Com este décimo capítulo chegamos a um grande despertamento religioso cristão. Já salientamos que o evangelho apostólico, depois da morte dos apóstolos, foi relegado, mormente com o advento de Constantino a princípios do quarto século, quando a igreja cristã fora elevada à categoria de igreja do Estado, tornando-se Igreja Imperial.
E, o papado, a esse tempo, com o gérmen da apostasia grandemente desenvolvida, crescera mais e mais a ponto de tomar a liderança do cristianismo apóstata, lançar a verdade do evangelho por terra e prosperar com os ensinos das tradições humanas e alianças com os governos terrenos. A verdadeira igreja de Cristo, por longos séculos, foi perseguida pelo romanismo, sendo dizimada pelos tribunais da inquisição, por cruzadas e por chacinas inúmeras.
A situação da igreja de Cristo, por mais de doze séculos era desesperada e as trevas duma apostasia geral pairavam sobre o cristianismo nominal sob o tacão de Roma papal. Todavia, a queda do poder temporal do papado em 1798, trouxe uma era nova para o cristianismo em geral e para a civilização hodierna. Um grande despertamento religioso, nos começos do século XIX, surgiu como resultado da queda do poder opressor, e o mundo foi sacudido por uma mensagem solene e poderosa, tal como anunciada nas profecias principalmente na do capítulo que agora vamos considerar.
Notaremos que esta profecia, como uma evidência do tempo em que devia cumprir-se, acha-se inserida como um parêntesis entre a sexta e a sétima trombetas, devendo portanto cumpre-se antes do toque inicial da sétima trombeta, isto é, antes de 1844.
UM PODEROSO ANJO DESCE DO CÉU
VERSO 1 — “E vi outro anjo forte, que descia do céu, vestido de uma nuvem; e por cima da sua cabeça estava o arco celeste, e o seu rosto era como o sol, e os seus pés como colunas de fogo”.
"E VI OUTRO ANJO FORTE"
Um anjo, nas profecias do evangelho que dizem respeito à evangelização geral do mundo, é emblema dum movimento religioso a
ocorrer na terra. O símbolo dum anjo tão somente indica o movimento e sua natureza celestial. A expressão — anjo forte — designa o poder com que se manifestaria o movimento religioso desta profecia. E, sua vestimenta “de uma nuvem”, é simbólica da presença de Deus como guia do movimento, pois uma nuvem sobre o acampamento de Israel e suas jornadas era evidência da presença de Deus como guia de Seu povo.1)
UMA MENSAGEM DE JUÍZO E DE MISERICÓRDIA
O arco celeste da divina graça que se acha em torno do trono de Deus2) aparece por cima da cabeça do anjo, como prova de que o movimento por ele representado traz uma mensagem de convite e perdão ao pecador. Porém, o anjo tem o seu rosto “como o sol e os seus pés como colunas de fogo”. Esta é a primeira vez que uma profecia refere um movimento religioso figurado num anjo como tal.
Posto que a mensagem do movimento que ele representa seja de graça e de perdão, seu rosto e seus pés anunciam que também possui uma mensagem de juízo. O sol do seu rosto é figura de meticulosa investigação ou de juízo investigativo, enquanto o fogo dos seus pés é emblema de justiça ou de juízo executivo. Todavia, ainda que a mensagem anuncie a proximidade do juízo, é acompanhada da misericordiosa graça: “Porque o juízo será sem misericórdia sobre aquele que não fez misericórdia; e a misericórdia triunfa do juízo”.3)
UM LIVRINHO ABERTO NA MÃO DO ANJO
VERSO 2 — “E tinha na ma mão um livrinho aberto, e pôs o seu pé direito sobre o mar, e o esquerdo sobre a terra”.
UM LIVRINHO ABERTO
O livrinho aberto na mão do anjo contém a mensagem do grande movimento que ele simboliza. Deve impreterivelmente tratar-se de um dos livros das Sagradas Escrituras que tenha estado fechado ou selado por determinado tempo ou até o tempo do cumprimento desta profecia, cujo conteúdo deveria despertar o interesse e a atenção do movimento representado pelo forte anjo e constituir a base real da sua proclamação.
Em todas as Escrituras Sagradas do Velho e do Novo Testamentos, não encontramos outro livro que tenha sido mandado fechar e selar, até um tempo definido, senão o livro do profeta Daniel, que na verdade é um “livrinho” de apenas treze páginas. Sobre isto lemos as próprias palavras de Gabriel a Daniel:
“E tu, Daniel, fecha estas palavras e sela este livro, até ao fim do tempo: muitos correrão de uma parte para a outra, e a ciência se multiplicará”.4)Dois acontecimentos irrecusáveis asseguram a época em que deveria ser aberto o livro de Daniel: 1) O advento do “fim do tempo”;
2) a era da multiplicação da ciência. Agora, a primeira pergunta que temos a fazer e responder, é esta: Quando chegou o “fim do tempo” predito por Daniel? No próprio livro deste profeta encontramos a resposta evidente. No capítulo onze versículos 30 a 35, temos a introdução da potência papal como poder perseguidor do povo de Deus. O último destes versículos declara que o povo de Deus seria perseguido, por dito poder, “até ao fim do tempo”, o que quer referir-se até ao fim da supremacia temporal do papado ocorrido em 1798 quando a França revolucionária lhe tirou o poder e aprisionou o papa reinante — Pio VI.
Prova mais incontestável de que o “fim do tempo, chegou com o fim da supremacia temporal do papado em 1798, temos ainda no capítulo doze do livro de Daniel. No versículo sete é esclarecido que o povo de Deus seria perseguido até completar-se o período de “um tempo, dois tempos e metade de um tempo”, ou sejam 1260 anos de supremacia temporal de Roma papal, em realidade findos em 1798 pela espada de França. Como Daniel não entendesse isto e pedisse explicação ao anjo, este lhe disse: “Vai, Daniel, porque estas palavras estão fechadas e seladas até ao tempo do fim”.1)
Note-se a clareza de Gabriel em dizer, em outras palavras, que o “tempo do fim” chegaria com o fim do poder do papado — depois de um tempo, dois tempos e metade de um tempo”, período findo em 1798. O ano de 1798 é, por conseguinte, o marco inicial do “fim do tempo”. Outra incontestável prova que estabelece este ano como inicial do “fim do tempo”, encontramos no versículo quarenta do capítulo onze, onde a profecia, fazendo alusão à França da revolução, estabelece que “no fim do tempo, o rei do sul”, o Egito, lutaria com ela, “e o rei do norte”, a Turquia, entraria no conflito contra a França.
E, qualquer compêndio de história universal estabelece que foi no ano de 1798 que Napoleão Bonaparte invadiu o Egito. Outro sucesso ainda, que confirma o início do “fim do tempo” em 1798, é o incremento da ciência; pois notamos que Daniel se refere, enfaticamente, que, ao chegar este tempo, a ciência se multiplicaria ou tomaria lugar a era das invenções modernas. Em verdade as maravilhas da ciência moderna que hoje conhecemos tiveram seu simples começo nos primeiros anos do século dezenove, ao chegar o “fim do tempo” predito.
Exatamente ao chegar o fim do tempo, manifestou-se, tanto na América como na Europa, um grandioso incremento no estudo das profecias especialmente as do livro de Daniel. E agora, depois de todas estas considerações fundadas na própria palavra da profecia, podemos assegurar, que, em 1798 o selo do livro de Daniel foi removido, tornando-se ele aberto ao estudo de inúmeros pesquisadores da verdade, resultando no grande movimento religioso do qual falaremos pormenorizadamente no versículo oito.
UM MOVIMENTO EM TERRA E MAR
A posição do anjo com um pé na terra e outro no mar, denota a extensão mundial do movimento missionário por ele representado e também de que a mensagem do livro de Daniel deveria atravessar os mares e alcançar os continentes ao chegar o “fim do tempo”.
OS SETE TROVÕES
VERSOS 3-4 — “E clamou com grande voz, como quando brama o leão: e havendo clamado, os sete trovões fizeram soar as suas vozes. E, sendo ouvidas dos sete trovões as suas vozes, eu ia escrevê-las, e ouvi uma voz do céu, que me dizia: Sela o que os sete trovões falaram, e não o escrevas”.
UM CLAMOR COMO DE LEÃO
No primeiro versículo salientamos que a aparência do anjo anunciava a graça de Deus em virtude do juízo. A proclamação do movimento por ele simbolizado, como veremos, foi a proximidade do juízo sobre um mundo em decomposição moral. E a poderosa voz do anjo é indicativa da extraordinária proclamação que abalaria o mundo e poria a tremer os homens em face da iminência do juízo. O versículo oito de nosso capítulo e o sexto, sétimo e oitavo do capítulo quatorze dizem-nos bastante da poderosa voz de leão do anjo simbólico.
AS VOZES DOS SETE TROVÕES
Os sete trovões fizeram soar suas vozes ao proferir o anjo poderosamente a sua mensagem. Isto denota que suas vozes estão ligadas ao grande movimento ou ao tempo da proclamação da mensagem do livro de Daniel aberto. Quais são em verdade suas sete vozes, não nos é dado conhecer, pois por ordem duma voz do céu não foram elas escritas para a posteridade.
Que seriam entretanto solenes acontecimentos, podemos prever por suas vozes simbólicas de trovões. Deus achou por bem silenciá-las para não serem seus filhos antecipadamente perturbados pelos acontecimentos a que elas diriam respeito. Todavia o Senhor fortaleceria a seus escolhidos para que pudessem enfrentar os “trovões” ao soarem eles suas poderosas vozes.
UM JURAMENTO SOLENE
VERSOS 5-6 — “E o anjo que vi estar sobre o mar e sobre a terra levantou a sua mão ao céu. E jurou por Aquele que vive para todo o sempre, o qual criou o céu e o que nele há, e a terra e o que nela há, e o mar e o que nele há, que não haveria mais demora”.
IDENTIFICAÇÃO COM O ANJO DA PRIMEIRA MENSAGEM
Este anjo do capítulo dez identifica-se precisamente com o primeiro anjo do capítulo quatorze. Ambos conduzem uma mensagem de graça e de juízo para proclamá-la. Ambos proferem sua proclamação com poderosa voz. Ambos exaltam a Deus como Criador dos céus, da terra, do mar e tudo o que neles há. Assim o anjo do capítulo dez é o mesmo primeiro anjo do capítulo quatorze, onde é apresentada sua obra de extensão mundial e a sua mensagem da hora do juízo.
"QUE NÃO HAVERIA MAIS TEMPO"
Uma outra versão, em vez de rezar: “que não haveria mais demora”, reza assim: “que não haveria mais tempo”. E o tempo que não mais haveria, não pode significar o tempo corrente do calendário ou o fim do mundo. Tão pouco significa o tempo da graça como devendo findar então, pois esta continuará até que a obra sacerdotal de Cristo esteja concluída no santuário celestial, isto é, até findar o toque da sétima trombeta.
A expressão — que não haveria mais tempo — relacionada com este anjo do capítulo dez e sua obra, é indicativa de que o movimento que este anjo representa está ligado ou fundamentado em um período de tempo especial, depois do qual não haveria outro que se estendesse além de seu término. E não há dúvida de que o movimento neste capítulo predito surgiu nos derradeiros dias do maior período de tempo — tempo profético — da revelação, como encontrado no livro de Daniel capítulo oito versículo quatorze, concluído em 1844.
E não encontramos, quer no Velho quer no Novo Testamento, outro período de tempo profético que vá além de 1844. Atualmente vivemos na hora do juízo, iniciado em 1844, findo o qual findará a graça salvadora e a corrompida civilização encontrará o seu fim. E não há outro período ou “tempo profético” anunciando a duração do tempo do juízo ou outra qualquer ocorrência.
O SEGRÊDO DE DEUS NA VOZ DO SÉTIMO ANJO
VERSO 7 — “Mas nos dias da voz do sétimo anjo, quando tocar a sua trombeta, se cumprirá o segredo de Deus, como anunciou aos profetas, seus servos”.
O TEMPO DA VOZ DO SÉTIMO ANJO
No capítulo dez vemos que o movimento simbolizado no anjo alcançaria até o ano de 1844 e que, de acordo com as palavras do juramento do angélico ser, a voz do sétimo anjo não seria ouvida durante o referido movimento que encontrou seu fim na primavera de 1844.
Disto nos certificamos de que a voz do sétimo anjo começaria a fazer-se ouvir da primavera de 1844 em diante, imediatamente ao concluir-se a obra do anjo do capítulo dez. Desde 1844 para cá, portanto, se está consumando o “segredo de Deus”. Todavia perguntamos: O que é o “segredo de Deus?”
O SEGRÊDO PROFÉTICO DE DEUS
O “segredo de Deus” é também nas Escrituras Sagradas chamado
— mistério de Deus. Os textos aqui indicados certificam que o “segredo” ou o “mistério de Deus” é o grande plano da salvação em Jesus Cristo.1) Esteve oculto no passado, mas, manifestou-se em sua glória pela pregação do evangelho ao mundo gentílico, e, “Cristo em vós”, ou Cristo recebido no coração do contrito pecador, é considerado “as riquezas da glória deste mistério”.
Mas o anjo do Apocalipse dez, em seu juramento, proclama que “nos dias da voz do sétimo anjo”, se cumpriria “o segredo de Deus”. Quer isto dizer que, de 1844 ao final, seria consumada a obra do evangelho no mundo. Não foi consumada na Velha Dispensação chamada Mosaica, por incredulidade do antigo povo de Deus que por isso mesmo foi rejeitado como Seu povo.
Não foi consumado na era cristã até antes de 1844, porque o cristianismo deixou de cumprir a sua missão, apostatando. Mas seria consumado de 1844 ao final, na voz do sétimo anjo, o que implica em dizer que um glorioso movimento mundial tomaria lugar desta data em diante, proclamando o “mistério de Deus” e consumando a obra da redenção entre as nações, através da pureza do evangelho isento de erros e tradições humanas. E este movimento predito surgiu em 1844, exatamente depois do primeiro movimento que findou nesta data, tem abrangido todo o mundo, e logo terminará a sua tarefa quando todas as coisas serão novamente congregadas em Cristo Jesus.
O LIVRINHO É COMIDO PELO PROFETA
VERSOS 8-10 — “E a voz que eu do céu tinha ouvido tornou a falar comigo, e disse: Vai, e toma o livrinho aberto da mão do anjo que está em pé sobre o mar e sobre a terra. E fui ao anjo, dizendo-lhe: Dá-me o livrinho. E ele disse-me: Toma-o, e come-o, e ele fará amargo o teu ventre, mas na tua boca será doce como mel. E tomei o livrinho da mão do anjo, e comi-o; e na minha boca era doce como mel; e havendo-o comido, o meu ventre ficou amargo”.
O PAPEL DE S. JOÃO NESTA PROFECIA
O anjo desta profecia é, como já dissemos, representante do grande movimento que envolveu a igreja de Deus nos começos do século XIX. O profeta, porém, toma o lugar de representante pessoal e físico do mesmo movimento. Posto que São João vivesse dezessete séculos antes do alvorecer do “fim do tempo” para que tomasse lugar o grande movimento missionário da igreja de Deus nos primeiros anos do século XIX, é ele escolhido, como um de seus representantes, para desempenhar simbolicamente o papel que a igreja devia desempenhar a seu devido tempo conforme esta profecia. Deste modo, temos aqui o profeta, propriamente, como a igreja de Deus e seu inteiro movimento missionário iniciado no “fim do tempo”. Tudo o que daqui em diante, dos versículos oito a dez, nos referirmos ao profeta, devemos aplicar à igreja de Deus.
UM LIVRINHO DOCE COMO MEL
Como vimos na explanação do versículo dois, este livrinho é o livro de Daniel, aberto no “fim do tempo” iniciado em 1798. O ato de o profeta ser ordenado a tomar o livrinho da mão do anjo e comê-lo, bem representa os piedosos homens da igreja de Deus que, inspirados por Seu Espírito, tomariam, a princípio do século XIX, o livro de Daniel e estudariam com fervor as suas profecias.
Posto que o livro de Daniel estivesse aberto, pois o tempo para isso chegara, havia, entre suas solenes profecias uma que dizia respeito exatamente àqueles primeiros anos do “fim do tempo”, sendo que, antes de todas, deveria chamar-lhes especialmente a atenção. E esta profecia era a das “duas mil e trezentas tardes e manhãs” do capítulo oito versículo quatorze, que reza o seguinte: “E ele me disse: Até duas mil e trezentas tardes e manhãs; e o santuário será purificado”. “As duas mil e trezentas tardes e manhãs”, são dois mil e trezentos dias.1) Porém, como se trata de uma profecia, cada dia representa um ano literal.2) Temos assim 2300 anos no fim dos quais, diz a revelação, a verdade ou a pura pregação do evangelho deveria ser restaurada e o santuário purificado.
O capítulo nove do livro de Daniel, que contém a explanação de Gabriel relativa à primeira parte dos 2300 anos, diz-nos que este grande período da profecia iniciar-se-ia com a “saída da ordem para restaurar e para edificar Jerusalém”. E esta ordem, dada aos judeus que eram cativos no Oriente ao tempo da dominação mundial da Pérsia, foi emitida pelo rei Artaxerxes I, Longímano, na primavera ou na última parte do ano 457 A. C.
Contando desta data inicial, os 2300 anos alcançaram a primavera ou a última parte do ano de 1844, quando, então, a verdade seria restaurada pela pregação e o santuário seria purificado. A restauração da verdadeira pregação não temos dúvida de que trata da anunciação mundial do evangelho tal como ele foi inspirado do céu e anunciado outrora pelos profetas e apóstolos do Senhor Jesus. Mas, o que é a purificação do santuário?
Segundo o ritual do santuário do antigo Israel, a purificação do santuário significava a remoção simbólica dos pecados do povo de Deus do santuário, através de um sacrifício especial, oferecido no dia dez do sétimo mês judaico, correspondendo a outubro do nosso calendário. O Santuário terrenal, feito por Moisés conforme o modelo do celestial,1) era uma figura do santuário da dispensação cristã, no céu, onde Cristo ministra por Sua igreja desde que para lá ascendeu, depois de sua ressurreição.
Assim a purificação simbólica do santuário de Israel realizada pelo sumo-sacerdote uma vez ao ano, era emblema da purificação do santuário celeste que Cristo, como oferta sacrifical e Sumo-sacerdote do mesmo, devia realizar a partir do final dos 2300 anos ou de 1844. Como no santuário terrenal os serviços diários eram efetuados no lugar santo e a purificação no lugar santíssimo, de modo idêntico, Cristo, desde que ascendeu ao céu, efetuou sua obra de intercessão no lugar santo do santuário celestial até 1844.
Nesta data, em outubro, Ele deixou o lugar santo e penetrou no lugar santíssimo para efetuar a purificação do santuário ou seja a remoção dos pecados de seu povo contrito e que nele confia como Mediador entre Deus e o homem. Esta obra de purificação continuará até o fim da graça, finda a qual estará concluída a purificação do santuário e a segunda vinda de Cristo tomará lugar imediatamente.
Depois de toda esta exposição acima, perguntamos: Como entenderam a questão da purificação do santuário, segundo a profecia de Daniel, os servos de Deus dos princípios do século XIX? A resposta enfática e histórica é esta: Eles entenderam que o santuário a ser purificado no final dos 2300 anos, em 1844, era a própria terra e que, para que isto pudesse ser realizado, Jesus deveria voltar naquele ano e atear fogo e enxofre ao mundo para purificá-lo da maldade humana.
Porém, como chegaram a esta conclusão sobre a terra como sendo o santuário a ser purificado? Simplesmente pelo fato de não haver, em 1844, mais santuário na terra e desconhecerem a sublime doutrina do santuário celestial figurado pelo terrenal do antigo Israel. O fato de conceberem, pelo livro de Daniel, que Jesus voltaria em 1844 para purificar a terra e salvá-los, é que cumpre a profecia de ter o profeta achado o livrinho doce como o mel ao tomá-lo da mão do anjo e comê-lo.
Nada mais glorioso e mais doce para eles do que um livro que lhes indicava matematicamente não só a volta de seu amado Senhor como também o ano certo de Seu aparecimento. Tiveram a grata satisfação de repetirem as experiências dos profetas Jeremias e Ezequiel ao comerem também a mensagem celestial.2) Esta descoberta que julgavam incontestavelmente verídica, acharam por bem levá-la a todo o mundo, pois o anjo fora visto na visão com um pé na terra e outro no mar. O histórico de todo este sucesso teremos a seguir.
A GRANDE PROCLAMAÇÃO NOS ESTADOS UNIDOS
Em primeiro lugar mencionaremos os Estados Unidos da América do Norte, onde a proclamação da volta de Cristo, em 1844, foi mais intensiva. Ali, Guilherme Miller, um fazendeiro de cerca de 50 anos, de Low Hampton, estado de Nova York, que se tornou pastor da igreja Batista, estudou ardorosamente as profecias de Daniel.
“A profecia que mais claramente parecia revelar o tempo do segundo advento era a de Daniel 8:14: ‘Até duas mil e trezentas tardes e manhãs, e o santuário será purificado’. Seguindo sua regra de fazer as Escrituras seu próprio intérprete, Miller descobriu que um dia na profecia simbólica representa um ano (Números 14:34; Ezequiel 4:6); viu que o período de 2300 dias proféticos, ou anos literais, se estenderia muito além do final da dispensação judaica, donde o não poder ele referir-se ao santuário daquela dispensação.
Miller aceitou a opinião geralmente acolhida, de que na era cristã a terra era o santuário, e, portanto, compreendeu que a purificação do santuário predita em Daniel 8:14 representa a purificação da terra pelo fogo, à segunda vinda de Cristo”.1) Feito o cálculo do grande período profético, Miller convenceu-se afinal de sua conclusão em outubro de 1844. Diante disso, sentiu que era seu dever comunicar a outros a luz que havia recebido.
Miller começou por apresentar suas opiniões primeiramente a particulares. Entretanto, depois de esperar nove anos, afinal, em 1831 expôs pela primeira vez publicamente as razões de sua fé. “Sua primeira conferência foi seguida de um despertamento religioso, no qual se converteram treze famílias inteiras, com exceção de duas pessoas.
Foi imediatamente convidado a falar em outros lugares, e quase em toda parte seu trabalho resultava em avivamento da obra de Deus”. “Em muitos lugares as igrejas protestantes de quase todas as denominações abriram-se-lhe amplamente; e os convites para nelas trabalhar vinham usualmente dos ministros das várias congregações”.
Em 1833 Miller recebeu da igreja batista de que era membro uma licença para pregar. Grande número dos ministros de sua denominação aprovou-lhe também a obra, e foi com essa sanção formal que continuou com os seus trabalhos. Posto que seus labores pessoais estivessem limitados principalmente à Nova Inglaterra e aos estados centrais, viajou e pregou incessantemente”.2)
Vários outros ministros, além dos da igreja batista que se uniram a Miller e sua obra, das igrejas Cristã, Metodista, Congregacionalista, etc., aceitaram de bom grado as ideias de Miller da próxima vinda de Cristo para purificação da terra. O chuveiro de Estrelas predito por Jesus3) e S. João4) como precursor do segundo advento, ocorrido a 13 de novembro de 1833, foi recebido como evidência do dia do juízo próximo anunciado pela pregação de Miller.
Porém, a profecia da queda da Turquia, cumprida em 11 de agosto de 1840 pelos acontecimentos internacionais, levou multidões a se convencerem “da exatidão dos princípios de interpretação profética adotados por Miller e seus companheiros, e maravilhoso impulso foi dado ao movimento do advento. Homens de saber e posição uniram-se a Miller tanto para pregar como para publicar suas opiniões, e de 1840 a 1844 a obra estendeu-se rapidamente”.
1) “O testemunho das profecias que pareciam indicar a vinda de Cristo na primavera de 1844, apoderou-se profundamente do espírito do povo. Ao ir a mensagem de um estado a outro, despertou-se por toda parte grande interesse. Muitos estavam convictos de que os argumentos tirados dos períodos proféticos eram corretos e, sacrificando o orgulho de suas opiniões, recebiam alegremente a verdade.
Alguns ministros puseram de lado suas ideias e sentimentos sectaristas e, renunciando a seus salários e suas igrejas, uniram-se na proclamação da vinda de Jesus. Houve, entretanto, relativamente poucos ministros que aceitaram esta mensagem; foi, por conseguinte, confiada em grande parte aos humildes leigos. Lavradores deixavam os campos, mecânicos, as ferramentas, negociantes, as suas mercadorias, profissionais, os seus cargos; não obstante, o número de obreiros era pequeno em comparação com a obra a ser empreendida.
A condição de uma igreja ímpia, e um mundo jazendo na maldade, pesavam na alma dos verdadeiros atalaias, e eles voluntariamente suportavam as fadigas, privações e sofrimentos, a fim de que pudessem chamar os homens ao arrependimento para a salvação. A obra, ainda que Satanás se opusesse, prosseguia firmemente, sendo a verdade do advento aceita por muitos milhares”.
“Ao serem repetidas as provas da próxima vinda de Cristo, vastas multidões escutavam silenciosas e extasiadas as solenes palavras. O céu e a terra pareciam aproximar-se um do outro. O poder de Deus se fazia sentir em velhos e jovens, e nos de meia-idade. Os homens procuravam seus lares com louvor nos lábios, ressoando o som festivo no ar silencioso da noite. Pessoa alguma que haja assistido àquelas reuniões jamais poderá esquecer-se dessas cenas do mais profundo interesse”.
“A proclamação de um tempo definido para a vinda de Cristo despertou grande oposição de muitos, dentre todas as classes, desde o ministro, no púlpito, até ao mais ousado pecador”. “Muitos que professavam amar o Salvador, declaravam que não se opunha à doutrina do segundo advento; faziam objeções, unicamente, ao tempo definido.
Mas os olhos de Deus, que veem tudo, liam-lhes o coração. Não desejavam ouvir acerca da vinda de Cristo para julgar o mundo com justiça. Haviam sido servos infiéis; suas obras não resistiriam à inspeção do Deus que sonda os corações, e receavam encontrar-se com o Senhor. Tais como os judeus nos dias de Cristo, não estavam preparados para recebê-Lo. Não somente se recusavam ouvir os claros argumentos das Escrituras Sagradas, mas procuravam ridicularizar aos que aguardavam o Senhor. Satanás e seus anjos exultavam e lançavam afronta ao rosto de Cristo e dos santos anjos, por ter Seu povo professo tão pouco amor por Ele que não desejavam o Seu aparecimento”.
Miller e seus cooperadores “não faziam tentativas para converter os homens a uma seita ou partido em matéria de religião. Daí o trabalharem entre todas as facções e seitas, sem interferências comi sua organização ou disciplina”. “Em todos os meus trabalhos”, disse Miller, “nunca tive o desejo ou o pensamento de criar qualquer interesse separado do das denominações existentes, ou de beneficiar uma em detrimento de outra.
Pensava em beneficiar a todas. Supondo que todos os cristãos se regozijassem com a perspetiva da vinda de Cristo, e que os que não viam as coisas como eu as via, não haveriam, por isso, de menosprezar os crentes nesta doutrina, não pensei em qualquer necessidade de reuniões separadas. Todo o meu objetivo se concentrava no desejo de converter almas a Deus, cientificar o mundo do juízo vindouro e induzir meus semelhantes a fazer o preparo de coração que os habilitaria a encontrar-se com seu Deus em paz. A grande maioria dos que se converteram pelos meus trabalhos, uniram-se às várias igrejas existentes”.1)
A nota tônica da pregação de Miller era essencialmente esta: A Segunda Vinda de Cristo em 1844 para purificar o planeta de suas impurezas, e o preparo de um povo para subsistir ante Sua majestosa presença naquela data.
A GRANDE PROCLAMAÇÃO EM OUTROS PAÍSES
“Em 1821, três anos depois de Miller chegar à sua explicação das profecias que apontavam para o tempo do juízo, o dr. José Wolff, ‘o missionário a todo o mundo’, começou a proclamar a próxima vinda do Senhor. Wolff nasceu na Alemanha, de filiação hebreia, sendo seu pai rabino judeu”. “Durante vinte e quatros anos, de 1821 a 1845, Wolff viajou extensamente na África, visitando o Egito e a Abissínia; na Ásia, atravessando a Palestina, Síria, Pérsia, Búcara e a Índia.
Visitou também os Estados Unidos, pregando, na viagem para lá, na ilha de Santa Helena. Chegou a Nova York em agosto de 1837; e depois de falar naquela cidade, pregou em Filadélfia e Baltimore, dirigindo-se finalmente a Washington. Ali, diz ele, ‘por uma proposta apresentada pelo ex-presidente John Adams, em uma das; casas do Congresso, concedeu-se-me unanimemente o uso do salão do Congresso, para uma conferência que eu pronunciei em um sábado, honrada com a presença de todos os congressistas, e também do bispo de Virgínia e do clero e cidadãos de Washington. A mesma honra me foi conferida pelos membros do governo de Nova Jersey e Pensilvânia, em cuja presença fiz conferências sobre minhas pesquisas na Ásia, e também sobre o reino pessoal de Jesus Cristo’.
“O dr. Wolff viajou nos países mais bárbaros, sem a proteção de qualquer autoridade europeia, suportando muitas agruras e cercado de inumeráveis perigos. Foi espancado e sofreu fome, sendo vendido como escravo, e três vezes condenado à morte. Foi assediado por ladrões, e algumas vezes quase pereceu de sede. Uma ocasião despojaram-no de tudo que possuía, obrigando-o a viajar centenas de quilômetros a pé, através de montanhas, descalço e com os pés enregelados ao contacto do chão frio, e o rosto açoitado pela neve.
Quando advertido pelo fato de ir desarmado entre tribos selvagens e hostis, declarava estar ‘provido de armas — oração, zelo para com Cristo e confiança em Seu auxílio’. ‘Também estou provido’, disse ele, ‘do amor de Deus e do meu próximo, em meu coração, e da Bíblia em minhas mãos’. Aonde quer que fosse levava consigo as Escrituras em hebraico e inglês.
De uma de suas últimas jornadas diz ele: ‘Eu... conservava a Bíblia aberta na mão. Sentia que o meu poder estava no livro e que sua força me sustentaria’. Assim perseverou em seus labores até que a mensagem do juízo foi levada a uma grande parte habitável do globo. Entre os judeus, turcos, persas, hindus e muitas outras nacionalidades e raças, ele distribuiu a Palavra de Deus nessas várias línguas, e em toda parte anunciou a proximidade do reino do Messias.
Em suas viagens em Búcara encontrou a doutrina da próxima vinda do Senhor, professada por um povo remoto e isolado. Os árabes do Iémen, diz ele, ‘acham-se de posse de um livro chamado ’Seera’, que dá informação sobre a segunda vinda de Cristo e Seu reino em glória; e esperam ocorrerem grandes acontecimentos no ano de 1840’”.1)
“O Dr. José Wolff, segundo as anotações que fez em seu diário entre os anos 1821 e 1845, proclamou o breve advento do Senhor na Palestina e Egito, às margens do Mar Vermelho, na Mesopotâmia, Criméia, Geórgia, através do Império Otomano, na Grécia, Arábia, Turquestão, Bokara, Afganistão, Cachemira, Hindostão e no Tibet, na Holanda, Escócia e Irlanda, em Constantinopla, Jerusalém, Santa Elena e também a bordo de seu barco no Mediterrâneo, e na cidade de Nova York a todas as denominações”.
“Acerca de seus labores extraordinários o Investigador disse: ‘Possivelmente ninguém deu maior publicidade à doutrina da segunda vinda do Senhor Jesus Cristo que este bem conhecido missionário ao mundo inteiro. Onde quer que vá, proclama o iminente advento do Messias em glória”’2)
“D. T. Taylor fala como segue concernente à ampla difusão da esperança adventista “Em Wurtemberg, há uma colônia cristã que conta com centenas de membros que esperam o próximo advento de Cristo; também há outra que tem a mesma crença nas margens do mar Cáspio.
Os ‘molocanes’, corpo numeroso de dissidentes da igreja grega russa, que residem nas praias do Báltico e são um povo muito piedoso, do qual se diz que ‘toma a Bíblia só como credo, e a norma de sua fé é simplesmente as Santas Escrituras’, se caracteriza por ‘esperar o reinado imediato visível de Cristo na terra’. Na Rússia, a doutrina da vinda de Cristo e seu reinado pregava-se até certo ponto, e a recebem muitos da classe humilde”.1)
“Outro missionário verificou existir crença semelhante na Tartária. Um sacerdote tártaro perguntou ao missionário quando Cristo viria pela segunda vez. Ao responder o missionário que nada sabia a respeito, o sacerdote pareceu ficar grandemente surpreso com tal ignorância de quem professava ser ensinador da Bíblia, e declarou sua própria crença baseada na profecia de que Cristo viria aproximadamente em 1844.
“Já em 1826 a mensagem do advento começou a ser pregada na Inglaterra. O movimento ali não tomou forma definida como na América; o tempo exato do advento não era geralmente tão ensinado, mas proclamava-se, vastamente, a grande verdade da próxima vinda de Cristo em poder e glória. E isto não somente entre os dissidentes e não- conformistas.
Mourant Brock, escritor inglês, declara que mais ou menos setecentos ministros da Igreja Anglicana estavam empenhados na pregação deste ‘evangelho do reino’. A mensagem que indicava 1844 como o tempo da vinda do Senhor, foi também dada na Grã-Bretanha. Publicações sobre o advento, provenientes dos Estados Unidos, eram amplamente disseminadas. Livros e revistas reeditavam-se na Inglaterra”.
“Na América do Sul, em meio da desumanidade e artimanha dos padres, Lacunza, jesuíta espanhol, teve acesso às Escrituras, e recebeu assim a verdade da imediata volta de Cristo. Constrangido a fazer a advertência, e desejando contudo escapar das censuras de Roma, publicou suas ideias sob o pseudônimo de ‘Rabbi Ben-Israel’, representando-se a si mesmo como judeu converso. Lacunza viveu no século dezoito, mas foi aproximadamente em 1825 que seu livro, encontrando acesso em Londres, foi traduzido para a língua inglesa. Sua publicação serviu para aprofundar o interesse que já se despertava na Inglaterra pelo assunto do segundo advento.
“Na Alemanha, a doutrina fora ensinada no século dezoito por Bengel, ministro da igreja luterana e célebre sábio e crítico da Bíblia”. “A luz brilhou também na França e Suíça. Em Genebra, onde Farei e Calvino tinham propagado as verdades da Reforma, Gaussen pregou a mensagem do segundo advento”. “Na Escandinávia, também, a mensagem do advento foi proclamada e suscitou grande interesse.
Muitos despertaram do descuidoso sentimento de segurança para confessar e abandonar seus pecados, buscando perdão em Cristo. O clero da igreja do Estado, porém, opôs-se ao movimento, e por meio de sua influência alguns que pregavam a mensagem foram lançados na prisão. Em muitos lugares, onde os pregadores da próxima vinda do Senhor foram desta maneira silenciados, Deus Se serviu enviar a mensagem de um modo miraculoso, por meio de criancinhas. Como fossem menores, a lei do Estado não as poderia proibir, e foi-lhes permitido falar sem serem molestadas.
“O movimento ocorreu, principalmente, entre as classes mais humildes, e o povo se reunia nas modestas moradas dos trabalhadores para ouvir a advertência. Os mesmos pregadores infantis eram na maior parte pobres habitantes de cabanas. Alguns deles não tinham mais de seis ou oito anos de idade; e, ao mesmo tempo que sua vida testificava que amavam o Salvador e procuravam viver em obediência aos santos mandamentos de Deus, manifestavam, de ordinário, apenas a habilidade e inteligência que usualmente se veem nas crianças daquela idade.
Quando se encontravam em pé diante do povo, evidenciava-se, entretanto, que eram movidos por uma influência acima dos seus dotes naturais. O tom da voz e as maneiras se transformavam, e com poder solene faziam a advertência do juízo, empregando as próprias palavras das Escrituras: ‘Temei a Deus, e dei-lhe glória; porque vinda é a hora de Seu juízo’. Reprovavam os pecados do povo, não somente condenando a imoralidade e o vício, mas repreendendo o mundanismo e a apostasia, admoestando os ouvintes a que fugissem apressadamente da ira vindoura.
“O povo ouvia com tremor. O Espírito convincente de Deus falava- lhes ao coração. Muitos eram levados a investigar as Escrituras com novo e mais profundo interesse; os intemperantes e imorais corrigiam-se; outros abandonavam as práticas desonestas, e fazia-se uma obra tão assinalada, que mesmo ministros da igreja do Estado eram obrigados a reconhecer que a mão de Deus estava no movimento. Era vontade de Deus que as novas da vinda do Salvador fossem dadas nos países escandinavos; e, quando silenciou a voz de Seus servos, pôs Ele Seu Espírito sobre as crianças para que a obra pudesse cumprir-se”.1)
E’ surpreendente que o grande movimento mundial foi levantado em vários países da terra. Homens especiais foram despertados simultaneamente em vários pontos do planeta e, sem comunicação entre si, fizeram ressoar a grande proclamação em todo o mundo civilizado.
Diz-se que Guilherme Miller, o líder do movimento nos Estados Unidos, tinha em setembro de 1844 o endereço de 3000 pregadores em todo o mundo, cuja mensagem era — “Temei a Deus, e dai-lhe glória, porque vinda é a hora do Seu juízo”. Todos, incluso até as crianças da Escandinávia, tinham uma nota tônica única — a segunda vinda de Cristo para juízo, em 1844. Quão doce era para as massas que assim criam o livrinho de Daniel, que por sua maior profecia os concitava ao preparo para abraçarem logo a seu amado Salvador.
O LIVRINHO DOCE TORNOU-SE AMARGO
Aqueles que aguardavam a Cristo em 1844, nos Estados Unidos, estabeleceram a data de 21 de março para encontrarem-se com o Senhor. “Na primavera alguns crentes tinham tal impressão de que o Senhor viria antes de outro inverno, que não cultivaram seus campos.
Alguns que os cultivaram e plantaram tão certos estavam de que Ele viria naquele outono, que não fizeram suas colheitas. Outros, diz-se, saíram à ceifa, mas sentiram-se incapazes de prosseguir, e lá as deixaram, para mostrar sua fé por suas obras. Certo adventista encontrou um solícito vizinho que se ofereceu para colher-lhe as batatas, dizendo: ‘Talvez o senhor precise delas’. ‘Não!’ disse o homem de fé. ‘Deixarei que esse campo de batatas pregue minha fé no breve aparecimento do Senhor”.1)
Mas a data prefixada de 21 de março de 1844 passou e Jesus não apareceu. Os sinceros crentes ficaram por algum tempo envoltos em indizíveis perplexidades e com angústia d’alma voltaram a investigar novamente a palavra de Deus e buscar nas profecias as provas de sua fé. Alguns “crentes que não haviam consagrado inteiramente sua vida à mensagem, voltaram-se contra ela.
Fizeram tudo que podiam para prejudicar os que ainda se apegavam à doutrina da próxima vinda do Senhor, e à mensagem da hora do juízo”.2) “Muitos dos crentes adventistas não abandonaram, no entanto, a sua fé. Admitiam francamente ter havido um erro, mas mostravam que a parábola das dez virgens indicava que haveria um TEMPO DE TARDANÇA.
Estudaram diligentemente e oraram com fervor, pedindo luz. S. S. Snow abraçou a opinião de que, como os tipos que apontavam ao segundo advento do Salvador eram observados pelos judeus no décimo dia do sétimo mês do ano sagrado judaico, assim os 2300 dias terminariam no décimo dia do sétimo mês (tempo judaico) ou seja a 22 de outubro de 1844.
Ora, como haviam eles chegado a esse tempo de tardança? — Cometeram o engano de colocar o princípio dos 2300 dias na primavera em lugar de o fazer no outono. O decreto para restaurar e edificar Jerusalém, foi dado” “por Artaxerxes Longímano no sétimo ano de seu reinado. Entrou em vigor no outono do ano 457 A. C. Assim o dia 22 de outubro de 1844 foi fixado pelos crentes do advento como data definida em que Jesus devia vir”.3)
A parábola das 10 virgens4) ilustra perfeitamente o não aparecimento de Cristo a 21 de março de 1844. “E tardando o Esposo”, reza a parábola, “tosquenejaram todas” as virgens, “e adormeceram”. “Pela tardança do Esposo é representada a passagem do tempo em que o Senhor era esperado, o desapontamento, e aparente demora”.5) Todavia, a nova data — 22 de outubro — fundamentava agora a esperança da vinda de Cristo naquele ano de 1844. O clamor da meia noite
— Aí vem o Esposo, saí-lhe ao encontro — tornou-se então a nota tônica do movimento no verão de 1844 próximo ao grande dia.
“Semelhante à vaga da maré, o movimento alastrou-se pelo país. Foi de cidade em cidade, de aldeia em aldeia, e para os lugares distantes, no interior, até que o expectante povo de Deus ficou completamente desperto. Desapareceu o fanatismo ante essa proclamação, como a geada matutina perante o sol a erguer-se. Viram os crentes suas dúvidas e perplexidades removidas, e a esperança e coragem animaram-lhes o coração”. “Ao brado: ‘Aí vem o Esposo; saí-lhe ao encontro’, os expectante ‘se levantaram, e prepararam as suas lâmpadas’; estudavam a Palavra de Deus com interesse mais intenso do que nunca.
Eram enviados anjos do céu para despertar os que se haviam desanimado e prepará-los para receber a mensagem. A obra não se mantinha pela ciência e saber dos homens, mas pelo poder de Deus. Não foram os mais talentosos os primeiros a ouvir e obedecer à chamada, mas os mais humildes e dedicados. Lavradores deixaram as colheitas nos campos, mecânicos depuseram as ferramentas, e com lágrimas e regozijo saíram a dar a advertência.
Os que anteriormente haviam dirigido a causa foram dos últimos a unir-se a este movimento. As igrejas, em geral, fecharam as portas a esta mensagem, e numeroso grupo dos que a receberam cortou sua ligação com as mesmas. Na providência de Deus, esta proclamação se uniu com a mensagem do segundo anjo, conferindo poder à obra”.1)
O clamor da meia noite corresponde à mensagem do segundo anjo do Apocalipse quatorze, e bem fará o leitor considerá-lo agora mesmo para apreciá-la no inteiro conjunto dos acontecimentos.
“À medida que se aproximava o tempo, 22 de outubro de 1844 — faltando ainda apenas algumas semanas ou dias — os mensageiros cresceram em fervor nos apelos a amigos e vizinhos. Ao partirem, eram as despedidas deveras solenes. Numa reunião campal, a derradeira que esperavam realizar nesta terra, irmão apertava a mão de irmão, cada um apontando ao outro a reunião final do grande acampamento na Nova Jerusalém.
“Recursos haviam afluído abundantemente. Milhares de revistas e folhetos eram espalhados. Alguns que se haviam apegado a seus bens, rogavam nos últimos dias para que os dirigentes do movimento os aceitassem. ‘Vindes demasiado tarde. Não precisamos de dinheiro agora’, era a recusa. Não esperavam absolutamente publicar mais nem um nada de literatura.
“Chegou, enfim, o dia. Encontrou milhares à espera. Não tinham tomado providências para coisa alguma terrestre além daquela data. Nem sequer nutriam o pensamento: ‘Se Ele não vier’. Com expectante ansiedade, reuniam-se nas casas de culto, esperando a cada instante ouvir ‘a voz do Arcanjo’ e ‘a trombeta de Deus’, e ver Jesus, seu Rei, vindo levá-los para o lar.
Alguns que se não haviam unido aos crentes adventistas, foram possuídos de solenidade diante da fervorosa sinceridade deles, e vigiavam apreensivos enquanto o dia passava. Outros continuavam ridicularizando. Em certo lugar, enquanto os crentes congregados oravam a Deus, os zombadores reuniram-se em torno do prédio. Dois dos mais ousados vestiram longos vestidos brancos e, trepando no telhado da casa, cantaram hinos e escarneceram. Desse incidente provém a história de que os crentes puseram vestidos para a ascensão, e esperaram pela vinda de seu Senhor”.1)
E o dia 22 de outubro passou, como passara o dia 21 de março, e Jesus não deu sequer sinal de Sua segunda vinda à terra. “Um sentimento de terror, e receio de que a mensagem pudesse ser verdadeira, servira algum tempo de restrição ao mundo incrédulo. Passado que foi o tempo, esse sentimento não desapareceu de pronto; a princípio não ousaram exultar sobre os que foram dececionados; mas, como sinais nenhuns da ira de Deus se vissem, perderam os temores e reencetaram a exprobração e o ridículo.
Numerosa classe, que tinha professado crer na próxima vinda do Senhor, renunciou à fé. Alguns, que se sentiam muito confiantes, ficaram tão profundamente feridos em seu orgulho, que pareciam estar a fugir do mundo. Como outrora Jonas, queixavam-se de Deus e preferiam a morte à vida. Os que haviam baseado sua fé nas opiniões de outrem, e não na Palavra de Deus, achavam-se agora novamente prontos para mudar de ideias.
Os escarnecedores ganharam para as suas fileiras os fracos e covardes, e todos estes se uniram para declarar que não mais haviam motivos de receios ou expectação. O tempo havia passado, o Senhor não viera, e o mundo poderia permanecer o mesmo por milhares de anos.
“Os crentes fervorosos e sinceros haviam abandonado tudo por Cristo, desfrutando Sua presença como nunca dantes. Conforme acreditavam, tinham dado o último aviso ao mundo; e, esperando serem logo recebidos na companhia do divino Mestre e dos anjos celestiais, tinham-se em grande parte retirado da companhia dos que não receberam a mensagem. Com intenso desejo haviam eles orado: ‘Vem, Senhor Jesus, e vem presto’. Mas Ele não viera. E, agora, assumir de novo o fardo pesado dos cuidados e perplexidades da vida, suportar as exprobrações e zombarias de um mundo escarnecedor, era uma terrível prova de fé e paciência”2)
“O sentir dos que ainda criam que Deus os havia guiado em sua experiência, exprime-se nestas palavras de Guilherme Miller: ‘Tivesse eu de viver de novo a minha vida, com a mesma evidência que tive então de ser sincero para com Deus e o homem, eu teria de agir como agi’. ‘Espero ter limpado minhas vestes do sangue das almas. Sinto que, tanto quanto estava em meu poder, me livrei de toda culpa em sua condenação’. ‘Posto que tenha sido duas vezes desapontado’, escreveu este homem de Deus, ‘ainda não estou abatido nem desanimado... Minha esperança na vinda de Cristo é tão firme como sempre.
Fiz apenas aquilo que, depois de anos de solene consideração, compreendi ser meu dever sagrado fazer. Se errei, foi do lado da caridade, do amor para com os meus semelhantes e da convicção do dever para com Deus’. ‘Uma coisa sei: nada preguei que não cresse, e Deus foi comigo; Seu poder se manifestou na obra, e muito benefício foi feito’. ‘Muitos milhares, segundo a aparência humana, foram levados a estudar as Escrituras pela pregação da profecia acerca do tempo; e por esse meio, mediante a fé e aspersão do sangue de Cristo, foram reconciliados com Deus’. ‘Nunca solicitei a aprovação dos orgulhosos, nem desfaleci quando o mundo se mostrava hostil.
Não comprarei hoje o seu favor, tão pouco irei além do dever, para não lhes despertar o ódio. Jamais lhes implorarei minha vida, nem tão pouco vacilarei, espero, em perdê-la, se Deus em Sua bondosa providência assim o determina’”1)
O grande erro do movimento consistiu em não compreenderem seus dirigentes a natureza do acontecimento que tomaria lugar no fim do período profético das 2300 tardes e manhãs ou anos, findo na primavera, isto é, em outubro de 1844. Porém, o versículo onze do capítulo dez e os dois primeiros do capítulo onze, elucidam-nos com afinco sobre o verdadeiro acontecimento daquele memorável ano e abrem-nos o caminho para encontrarmos o verdadeiro povo de Deus da presente geração, representado nas virgens prudentes da parábola que entraram com o “Esposo” “para as bodas”.
"IMPORTA QUE PROFETIZES OUTRA VEZ"
VERSO 11 — “E ele disse-me: Importa que profetizes outra vez a muitos povos, e nações e línguas e reis”.
S. João é aqui ainda o representante daqueles que sofreram a amarga decepção em 1844. Por seu intermédio é lhes enviada a mensagem contida neste undécimo versículo. E’ deveras notável como a profecia indica neste texto um novo movimento mundial constituído de elementos dentre os que sofreram a amargura de não contemplarem o Salvador vindo em 1844 para remi-los.
“Importa que profetizes outra vez”. Outra vez deviam levantar o clamor mundial da segunda vinda de Cristo, sem no entanto assinalarem uma nova data para o Seu aparecimento. Foi esta uma das razões porque sofreram a amarga decepção: Não considerarem o capítulo dez do Apocalipse, especialmente o versículo onze que estabelece a prossecução da mensagem da segunda vinda de Cristo num novo movimento ainda de maiores proporções.
E também não levaram em conta o capítulo quatorze em que o terceiro anjo devia seguir aos primeiro e segundo que os representavam. O terceiro anjo está evidentemente inserido no versículo onze do décimo capítulo. Mas não o enxergaram, e, por este motivo, a profecia antecipou-se em revelar a grande amargura do, para eles, trágico ano de 1844.
Aqueles, porém, que depois da grande desilusão ainda permaneceram em suas primitivas convicções quanto à data de 22 de outubro de 1844, “com fervorosa oração examinaram a sua atitude e estudaram as Escrituras para descobrir onde haviam errado. Como não pudessem ver engano algum no cômputo dos períodos proféticos, foram levados a examinar mais particularmente o assunto do santuário”.
1) E o resultado do exame temo-lo nos dois primeiros versículos do capítulo onze que se ligam estreitamente com este último do capítulo dez. Ali vemos a questão do santuário, relacionada com o ano de 1844, solucionada pela profecia, bem como o surgimento dum novo movimento mundial cujo centro de culto e adoração é o santuário celestial.