A orientação apostólica sobre o uso do véu por mulheres na igreja aparece em I Coríntios 11:3-15.
Entendemos tratar-se de um problema local e do tempo de Paulo, em vista, inclusive, do que é dito no verso 14: “É desonroso para o homem usar cabelo comprido”.
Teria Deus, porventura, requerido do nazireu, nos tempos do Velho Testamento, que assumisse um comportamento desonroso, ao ordenar que sobre a sua cabeça não fosse passada a navalha? (ver Lev. 6:5). É evidente que não, pois Deus não Se contradiz.
Observe que a orientação de Paulo é feita á igreja de Corinto, uma das cidades mais pervertidas da época. Havia ali o templo de Vênus, onde atuavam mil sacerdotisas na qualidade de prostitutas cultuais.
Tiravam a subsistência de sua própria função, e não da dependência de um homem, como normalmente ocorria com as mulheres honradas, que viviam, enquanto solteiras, às expensas do pai (na falta deste, de irmãos),quando casadas, do marido, e quando idosas e viúvas, dos filhos. Aliás, Paulo, acerca destas, precisou também dar algumas orientações (ver I Tim. 5:3-16).
Dependendo da região, uma mulher que quisesse ser autônoma sê-lo-ia principalmente vendendo o corpo. Mulheres assim tinham o dever de cortar o cabelo, mesmo de tosquiá-lo, mostrando que não havia “um cabeça” que se responsabilizasse por elas; eram “senhoras de si mesmas”. Isso ocorria mais no Oriente e na Grécia, onde era requerido que uma mulher de caráter não se expusesse sem portar o véu.
Era ofensivo à sociedade grega uma mulher com cabelos longos aparecer desvelada em público. Tal ato, no mínimo, era contraditório. Seus cabelos indicavam ser uma mulher honrada, enquanto a falta do véu a classificava como dissoluta. Assim ela se expunha com ares de libertinagem, dando a impressão de tendência para a vida livre.
Conforme I Coríntios 11:3, o homem é o cabeça da mulher (claro que aqui o apóstolo se refere à situação de normalidade). Se ela tomasse a atitude de falar na igreja (orando ou profetizando, o que pode até incluir o ato de pregar), e não usasse véu, estaria desonrando a sua própria cabeça “porque é como se estivesse rapada” (verso 5).
Isto significa que ela desonraria o marido, ou quem do sexo masculino que a sustentasse, porque, sem usar véu, estaria dando a impressão de ser mulher leviana, independente, a qual, pelo acima exposto, deveria ter cabelo tosquiado. Ademais, os gregos não admitiam mulheres falando em público.
Nesses termos, Paulo afirmou que se uma mulher participasse de uma atividade na igreja e insistisse em não usar véu, que então se tosquiasse (v.6). Paulo aqui fala com desdém, na forma de um desafio a essas mulheres que não queriam seguir sua orientação.
É muito provável que as tais, no pretexto da liberdade que o evangelho lhes proporcionava, não se sentissem mais na obrigação de usar véu ao saírem de casa para qualquer lugar, inclusive a igreja. Paulo argumentou que a liberdade do evangelho não deveria ofender a opinião pública por infligir os ditames da época; e muito menos trazer opróbrio ao cristianismo.
Como se tosquiar indubitavelmente fosse vergonhoso para mulheres cristãs, pois eram as mulheres indecentes que tinham de fazê-lo, era o dever delas usar véu, se quisessem desfrutar a comunhão da igreja. Com isto demonstrariam que, mesmo participando mais ativamente da reunião, eram mulheres dignas e que viviam às expensas de alguém do sexo masculino.
Confira o verso 10 onde é dito que o véu na cabeça da mulher é sinal de autoridade; em outros termos, há uma autoridade sobre a mulher, à qual ela deve submissão e da qual pode esperar amor, subsistência e cuidado (ver Efés. 5:22-29); como já referido, esta autoridade idealmente seria, dependendo das circunstâncias, o pai, ou o irmão, ou o esposo, ou os filhos.
Numa situação assim, compreendemos que seria muito melhor, pois contratempos e mal entendidos desnecessários não ocorreriam, que as mulheres se mantivessem caladas na igreja, e consultassem a seus maridos em casa. Isso é precisamente o que Paulo ordena em I Cor. 14:34 e 35 (ver também I Tim. 2:11 e 12).
O inverso se dava em ralação a homens. Efeminados não faltavam em Corinto. Estes deveriam deixar o cabelo crescer para indicar sua condição. Já que o cabelo comprido poderia ser tido como alguma forma de véu (verso 15), era desonroso que o homem fizesse algo na igreja usando o véu, porque aí estaria indicando uma qualidade anticristã de caráter. Por isso Paulo afirmou que, tal ocorrendo, o homem desonraria “a sua própria cabeça”, Cristo, de acordo com o verso 3.
Aplicar literalmente os ensinos de I Coríntios 11 hoje, num contexto totalmente diferente, em que as obrigações e direitos sociais do homem e da mulher, bem oposto ao que ocorriam nos tempos bíblicos, praticamente se igualam, revela falta de bom-senso e adequada compreensão das Escrituras, e exemplifica a condenável prática de “forçar” o sentido da Bíblia.
O uso do véu na igreja hoje pelas mulheres é simplesmente irrelevante, por ser inútil e inconseqüente. Igualmente nos parece imprópria a atitude de alguns, talvez movidos por “zelo sem entendimento”, de, como base neste capítulo, condenar sumariamente uma mulher pelo simples fato de cortar um pouco do seu cabelo.
Isso, todavia, não significa que nada temos a aprender da passagem em apreço. Os princípios de decência e de bom-gosto, e, porque não dizer também, de reverência, exarados nas diretrizes apostólicas para os cristãos de Corinto, são perenes e imutáveis. Mudam-se os costumes e a mentalidade social, mas os princípios corretos permanecem inalterados. Isso me concita a perguntar: glorifico ao Senhor em todos os aspectos do meu comportamento?