O livro que consideramos constitue uma verdadeira maravilha da Inspiração. Certamente e com muita antecedência, determinou Deus, em Seu conselho, prover e revelar aos homens a inédita matéria histórica e profética nele contida. A grandeza de suas duas sessões é de tal natureza que o mundo não poderia ficar privado de tão indispensável revelação que demonstra com clareza a supremacia absoluta de Deus.
Um único pensamento, se queremos referí-lo, domina inteiramente tanto a parte Histórica como a Profética do livro: — O controle de Deus sôbre os poderes da Terra para o cumprimento de Seu eterno propósito.
Diante, pois, da magnitude da obra em apreço, exigiu ela um grande autor humano inspirado, um eminente homem de Deus, um porta-voz digno do Todo-poderoso. E, para tão empolgante missão do Céu êste homem não foi escolhido à revelia. O divino Revelador soube escolher um personagem de caráter, de vida santificada, de princípios fundamentais e nobres, que pudesse revelar com firmeza — em palavras e obras — à antiga Babilônia e ao mundo de todo o futuro, a um Deus supremo e único bem como o Seu grandioso plano de amor para a redenção do gênero humano.
Sim, a escolha de Deus recaiu num homem cônscio de seu dever, habilitado a expôr o inédito plano divino e capacitado a apelar ao coração e consciência tanto de reis e cortesões de seus dias como dos homens de todos os séculos por vir, afim de tomarem conhecimento da redentora mensagem, de Deus advinda por seu intermédio e a examinarem com interesse.
Daí qualquer homem não servir para o honrado encargo. Em verdade não era simplesmente questão dum homem para que Deus o pudesse usar para tão sublime propósito, mas sim dum caráter santo e puro, sábio e humilde, despretensioso e compreensível, acessível e moldável pela Onipotência. Só um tal homem representaria com plena vantagem e real sucesso os desígnios do Excelso e o Seu amor em comunicar aos homens as resoluções de Seu eterno conselho.
E o homem apontado por Deus para tão elevado empreendimento, foi, como não poderia deixar de ser — Daniel, o príncipe de Judá. Infalívelmente Deus o escolheu dantemão em Seus desígnios para que desempenhasse o importante papel inspirado que desempenhou nas duas cortes citadas, de Babolônia e da Medo-Persa, tal como se depara-nos na primeira parte de seu notável livro, e legasse à humanidade, em Seu nome, a extraordinária cadeia de revelações que constitue a segunda parte de sua inigualável obra.
A história de Daniel é uma história notável. Sua fé e seus santos princípios prevaleceram contra tôda a oposição e corrupção. A pena da Inspiração o apresenta como um caráter brilhante, imaculado e irrepreensível. A luz do céu dele irradiava em torrentes inexauríveis, e em Babilônia sua fé foi compreendida como a virtude que lhe enobrecia a vida c lhe embelezava o caráter.
Homem íntegro, complexo, inatacável, teve a seu favor o maior testemunho de seus próprios inimigos; “Nunca acharemos ocasião alguma contra êste Daniel...”1. Sua vida é hoje ainda uma inspirada ilustração do que constitue um caráter santificado. Constituiu Daniel em todo o passado e ainda constitue no presente, um nobre exemplo do que podem tornar-se os homens quando unidos incondicionalmente com Deus.
Daniel foi um homem de verdadeira fé, de fervente oração, de profunda consideração para com as coisas de Deus. Moral e espiritualmente corajoso e dedicado ao dever. Intelectualmente era um gigante. Foi reconhecida como o maior sábio de seu tempo e até ao presente nenhum indivíduo humano o igualou em sabedoria. Moralmente era completo — nenhum engano terreno foi capaz de corrompê-lo.
Embora colocado onde a tentação em todo o sentido era forte; onde a dissipação imperava em todos os lados; onde a glutonaria, intemperança e imoralidade eram a ordem do dia, propôs não se contaminar mas permanecer firme ao lado da moralidade e da justiça. Levado em sua plena juventude como um cativo à mais corrompida côrte e cidade de seus dias, permaneceu como uma inabalável coluna em meio à tempestade de tôda a espécie de pecados e degradação. Tomou o propósito e o cumpriu à risca de não adotar os perversos costumes de Babilônia.
“Daniel possuía a graça de genuína mansidão. Era verdadeiro, firme e nobre. Procurava viver em paz com todos, ao mesmo tempo que era inflexível corno o cedro altaneiro, no que quer que envolvesse princípios. Em tudo que não entrasse em colisão com sua fidelidade de Deus, era respeitoso e obediente para com aqueles que sobre ele tinham autoridade; mas tinha tão elevada consciência das exigências de Deus que as de governadores terrenos se lhes subordinavam. Êle não seria induzido por nenhuma consideração egoista a desviar-se de seu dever.
“O caráter de Daniel é apresentado ao mundo como um admirável exemplo do que a graça de Deus pode fazer de homens caídos por natureza e corrompidos pelo pecado. O registro de sua vida nobre, e abnegado, é uma animação para a humanidade em geral. Dela podemos reunir forças para resistir nobremente a tentação, e firmemente na graça da mansidão, suster-nos pelo direito sob a mais severa provocação”.1
Em Babilônia Daniel, ainda que um profeta de Deus, galgou o posto de maior estadista de todos os tempos no cargo de primeiro ministro ao lado do rei Nabucodonosor, o monarca mundial. Deus o colocou ao lado do trono do mundo como uma gloriosa luz para todos quantos quizessem aprender do Deus vivo e verdadeiro. “Em nome de Deus, Daniel revelou ao rei a mensagem celeste de instrução, advertência e reprovação, e não foi repelido”.2
“Em Babilônia, Daniel foi pôsto em funções muito probantes, mas ao passo que desempenhava fielmente os seus deveres de estadista, evitou firmemente participar de qualquer coisa que fôsse contrária a Deus. Êsse procedimento provocava discussões, e o Senhor atraiu, assim, a atenção do rei de Babilônia para a fé de Daniel. Deus tinha luz para conceder a Nabucodonosor, e por meio de Daniel foram apresentadas ao rei as coisas preditas nas profecias concernentes a Babilônia e a outros reinos. Por meio da interpretação do sonho de Nabucodonosor, Jeová foi exaltado como sendo mais poderoso que os governantes terrestres. Assim, pela fidelidade de Daniel, Deus foi honrado”.3
A Onipotência, em Sua sabedoria, empregou meios para despertar favoravelmente a atenção do rei Nabucodonosor para Daniel como Seu representante em sua côrte. Isto ilustra a maneira como Deus usa os homens para cumprir o Seu propósito sôbre a terra. O Senhor pôde usá-lo porque êle era um homem de princípios, um homem de genuíno caráter, um homem cujo principal objetivo nesta vida era viver unicamente para Deus.
Daniel “propôs em seu coração” viver em harmonia com tôda a vontade revelada do céu. E com isto pôde Deus exaltá-lo e fazê-lo Seu honrado representante naquele reino. Em primeiro lugar despertou Deus a simpatia e o favor dos oficiais de Babilônia para com êle. Isto preparou o caminho para o segundo passo, — a demonstração da superioridade física de Daniel e seus companheiros. Então seguiu-se a demonstração de superioridade intelectual. Assim, em personalidade, físico e intelecto, Daniel provou ser marcadamente superior aos demais homens de seu tempo, ganhando daí a confiança e o respeito do rei de Babilônia.
Estes eventos prepararam Nabucodonosor para encontrar o Deus de Daniel. Uma série de dramáticas experiências — o sonho do capítulo dois, o espantoso livramento, da fornalha ardente mencionado no capítulo três e o sonho referido no capítulo quatro — evidenciaram ao grande rei o conhecimento, o poder e a autoridade do Deus de Daniel.
A inferioridade do conhecimento humano através dos tidos como maiores sábios de Babilônia e do mundo, comprovada na experiência de seu primeiro sonho, levou Nabucodonosor a admitir a Daniel: “Certamente, o vosso Deus é Deus dos deuses, o Senhor dos reis, e o Revelador dos segredos”.1 O rei reconheceu abertamente que a sabedoria de Deus era superior, não somente quanto ao setor humano, mas também quanto à suposta sabedoria dos deuses.
O incidente da imagem de ouro e a fornalha ardente levaram Nabucodonosor a admitir que o Deus do céu “livrou Seus servos”.2 Sua resolução foi que ninguém em todo o reino “pronunciasse alguma blasfêmia contra o Deus dos hebreus, em virtude do fato de que “nenhum outro Deus” podia livrar como Êle.3 Nabucodonosor reconheceu então que o Deus do céu não era unicamente sábio mas poderoso; que Êle não era unicamente Onisciente mas Onipotente.
A terceira experiência — os sete anos durante os quais sua própria jactanciosa sabedoria e seu poder foram temporariamente removido — ensinou ao rei que o Altíssimo não só era sábio e poderoso mas que exercia tal sabedoria e poder para governar também os negócios dos homens na terra.4 É significativo que o primeiro ato de Nabucodonosor depois do retorno de sua ramo foi louvar, exaltar e glorificar “ao Rei dos céus” e reconhecer que “aos que andam na soberba” como êle andava por muitos anos, Deus “pode humilhar”.1 Tudo isto, porém, foi possível e demonstrado através dum homem extraordinário usado por Deus; um homem que permaneceu ao lado do direito porque era direito.
Daí ter sido Daniel amplamente abençoado por Deus para ser a inapreciável bênção que demonstrou ser, ao mundo de seu tempo. Por seu intermédio transmitiu Deus a duas cortes imperiais luz como conduzirem um govêrno próspero e honrado no mundo. Isto foi conseguido na segunda metade do reinado de Nabucodonosor. Houvessem os seus sucessores seguido o plano de govêrno de que tiveram conhecimento pelo exemplo de Daniel como primeiro ministro, a sorte do reino caldeu teria sido bem diversa.
Houvessem os soberanos medo-persas seguido a orientação governativa de Daniel do reinado de Dario o Medo, não teriam sido os bárbaros senhores do mundo que foram e consequentemente não teriam as constantes dificuldades que tiveram em repelir inúmeras rebeliões em todo o vasto reino — e o destino do império Aquemenide teria sido bem outro. Deixassem hoje os governantes das nações instruir-se por Deus, fariam um govêrno brilhante, próspero e coroado de justiça, — em vez do caos em que tornaram a hodierna civilização com tantas ideologias políticas malsãs e ruinosas à por êles opressa e desesperançada família humana.
Em Babilônia Daniel não agia a sós. Sua gloriosa obra foi secundada por três companheiros seus, judeus, de cativeiro. Os quatro formavam um quadrado invulnerável que nem fogo nem leões foram capazes de destruir. Nenhuma força, nenhum poder, nenhuma influência, nenhuma circunstância os afastaram dos princípios da justiça que tinham aprendido no limiar da vida mediante o estudo da Revelação e das obras da criação de Deus.
A intrepidez e a lealdade de fé em Deus por êles manifestas nos maiores perigos, encheram os séculos de assombro e admiração. E, na putrefata cidade de Babilônia, em meio ao falso culto idolatra, no mais vil antro de imoralidade ante o orgulho, a soberba e a luxúria, permaneceram incólumes. Passaram por todos os testes possíveis e permaneceram inexpugnáveis ao lado do direito de Deus.
A enormíssima bênção que foram para a grande metrópole e para todo o reino caldeu não se pode avaliar nesta vida. “Reuniam- se, nas cortes de Babilônia, representantes de todas as terras, homens de talentos os mais seletos, os homens os mais ricamente dotados de dons naturais, e possuidores da mais elevada cultura que este mundo podia proporcionar; todavia entre eles todos, os cativos hebreus eram inigualáveis. Na resistência física e na beleza, no valor mental e nas consecuções literárias, no poder espiritual e na visão, eram sem rival”.1
Os quatro jovens foram preferidos pelos soberanos de seus dias, Daniel alcançou o segundo pôsto em dois reinos mundiais, “e seus três companheiros foram feitos conselheiros, Juízes e governadores no meio da terra”.2 Deveras a bênção que êles foram quer no govêrno dos homens quer na sociedade humana, não poderá ser apreciada pela linguagem da terra.
Deus os usou como embaixadores Seus ao mundo de então porque podia confiar na integridade que caracterizava em sentido geral as suas vidas. Encontraremos, nestes modernos e corrompidos tempos, cristãos da tempera de caráter como a dêles, tão fiéis defensores da justiça que Deus os possa usar com o mesmo êxito com que os usou naquela antigüidade corrupta?