Este capítulo encerra dois grandes fatos estreitamente ligados ao plano da salvação de Deus. O primeiro é uma introdução às sete pragas vindouras da ira de Deus, que assinalam o fim da graça divina. O segundo é uma grandiosa visão dos salvos vitoriosos, vistos num glorioso lugar denominado de “mar de vidro”.
Embora tão pequenino seja êste capítulo, adverte-nos solenemente quanto ao não distante derramamento dos juízos de Deus, para cujo tempo devemos nos precaver, com a devida urgência. Do outro lado, anima-nos com a maravilhosa esperança da vitória triunfal, em Cristo, sôbre os Seus e nossos inimigos perseguidores e opositores.
OS SETE MENSAGEIROS DA IRA
VERSO 1 — “E vi outro grande e admirável sinal no céu: sete anjos, que tinham as sete últimas pragas; porque nelas é consumada a ira de Deus”.
UM GRANDE E ADMIRÁVEL SINAL
A cena que se descortina neste versículo é uma das mais majestosas das visões do Apocalipse. As palavras do profeta bem evidenciam a emoção que dêle tomou posse ao declarar ter visto no céu “outro grande e admirável sinal”. Um novo grupo de sete anjos surge ante seus olhos videntes.
O primeiro grupo, o das sete trombetas, representa os vitoriosos guerreiros de Deus contra Seus inimigos desde Roma até ao fim. O segundo grupo, que é o que agora apreciamos, representa os mensageiros da ira de Deus sôbre Seus inimigos vencidos.
"AS SETE ÚLTIMAS PRAGAS"
Esta expressão torna claro que já outras pragas foram no passado derramadas na terra. Evidentemente o antigo Egito recebeu o impacto direto de dez juízos especiais de Deus — dez tremendas pragas. De modo assombroso relata-nos o livro do Êxodo o décuplo cataclisma sôbre os obstinados egípcios, especialmente Faraó e seus grandes.1)
"PORQUE NELAS É CONSUMADA A IRA DE DEUS"
Consumar implica em terminar. Isto faz-nos crer que os juízos de Deus já desde algum tempo estão caindo na terra, vindo depois as sete pragas para completar a ira de Deus sôbre um mundo endoidecido e perverso.
Todas as calamidades geológicas, climatológicas e outras de caráter moral e físico por culpa do próprio homem, são agentes de Deus para açoitar o impenitente, desejando acordá-lo do letárgico sono de sua perversão dos mais altos valores morais e de ingratidão para com o céu. “As sete últimas pragas” são a coroa dos juízos de Deus sôbre um mundo que não desejou corresponder aos reclamos amoráveis do celeste e bondoso Pai. Seus juízos são, portanto, justos.
A consumação da ira de Deus nas sete pragas não é uma revelação de ódio de Deus pelos impenitentes pecadores, mas sim a inolvidável manifestação da justiça de Deus sôbre os desprezadores do imenso sacrifício da cruz para remi-los salvando-os para um reino de paz e amor.
O CÂNTICO TRIUNFAL DOS REMIDOS
VERSOS 2-4 — “E vi um como mar de vidro misturado com fogo; e também os que sairam vitoriosos da bêsta, e da sua imagem e do seu sinal, e do número do seu nome, que estavam junto ao mar de vidro, e tinham as harpas de Deus.
E cantavam o cântico de Moisés, servo de Deus, e o cântico do Cordeiro, dizendo: Grandes e maravilhosas são as tuas obras, Senhor Deus Todo-poderoso! justos e verdadeiros são os teus caminhos, ó Rei dos santos. Quem te não temerá, ó Senhor, e não magnificará o Teu nome? Porque só Tu és santo; por isso tôdas as nações virão, e se prostrarão diante de ti, porque os Teus juízos são manifestos”.
O MAR DE VIDRO
O versículo seis do capítulo quatro diz que o mar de vidro está diante do trono de Deus e que é semelhante ao cristal. Ainda nos diz que continha uma mistura de fogo ou que refletia a glória emanante do trono de Deus. Isto dá-nos uma idéia da maravilha dêste lugar diante do trono de Deus.
Realmente não há pena humana capaz de descrever o lugar em linguagem da terra e ainda com as poucas informações da revelação. João mesmo também não achou palavras precisas para descrevê-lo em sua grandiosa maravilha. Só ali estando poder-se-á ter uma visão exata do que seja um mar de cristal misturado com fogo, criado por Deus e refletindo Sua glória.
NO MAR DE VIDRO OS VITORIOSOS DA BÊSTA E SUA IMAGEM
E’ desnecessário descrever aqui a besta, sua imagem, seu sinal e o número de seu nome, tudo já descrito no capítulo treze. No mar de vidro, porém, estarão aquêles que sairão vitoriosos destes poderes em conflito que ainda está no futuro, quando o sinal da bêsta fôr imposto sob as mais graves ameaças e a imagem da bêsta fôr já uma realidade.
1) Comparando as primeiras partes dos capítulos sete e quatorze, concluímos que os que estarão no mar de vidro serão os 144.000; pois na verdade eles são os santos que terão de enfrentar a ira da bêsta e de sua imagem, no derradeiro fim, por recusarem o sinal da bêsta e preferirem o sêlo do Deus vivo!
O CÂNTICO DE MOISÉS
O cântico de Moisés tem a sua razão de ser. Foi cantado pelas hostes de Israel, junto do Mar Vermelho, depois da grande vitória que obtiveram sôbre Faraó e seu exército. “Apenas Jeová lhes trouxera livramento, e para Êle volveram os corações com gratidão e fé. Sua emoção encontrou expressão em cânticos de louvor. O Espírito de Deus repousou sôbre Moisés, e êle dirigiu o povo em uma antífona triunfante de ações de graças, a primeira e uma das mais sublimes que pelo homem são conhecidas”. “Este cântico e o grande livramento que êle comemora, produziram uma impressão que nunca se dissiparia da memória do povo hebreu.
De século em século era repercutido pelos profetas e cantores de Israel, testificando que Jeová é a força e livramento daqueles que nÊle confiam. Aquele cântico não pertence ao povo judeu únicamente. Êle aponta, no futuro, a destruição de todos os adversários da justiça, e a vitória final do Israel de Deus. O profeta de Patmos vê a multidão vestida de branco, dos que ‘sairam vitoriosos’, em pé, sôbre o ‘mar de vidro misturado com fogo’, tendo as ‘harpas de Deus. E cantavam o cântico de Moisés, servo de Deus, e o cântico do Cordeiro”’.2) No capítulo quinze do livro do Êxodo encontra-se o cântico de Moisés.
O CÂNTICO DO CORDEIRO
Este glorioso cântico da graça e redenção é descrito na própria profecia. As obras da criação são postas em evidência primária no glorioso cântico, o que testifica que os que o cantarão terão sido fiéis observadores do Sábado do sétimo dia, por onde Deus é reconhecido como Criador de tôdas as coisas do Seu universo.
Numa reivindicação solene e jubilosa dos cantores dêste cântico, serão os caminhos de Deus declarados “justos e verdadeiros”, pelo que expressarão com isto ter valido a pena peregrinarem na terra pelos santos caminhos, pois reconhecerão que isto lhes valera o prêmio da eterna salvação de Deus.
O sublime cântico finda com tributo de honra e exaltação ao Senhor digno de ser temido e magnificado por Suas obras, por Sua justiça e por Sua santidade, diante de Quem todas as nações dos salvos se prostrarão pelos séculos infindos da gloriosa eternidade.
Verdadeiramente, “há um dia bem próximo a surgir sobre nós quando os mistérios de Deus serão visíveis, e todos os Seus caminhos vindicados; quando a justiça, a misericórdia e o amor serão os atributos de Seu trono. Quando a luta terrestre estiver terminada, e todos os santos remidos no lar, nosso primeiro tema será o Cântico de Moisés, o servo de Deus. O segundo tema será o cântico do Cordeiro, o cântico da graça e redenção.
Este hino será mais retumbante, mais elevado e em acordes mais sublimes, a ecoar e reecoar nas cortes celestiais. Assim o cântico da providência de Deus é cantado, ligando as diversas dispensações; porque tudo é agora visto sem qualquer véu entre o legal, o profético e o evangelho. A história da igreja redimida no céu tudo se centraliza em tôrno da cruz do Calvário. Êste é o tema, este é o cântico — Cristo tudo em todos — em antífonas de louvor ressoando através do céu de milhares e de milhões de milhões e uma inumerável companhia da hoste redimida. Todos se unem neste cântico de Moisés e do Cordeiro. E’ um novo cântico, pois jamais foi cantado no céu”.1)
AS SALVAS DA IRA ENTREGUES AOS SETE ANJOS
VERSOS 5-7 — “E depois disto olhei, e eis que o templo do tabernáculo do testemunho se abriu no céu. E os sete anjos que tinham as sete pragas sairam do templo, vestidos de linho puro e resplandecente, e cingidos com cintos de ouro pelos peitos. E um dos quatro animais deu aos sete anjos sete salvas de ouro, cheias da ira de Deus, que vive para todo o sempre”.
O templo celeste, abre-se agora não para dar a entender que uma nova mensagem apelativa ou de graça seria proclamada na terra, mas para dar saída aos sete mensageiros angélicos da destruição. Êstes anjos haviam ido ao templo do Todo-poderoso para receber as salvas da sua ira e derramarem-nas sobre as cabeças daqueles que menosprezaram o derradeiro convite da misericórdia dum Deus amoroso e longânimo.
Vestidos com vestes emblemáticas da pureza e da fé, estão preparados para cumprirem a terrível missão a êles confiada. Êstes santos seres, que tantas vêzes procuraram imperceptìvelmente auxiliar os mortais na aquisição da gratuita salvação de Deus, são agora novamente enviados a êles, não mais para renovarem os apelos do céu, mas para sôbre êles arrojarem aquilo que seus próprios atos, voluntariamente, demandaram.
De um dos quatro animais, recebem, em taças de fino ouro transbordantes, a “ ira de Deus que vive para todo o sempre”, sem a mínima mescla de misericórdia de que era acompanhada em outros tempos. O impenitente pecador terá que sorver, até à última gôta, a ira sem a suavizante esperança de clemência. Mas isto é o quinhão que êle mesmo escolheu. Êle receberá não o que Deus para êle escolheu, porque isto êle decididamente rejeitou, mas aquilo que foi a sua própria escolha em desafio ao amante Pai celeste.
O TERMO DA DIVINA GRAÇA
VERSO 8 — “E o templo encheu-se com o fumo da glória de Deus e do Seu poder; e ninguém podia entrar no templo, até que se consumassem as sete pragas dos sete anjos”.
O FECHAMENTO DA PORTA DA GRAÇA
Antes do derramamento das sete taças da ira de Deus, a misericordiosa porta da divina graça, apontada ao pecador por quase seis milênios, terá que fechar-se para não mais abrir-se. O fato de ninguém mais poder entrar mo templo durante o lançamento das sete pragas, é indicativo de que não haverá mediador em prol do pecador durante o período em que elas serão lançadas na terra; o templo encher-se-á, não mais com o fumo do incenso meritório do incensário do divino Intercessor, mas do “fumo da glória de Deus e do Seu poder”, numa indicação de que o Todo-poderoso se satisfez com a obra levada a cabo no templo em favor do contrito pecador, por Seu Filho amado.
Multidões, infelizmente, ficarão do lado de fora como ficaram no tempo de Noé ao vir o dilúvio. A porta da arca salvadora, figura da porta da graça divina, fechou-se sem que as massas percebessem que haviam lavrado o próprio destino.1)
O QUE É A GRAÇA? COMO TOMAR POSSE DELA?
Estas perguntas surgem como encerramento dêste capítulo, em virtude de que não poucas pessoas desconhecem o que seja a graça, embora creiam que serão salvos por ela. Com frequência e para esquivarem-se a certas responsabilidades impostas pela vida cristã, asseveram que estão agora na dispensação da graça, como se não houvesse graça nos tempos do Velho Testamento, quando tais responsabilidades eram exigidas como indispensáveis.
Se na verdade não houvesse graças antes da crucificação de Cristo, os que viveram antes da cruz não poderão ser salvos, pois todos pecaram e o salário do pecado é a morte. Que somos salvos pela graça não há dúvida alguma; e, que a graça não nos excusa de todas as responsabilidades da vida cristã, também não há dúvida.2)
Mas, afinal, o que é a graça? Muitos dos que dizem ser salvos pela graça, não sabem explicá-la. São Paulo define-nos a graça de modo maravilhoso dizendo: “Porque a graça de Deus se há manifestado, trazendo salvação a todos os homens”.
1) Entendemos, então, que a graça de Deus é o grande plano divino centralizado em Cristo, para salvação de todo pecador perdido. E esta graça, êste grandioso plano da infinita misericórdia é, em outras palavras, o evangelho de Cristo como contido nas Sagradas Escrituras.2) Assim graça e evangelho são sinônimos da redenção que há em Cristo Jesus.
Sabendo já o que é a graça, perguntamos: Como podemos apoderar-nos dela? Neste ponto vital nos elucida São Paulo, dizendo: “Pelo qual (por Cristo) também temos entrada pela fé a esta graça, na qual estamos firmes, e nos gloriamos na esperança da glória de Deus”.
3) E, depois de nos apoderarmos da graça pela fé, somos justificados por ela dos nossos pecados: “Porque todos pecaram e destituídos estão na glória de Deus; sento justificados gratuitamente pela graça, pela redenção que há em Cristo Jesus”.4) Mas, quem poderá, em verdade, ser justificado pela graça através de Cristo? Aqui está a resposta do apóstolo: “Mas os que praticam a lei hão de ser justificados”.5)
Ora, uma vez que é indispensável a fé para nos apossarmos da graça e da observância da lei de Deus para sermos justificados por ela, concluímos que a fé e a lei estão unidas na salvação pela graça, ou que é indispensável harmonizarmos a fé com a lei e esta com aquela, para, somente assim, nos assenhorearmos da graça e da justificação.
Aí somos salvos pela graça através da fé que aceita e observa a lei de Deus: “Porque pela graça sois salvos por meio da fé; e isto não vem de vós; é dom de Deus”.6) “Anulamos, pois, a lei pela fé? De maneira nenhuma, antes estabelecemos a lei”.7) Resumindo êste parágrafo, podemos assentar que a pessoa que possui uma fé que a harmonize com a lei de Deus, é, sem contradição alguma, a pessoa capacitada para tomar posse da graça, ser por ela justificada e afinal salvar-se por ela para a vida eterna.
O pecador é perdoado dos seus pecados e justificado pela graça do Salvador, não para continuar a violar a lei, mas para daí em diante viver em harmonia com ela. Diz ainda S. Paulo: “Porque o pecado não terá domínio sobre vós, pois não estais debaixo da lei, mas debaixo da graça.
Pois que? Pecaremos porque não estamos debaixo da lei, mas debaixo da graça? De modo nenhum”.8) Aqui temos claramente enfatizado que os que estão debaixo da graça divina não pecam contra a lei de Deus, mas vivem em harmonia com a divina lei por estarem debaixo da graça de Deus.
O apóstolo Paulo apela que todos cheguemos “com confiança ao trono da graça”.9) Disto compreendemos que a existência de um trono implica na existência de um reino, e, a existência de um reino, implica na existência de uma lei do mesmo reino.
Não pode assim existir o reino da graça sem nêle existir a lei, básica da sua justiça para os justificados súditos que nêle vivem perdoados pelo Rei de tal reino — Nosso Senhor Jesus Cristo. Assim os que querem se eximir da lei de Deus no reino de Sua graça, não sabem realmente o que fazem. Em verdade estão fora do reino da graça.