessoas?"


A Bíblia descreve os que se acham nas trevas do pecado como sendo "prisioneiros" e estando numa "prisão". E especificamente, o profeta Isaías declara que a obra de Cristo, tendo sobre Si, "o Espirito do Senhor Jeová", era "tirar da prisão os presos". (Ver Isa. 42:7; 61:11, S. Lucas 4:18-21). A obra do Espírito nos tempos antediluvianos era evidentemente a mesma que no tempo de Cristo - a pregação aos que eram prisioneiros do pecado, oferecendo-lhes um meio de escape.


Uma questão, apenas, permanece ainda. Pergunta-se-á por que eram chamadas "espíritos" as pessoas às quais Noé pregava, se eram homens que viviam na Terra. Deixemos responder um eminente comentarista, Dr. Adão Clarke. O fato de acreditar ele na doutrina da imortalidade da alma torna seu testemunho a esse respeito especialmente valioso. Depois de declarar que a frase "foi pregar" deve ser compreendida como significando "pelo ministério de Noé", observa ele:


"A palavra pneumasi, espíritos, supõe-se tornar improvável este ponto de vista acerca do assunto, porque isto tem de significar espíritos incorpóreos; isto, porém certamente não procede,pois que os espíritos de simples homens aperfeiçoados (Heb. 12:33) significa, certamente homens justos, e homens que se encontram ainda na igreja militante; refere-se a homens ainda no corpo; e  "espíritos de toda carne (Núm. 16:22 e 27:16), refere-se a homens, não em estado incorpóreo." Comentários sobre I. S. Pedro 3:19. 


O Dr. João Pearson, em sua Exposição do Credo,obra clássica da Igreja Anglicana, observa: "É certo, pois, que Cristo pregou àquelas pessoas que nos idos de Noé eram desobedientes, em todo o tempo em que "longanimidade de Deus esperava" e, conseqüentemente, enquanto era oferecido o arrependimento. E é igualmente certo que Ele nunca pregou depois de haverem morrido." Pág. 166.


Por que se nos deveria pedir que explicássemos esta passagem em harmonia com nossos pontos de vista, se eminentes teólogos que crêem na imortalidade da alma, admitem que a dita passagem não ensina tal doutrina?