3 A INTERPRETAÇÃO DO SONHO DO REI NABUCODONOSOR - Cap 2 Daniel (Araceli)

Profecias de daniel de Araceli Melo

A INTERPRETAÇÃO DO SONHO DO REI NABUCODONOSOR

UMA EXTRAORDINÁRIA REVELAÇÃO


Em nove curtos versículos que dão conta da interpretarão do sonho do rei Nabucodonosor, a revelação condensou nada menos do que vinte e cinco séculos e meio de história universal, abarcando os grandes impérios do mundo e as nações modernas — desde Babilônia aos nossos dias — e ainda com prosseguimento até ao estabelecimento do reino de Deus na terra. Jamais a humana sabedoria sintetizou tão grande soma de verdade histórica em tão poucas palavras. 


Fora necessário ao historiador inúmeros volumes para descrever os eventos decorridos alusivos aos poderes citados, enquanto Daniel o pôde fazer, guiado pela inspiração de Deus, em apenas 305 palavras — segundo a versão portuguesa Almeida da Bíblia. Vemos em tudo isto o dedo de Deus e a magia da divina sabedoria em assim proceder na apresentação desta profecia inspirada, cujo propósito é impressionar e convencer os homens de Sua absoluta autoridade no mundo.


Atento e maravilhado, pôde o rei Nabucodonosor ouvir a tradução profética dos símbolos mudos da estátua e aceitá-la sem a mínima objeção e recusa. Já que o jovem inspirado profeta se demonstrara capaz de revelar com tão acurada exatidão o esquecido sonho, seria também capaz de interpretá-lo com a mesma indiscutível exatidão. A convicção que se fizera sentir na voz do jovem hebreu, nascida de um conhecimento positivo, agitou o rei. 


Quase o podemos ver inclinado para diante na ansiedade de apanhar as próximas sentenças. Seu contentamento foi revelado no término da exposição em honrar grandemente o embaixador do céu e em reconhecer o Deus de Israel como “Deus dos deuses” ou supremo Deus. 


E, nós, hoje, volvendo o olhar ao passado até Babilônia e constatando o fiel cumprimento de toda a interpretação de Daniel do sonho do rei Nabucodonosor, temos nesta comprovação razões sobejas para reconhecer também a supremacia de Deus e O adorar numa consagração e reverência absolutas. 


Concretizado isto, daremos mais peso à mensagem de Deus e asseguraremos diante das massas errantes e fanatizadas — uma forte evidência da necessidade da civilização lançar mão da verdade inspirada como guia infalível. Urge que o cristianismo dê à presente e agonizante civilização aquilo que ela mais carece, que é um testemunho evidente de Deus e Seu imensurável amor. Mas, só através duma aceitação positiva e integral da mensagem do evangelho poderá ele ser dado pelos cristãos.


BABILÔNIA — O PRIMEIRO IMPÉRIO DA PROFECIA


VERSOS 37-38: — “Tu, ó rei, és rei de reis: pois o Deus do céu te tem dado o reino, o poder, e a força, e a majestade. E onde quer que habitem filhos de homens, animais do campo, e aves do céu, Ele t’os entregou na tua mão, e fez que dominasses sobre todos eles; tu és a cabeça de ouro”.


A ORIGEM DO IMPÉRIO BABILÔNIO


O primitivo território que deu origem ao império babilônio de Nabucodonosor passou por uma longa e mui variada história e esteve sob a liderança de diferentes povos e reinos antes do grande potentado empunhar o cetro mundial. De conformidade com o livro de Gênesis, as cidades de Babilônia, Erech, Accad e Calah, daquele território na terra de Sinear, na Mesopotânia, foram fundadas por Nimrod, um bisneto de Noé através de seu filho Cam.


1 Estas cidades constituíram originalmente naquele primitivo período histórico, depois do dilúvio, vários Estados ou Cidades-Estados, ali na terra de Sinear, no sul da Mesopotâmia. Posteriormente, alguns daqueles Estados agruparam-se em maiores Estados ou reinos. 


Primitivas inscrições referem a esta área ou país de Sinear, como duas sessões distintas — os reinos de Sumer e de Accad — o primeiro ao sul, próximo ao Gôlfo Pérsico, cerca da latitude trinta e dois e o segundo ao norte deste. Ambos os dois reinos ou sessões, foram dotados com maior número de cidades, grandes e pequenas. As mais importantes em Sumer eram: Ur, Erech, Sridu, Nippur, Lagash, Larsa e Isin; e, em Accad: Babilônia, Kish, Outhah, Borsippa e Sippar. Accad é chamada “Sinear”, em alguns textos bíblicos;2 e “terra dos caldeus” em outros.3


De acordo à assim chamada “pequena cronologia”, o primeiro período Aumeriaur foi substituído pela dinastia Accad no vigésimo quarto século a.C., quando os reis semitas venceram aqueles e apossaram-se de todo o país. O grande rei Sargon I, de Accad, criou um império que alcançou desde o Gôlfo Pérsico até o interior da Ásia Menor. Naram-Sin foi outro grande rei de Accad.


Mas, por sua vez, depois de um século de domínio a dinastia Accad chegou ao seu fim, vítima de uma invasão do povo montanhês  Guti. Este povo submeteu e governou então toda a Mesopotânia, embora algumas cidades continuassem a gozar uma espécie de autonomia, tal como a próspera Lagash sob Judea, seu grande rei. 


Porém, depois de mais de um século de domínio, os Gutis foram vencidos pelos Sumerianos que experimentaram uma renascença de poder. Estabeleceram a forte terceira dinastia de Ur, que exerceu domínio na Baixa Mesopotâmia de 2070 a 1960 a.C. No décimo nono século o país foi duas vezes invadido, uma vez pelos elamitas das montanhas orientais e outra vez pelos amoritas do deserto sírio. 


Estes últimos tiveram êxito em fundar a forte primeira dinastia de Babilônia, em 1830 a.C., da qual Hammurabi (1728-1686 a.C.) foi o sexto e mais famoso rei. Hammurabi liquidou o último rei de Larsa e reinou praticamente sobre todo o vale da Mesopotâmia e expandiu-se à Síria e ao império de Accad de Sargon I. Durante este período a cidade de Babilônia tornou-se a capital do império. 


Mas, posteriormente, em 1550 a.C., a Mesopotâmia foi mais uma vez invadida, — agora pelos Hititas sob seu rei Mursilis I, e a dinastia de Hammurabi desapareceu. Estes invasores saquearam Babilônia, capturaram seu rei e carregaram a estátua de ouro de seu principal deus — Marduque. Babilônia tornou-se então menos importante do que os poderosos impérios Hitita e Egípcio. Durante este mesmo tempo os Kassites do nordeste assolaram o país e reinaram na Baixa Mesopotâmia durante vários séculos.


No décimo-terceiro século, ao norte da Mesopotâmia, ergueu-se outro poder mundial, o Império Assírio, o qual uniu outra vez a Mesopotâmia e a Ásia Ocidental ao Mediterrâneo. Por seis séculos Babilônia foi mais ou menos um Estado dependente da Assíria. 


Nestes séculos Babilônia frequentemente rebelou-se contra o jugo estrangeiro, tendo sido sufocadas essas rebeliões. Tiglath-Pileser III (745-727 a.C.), que introduziu diversas novações políticas e militares, fez-se rei de Babilônia sob o nome de Pul, tentando assim evitar novas rebeliões desta cidade. Sargon II também fez-se coroar rei de Babilônia com as mesmas intenções. 


Todavia os assírios tiveram de conquistar e ocupar Babilônia repetidas vezes durante os séculos em que mantiveram a posse da Mesopotâmia, mas usualmente trataram o país com respeito, não tendo sido jamais completamente incorporado ao Império Assírio, senão que gozou sempre de um “status” diferente dos de outras nações submetidas. 


Senaqueribe, porém, fatigado das constantes rebeliões dos babilônios, destruiu Babilônia em 689, a.C., sendo por seus contemporâneos e por muitos assírios considerado o seu ato um sacrilégio e blasfemo crime, tendo seu filho Assaradon reedificado a cidade tão logo que subiu ao trono, após o que a grande cidade experimentou o seu mais áureo e florescente período.


Em 626 a.C., Nabopolasar, um oficial caldeu sujeito aos assírios, declarou-se rei de Babilônia. Depois de ter batalhado contra os  assírios por vários anos com irregular sucesso, aliou-se ele aos medos, pelo casamento de seu filho Nabucodonosor com uma princesa da corte de Ciaxares, e, com o auxílio destes depois de um cêrco de três meses, conquistou Nínive em 612 a.C. 


Quando os conquistadores dividiram o Império Assírio, ao rei de Babilônia tocou toda a Mesopotâmia, Síria e Palestina. Mas foi necessário a Nabopolasar batalhar por alguns anos ainda contra os remanescentes assírios na Mesopotâmia Superior, bem como contra os egípcios que auxiliavam os assírios esperando com isso tornarem-se senhores da Síria e Palestina. 


Em 606, o príncipe Nabucodonosor, seu filho e general, avançou até à Judeia, levando de vencida o exército egípcio que defendia suas pretensões na Ásia até ao rio Eufrates. Durante esta campanha e neste ano, soubera ele da morte súbita de seu pai Nabopolasar, em Babilônia, para onde regressou imediatamente a fim de cingir a coroa como único legítimo herdeiro do trono.


NABUCODONOSOR — REI DO MUNDO


Senhor absoluto do trono herdado, começa Nabucodonosor a dar evidente expressão ao Império Neo-babilônio, do qual fora ele o seu verdadeiro fundador, já que a morte arrebatou a seu pai antes de ter podido consolidá-lo e expandi-lo.


A partir do ano 605 a.C., o primeiro de seu reinado oficial, começou Nabucodonosor a estender suas conquistas aos quatro ventos. Neste ano, sua primeira e imediata campanha após sua coroação, foi mais uma vez contra o exército egípcio de Faraó Neco que tentava pela segunda vez a recuperação dos territórios perdidos aos babilônios, tendo avançado novamente até ao Eufrates. Mas foram os egípcios mais uma vez vencidos, agora em Carchemis.1


Nos livros das Sagradas Escrituras, os de Jeremias e Ezequiel, principalmente, deparam-se-nos as conquistas de Nabucodonosor no Sul do Ocidente da Ásia, submetendo a todos os países daquela vasta região. Síria, Tiro, Sidom, Galiléia, Samária, Judeia, Filistéia, Adom, Moab, Amem, Arábia, Egito, Etiópia, e outros países — todos foram reduzidos a satrapias de Babilônia, por conquista armada. As suas mais memoráveis campanhas de que temos conhecimento foram as de Tiro, Judeia e Egito,2 tendo a capital do primeiro poder resistido um cêrco de treze anos.


No Oriente, Ocidente, Norte e Sul, o reino de Nabucodonosor estendeu-se a todas as nações constituídas. Levando em conta a interpretação de seu primeiro sonho, dominou ele onde quer que no seu tempo haviam filhos de homens, animais ao campo, e aves do céu”.3 O segundo sonho inspirado do monarca é claro em atestar que o seu reino ou domínio se estendeu “até à extremidade da terra”.4


Baseados nestas palavras da inspiração constatamos que não houve potentado cujo império fosse maior do que o de Nabucodonosor e dentro de cujas fronteiras houve unidade e cuidado especial do grande soberano pelo bem geral de seus numerosos súditos vassalos.


Pouco a pouco o mundo caiu prostrado aos pés do grande potentado caldeu, vencido como resultado do juízo divino a uma civilização desequilibrada e irreverente para com Deus. Verdadeiramente ele foi o açoite do céu sobre as nações de seu tempo, para despertá-las da indiferença e rebeldia e levá-las a reconhecer ao Todo-poderoso como absoluto supremo soberano da terra. Durante todo o seu reinado de quarenta e três anos,— época em que o Império Babilônio alcançou o seu apogeu e a sua idade de ouro — seus súditos foram fiéis a seu comando, pois vimos que Deus deu em suas mãos “todo o domínio” debaixo do céu.


James Moffatt, em sua versão da Bíblia, traduz o versículo trinta  e sete nestes termos: “Tu, ó rei, és rei de reis, a quem o Deus do céu deu todo o domínio, poder, força e glória”. A expressão: “Todo o domínio” — evidencia em verdade o seu absoluto poder no mundo internacional de seus dias como “rei dos reis” — titulo este que lhe dá a própria inspiração.1 Nabucodonosor, porém, em suas inscrições, atribuiu os sucessos de seu reinado mundial ao seu deus Marduk.


Daniel, todavia, com um raro e inspirado tato, corrige esta  errônea pretensão, e assevera-lhe solenemente ter ele recebido seu reinado das mãos do “Deus do céu”, o Deus de Israel, assim como seu grande poder, sua força e sua glória como supremo potentado político do mundo. 


Dissera-lhe o profeta que sua realeza fora reconhecida do céu como áurea, no símbolo do mais precioso metal — o ouro. Sim, todo este reconhecimento do céu evidencia que fora o Rei do universo quem o empossara no trono da terra e lhe dera poder sobre todas as nações. Através do profeta Jeremias, Deus mesmo chama Nabucodonosor “meu servo”, e declara ter entregue “todo o domínio” das nações à sua soberania.2


A realeza de Nabucodonosor fora um verdadeiro fenômeno político. Mal completara ele dois anos de mandato sobre a terra, já alcançara majestade, força e glória políticas jamais alcançadas por outro soberano mundial antes ou depois dele. A história não menciona outro rei que o igualasse no comando das nacionalidades. Ciro, Alexandre e César, também mencionados nas profecias — ficaram bem longe dele e tiveram um reinado efêmero bastante acidentado, enquanto Nabucodonosor reinou quase meio século, cujo governo foi marcado por abundantes e evidentes bênçãos do céu. 


Tudo isto foi devido tê-lo Deus usado bem como sua espada para pôr em ordem as nações e justiçar os altivos reis pela arrogância, desacato e irreverência por eles manifestados para com a Majestade do universo, e pela atrevida recusa do cumprimento do dever conhecido para com Deus que lhes dera poder para em seu nome governarem a família humana em justiça, no setor que lhes coube no plano do Onipotente. 


Especialmente devia Nabucodonosor sujeitar as nações enquanto o povo de Deus era transportado ao cativeiro e nele permanecesse — para que tudo corresse segundo o propósito pré-determinado por Ele, e no tempo assinalado pelo vaticínio dos profetas pudessem os cativos serem libertados e retornarem à Judeia para reconstruírem o seu lar nacional.


Contudo, o rei Nabucodonosor custou a reconhecer sua inteira dependência do “Deus do céu” ou Deus de Israel como sustentáculo do seu poder governamental. Julgara que, na conquista da Judeia, o Deus dos judeus fora vencido por seu deus Marduk. Como, pois, reconhecer a Sua supremacia e poder se Marduk O vencera? Foi necessário o “Deus do céu” empregar até mesmo o rigor descrito no quarto capítulo, para que por fim o rei de Babilônia O reconhecesse e O reverenciasse, não só como único Deus, mas também como único Dominador que põe nos seus tronos os monarcas da terra e os depõe quando deixam de preencher os requisitos de Sua Augusta vontade universal.


Os  soberanos  persas  eram  limitados  pelo  poder  dos  grandes nobres. No capítulo seis do livro de Daniel vemos o poder de Dario, o Medo, restringido pelas leis e frustrado pela nobreza — o poder era aristocrático. Uma cena similar sucedeu na Inglaterra quando o rei João Sem Terra foi forçado pelos barões a assinar com eles e a favor deles um pacto a que se deu o nome bem conhecido de Magna carta, em 1215 a.C. 


Na Grécia antiga a autoridade era militar, Alexandre Magno foi colocado no trono da nação por ser um grande soldado. O poder de Roma emanava do Senado. Todavia, o poder do rei Nabucodonosor, antes de sua conversão ao Deus de Israel, era autocrático, e a ele estava afeto mesmo a faculdade de tirar ou dar a vida a qualquer de seus súditos, em circunstâncias que assim julgasse necessário.1 Porém, a maravilha de sua entrega a Deus, resolveu este grave problema de sua vida como soberano do mundo, e trouxe felicidade a seus súditos.


Os acontecimentos do reinado de Nabucodonosor demonstraram ter sido ele um chefe de Estado vigoroso e brilhante. Tanto física como mentalmente era um homem forte e mui digno de ter galgado o trono do mundo em sucessão a seu pai. Chegara a ser o maior homem da história como soldado, estadista e arquiteto. Houvessem seus sucessores sido de sua têmpera em vez de noviços, inexperientes, sem afeição, sem capacidade administrativa, os persas teriam encontrado em Babilônia um mui sério problema a resolver, em vez da facilidade que tiveram na conquista da grande cidade.


Depois de consolidar o seu poder mundial, o grande rei Nabucodonosor empregou longo tempo de paz em realizar numerosas obras de vulto, principalmente em sua capital, que, embelezando-a, tornou-a a mais bela, mais fascinante e mais poderosa cidade fortaleza da terra no mundo antigo. Sobre isto consulte-se o capítulo quatro desta dissertação do livro de Daniel. 


Seu orgulho manifesto em face  de suas realizações não teve limites. Ele procurou fazer de sua realeza um memorável testemunho de seu poder através de todo o futuro e de sua soberba metrópole uma inexcedível glória perdurável de geração em geração. Embora a cidade não mais exista, sua fama perdura nas páginas da história de seus dias como a cidade de ouro e inigualável capital da terra. 


Fascinado pelas obras grandiosas pelas quais ele tornou Babilônia a mais famosa capital de todos os tempos, chegou a exclamar em sua altivez: “Não é esta a grande Babilônia que eu edifiquei para a casa real, com a força do meu poder, e para glória de minha magnificência?”1 Esta declaração de soberba de sua parte custou-lhe caro, conforme vemos no quarto capítulo, mas foi uma expressão de seu contentamento, embora jactancioso e ofensivo ao céu.


A famosa realeza mundial de Nabucodonosor e sua formosa metrópole da terra desapareceram para sempre. Profecias evidentes lavraram a ruína completa do grande Império, e isto porque Nabucodonosor não teve sucessores dignos e sim ímpios herdeiros do trono que lançaram indevidamente mão de seu cetro e não reverenciaram a Deus como por fim ele o fez e o exaltou sobre tudo e todos.


“TÚ ÉS A CABEÇA DE OURO”


Cremos, sem sombra de dúvida, que a cabeça de ouro é simbólica do Império mundial dos caldeus ou de Babilônia. Como, porém, diz Daniel simbolizar o rei Nabucodonosor? Em primeiro lugar porque ele enfeixava em suas mãos todo o poder do trono. Em segundo lugar, aludindo ao seu sonho duma árvore que enchia toda a terra, diz-lhe o profeta: “A árvore és tu, ó rei”.


1 O grande rei era a personificação de seu Império que ele mesmo fundou e em cujas mãos cresceu e tornou- se poderoso no orbe inteiro, sendo considerado o mais rico de todos os reinos terrestres. O Império era ele e ele era o Império. Como supremo e absoluto, sua corte não era mais que mera fantasia; seus cortesões nada pesavam nas decisões que ele tomava. Ele era o “tudo”, a majestade suprema dum cetro que cobria vitorioso inteiramente o orbe conhecido e habitado. 


Além disso, desempenhou Nabucodonosor uma administração que conservou as nações todas em harmonia, bem como sob completa segurança e proteção. E, mais ainda, jamais a história registrou um soberano político no trono do mundo maior do que ele. Ele a todos sobrepujou em glória, grandeza e majestade. Assim achou por bem Deus — que lhe dera todo o poder e a glória de que era senhor — honrá-lo no símbolo da cabeça de “ouro fino” da estátua de seu impressionante sonho inspirado, ainda que ela representasse com toda a evidência o Império Caldeu Neo-babilônio. 


E é surpreendente notar que a interpretação de Daniel ignorou por completo não somente os reis que precederam Nabucodonosor no trono de Babilônia como também os que o sucederam. Sim, só ele foi levado em alta conta pelo céu naquele trono do mundo. Todos os demais que ali se assentaram, praticamente nada representavam aos olhos d’Aquele que é a suprema autoridade na terra e no céu. Em toda a terra e em toda a História não houve outro potentado que governasse o mundo tão a contento de Deus.


É notável que nem Ciro, nem Alexandre e nem os maiores Césares são mencionados na interpretação de Daniel como figurados respetivamente pela prata, o cobre e o ferro da estátua, alusivos à Medo-Persa, Grécia e Roma. 


Já os símbolos inferiores ao ouro interiorizaram os Impérios que eles fundaram, e, além disso, logo sucumbiram na morte. O pouco tempo que estiveram no trono, permaneceram bastante aquém de Nabucodonosor em glória, poder e respeito enquanto senhores do poder. 


O profeta foi claro em sua interpretação: “E depois de ti”, disse, “se levantará outro reino... e um terceiro reino... e o quarto reino”. Não dissera Daniel: “E depois de ti se levantará Ciro da Pérsia, Alexandre da Macedônia e César de Roma. Não, eles todos seriam inferiores ao grande rei de Babilônia — quer em caráter quer em administração. E, além de tudo, não se converteriam a Deus como o fez ele de todo o coração, reconhecendo- O, adorando-O e testemunhando a Sua supremacia e poder perante todo o orbe sob seu áureo cetro.


“E DEPOIS DE TI ...”


Indo de encontro às aspirações do rei Nabucodonosor, de que seu domínio mundial continuaria nas mãos de seus compatriotas por séculos infindáveis, Daniel o notificou de que seu Império seria liquidado depois dele deixar o trono pela morte. 


Posto que quatro fracos sucessores legais seus empunhassem o cetro herdado ainda por vinte e três anos, não foram levados em conta pela profecia, dada a incompetência deles para o governo e bem assim para a manutenção da unidade, da estabilidade e da inviolabilidade do reino. 


Em comprovação da indignidade dos quatro para manterem o Império, ele rapidamente se desmoronou. Praticamente o Império de Nabucodonosor deixou de existir depois dele, pois seus pretensos sucessores o precipitaram no abismo duma política incapaz de conservá-lo forte como o receberam do poderoso rei.


Desafortunadamente, a grandiosa soberania de Nabucodonosor caiu imediatamente nas mãos de seu indigno filho e sucessor Amelmarduk (O Evil-Merodach da Bíblia — Jeremias 52:31), que, de acordo ao historiador babilônio Berossus, era arbitrário e licencioso. Outros de seus biógrafos o acusam de desenfreado, de deslealdade, de torpezas, de leviandade de intemperança. 


Além do mais seguiu uma política desfavorável à antiga nobreza militar, o que maior descontentamento causou. O partido sacerdotal cansou-se logo dele e de sua corte, e uma conspiração o assassinou depois dum desprezível reinado de apenas dois anos (562-560). 


Nergal-Shar-usur, um poderoso príncipe do exército de Nabucodonosor1 e seu cunhado, foi o cabeça da conspiração que deu-lhe a morte, bem como o seu sucessor por quatro anos (560-556), nada fazendo de importância no governo. Seu filho Labashi-Marduk, um rapazola inexperiente, o sucedeu, sendo porém assassinado por uma conjuração após um efêmero reinado de menos de dois meses. Os conjurados empossaram no trono um de seu bando — Nabonidus, genro de Nabucodonosor, que aliou ao trono, como coregente, a seu filho Belshazzar, um jovem licencioso, libertino, irreverente e ébrio.


Temendo, porém, Nabonidus o crescente perigo persa, aliou-se com o Egito, Lídia e Sparta. Entretanto, em 539 cai nas mãos de Ciro Babilônia, o último reduto remanescente do que fora o áureo e poderoso Império de Nabucodonosor. Este grande rei, o maior da história política, como vimos, preencheu plenamente o propósito de Deus em promover o engrandecimento de Seu nome entre as nações e em proteger Seu povo cativo no Oriente. 


Seus fracos e incompetentes sucessores, porém, foram desqualificados para tão altas responsabilidades, embora herdassem a coroa até à derrocada final sob os Medas e Persas coligados. Portanto, Nabucodonosor, o único monarca babilônio reconhecido pela profecia, em verdade não teve sucessores na altura de empunharem o seu glorioso cetro invencível e poderoso, pois os que pretenderam sucedê-lo e para isso lutaram e se aniquilaram, foram deveras indignos de se assentarem em seu trono. Deste modo, o “e depois de ti”, referido por Daniel, equivale a que outro reino, não caldeu, tomaria o lugar do seu por conquista armada e destruição.


Ainda que um outro reino sucedesse o seu depois dele, nenhum monarca o igualaria em poder mundial soberano e inconquistável. Indiscutivelmente, nem os Faraós, nem os Aquemenides, nem os Seleucidas, nem os Tolomeus, nem os Césares, nem mesmo o poderoso Alexandre e nem nenhum outro da idade antiga ou moderna chegou a seus pés como majestade real. Basta dizermos que Nabucodonosor fora tomado nas mãos de Deus para empunhar o seu cetro, para dizermos tudo de inigualável supremacia em face de todos os potentados que nesta terra viveram e governaram.


MEDO-PERSA — O SEGUNDO IMPÉRIO DA PROFECIA

VERSO 39: — “E depois de ti se levantará outro reino inferior ao teu ...”

“... Se levantará outro reino ...”


Aqui está a ênfase do profeta: “... se levantará outro reino...” Sim, outro — não o mesmo reino de Babilônia sob nova plataforma ou novo regime caldeu de governo. Um “outro reino” implicava em um novo reino sob uma nova liderança internacional e não mais sob o poder dos babilônios. Um “outro reino” que “se levantará” e que, portanto, ainda não se havia levantado.


O capítulo sete, que trata dos mesmos reinos do capítulo dois, esclarece que depois do Leão, figurativo do Império de Babilônia, se levantaria um Urso que, pelo símbolo tão diferente, não poderia ser mais Babilônia. O versículo vinte e três é muito enfático ao dizer: “O quarto animal será o quarto reino da terra”. Logo o segundo animal seria evidentemente, o segundo reino da terra — não o mesmo reino deixado por Nabucodonosor, sob um novo aspecto político. 


O ouro da estátua profética não pode ser tomado pela prata que o segue, como do mesmo modo a cabeça de ouro não pode ser tomada pelo peito e braços de prata. A cabeça é que era Babilônia, evidencia o profeta, e não o peito e os braços. Como um urso não pode ser tomado por um leão, o reino babilônio — o primeiro reino — na figura de leão, não pode ser tomado pelo segundo reino na figura de um urso. 


Portanto, uma nova ordem, um novo cetro se levantaria no campo internacional, para derribar o reino caldeu que seria deixado por Nabucodonosor em mãos incapazes de sustê-lo, e imporia às nações uma nova política. Não temos quaisquer dúvidas em afirmar que os medas e persas, unidos, conquistaram o Império Caldeu e se impuseram no orbe como o segundo Império do mundo da série de quatro como apontados pela profecia inspirada.


“... OUTRO REINO INFERIOR AO TEU”


“E depois de ti se levantará outro reino inferior ao teu”. O emprego da palavra “reino” é a afirmativa de que os diferentes metais que compunham a estátua representavam reinos e não particularmente “reis”. A declaração do profeta a Nabucodonosor: “Tu és a cabeça de ouro”, designa, ainda que empregassem o pronome pessoal, o reino de Babilônia e não propriamente Nabucodonosor.


Ao ouvir Nabucodonosor que seu reino seria conquistado por um outro reino, reino inferior ao seu, lá no seu íntimo opôs-se a esta interpretação de Daniel embora nada lhe tenha referido. 


Era-lhe deveras difícil compreender como o seu poderoso e bem organizado reino viesse a cair em mãos de aventureiros conquistadores bastante inábeis comparados com ele que demonstrou sábias e talentosas capacidades como soberano administrador. A história do capitulo três enfatiza a sua recusa em aceitar esta para ele inconcebível e inaceitável exposição do jovem profeta. 


E, até que por fim entregou o seu coração a Deus, em virtude do ocorrido e registrado no capitulo quatro, não havia entendido e aceito uma tão inexorável e amarga realidade futura, aliás, bastante vexatória e mesmo ousada em face de sua áurea realeza. 


Porém, depois de sua conversão, como por ele próprio demonstrada e mundialmente anunciada, tudo lhe ficou esclarecido, — aceitou então o propósito de Deus para com seu reino  e sua pessoa, e seguiu adiante com fé até à morte, morte que o levou ao túmulo na doce esperança de ainda sobreviver um dia — para ser um dos eternos súditos dum reino diante qual a sua famosa realeza era de nenhum valor e dum Rei diante do qual a sua alteza era totalmente apagada.


Segundo o vaticínio interpretativo de Daniel, o Império Medo- Persa que no curso da história conquistou e substituiu o de Babilônia, foi em verdade e em muitos sentidos inferior ao do grande rei Nabucodonosor:


1. Já a inferioridade do símbolo da prata Medo-Persa comparado ao do ouro simbólico de Babilônia, indicou a inferioridade de sua realeza em esplendor, luxo e magnificência comparada à de Nabucodonosor.


2. De nenhum de seus treze monarcas — medos ou persas — alguns fortes outros fracos, referiu-se Daniel em sua interpretação ou fora dela, o que referira de Nabucodonosor nestes termos: “Tu és a cabeça de ouro”.


3. Ainda que com o grande Xerxes a Medo-Persa alcançasse a sua maior extensão territorial — 127 províncias desde a Índia à Etiópia — contudo seu domínio em território foi ainda inferior ao de Babilônia sob Nabucodonosor, segundo as claras e inspiradas palavras de Daniel no versículo trinta e oito.


4. Os medas e persas jamais conseguiram unidade e estabilidade indispensáveis a um Império. Do princípio ao fim, durante os dois séculos de seu poderio mundial, o reino foi um vulcão de revoltas nunca sufocadas em definitivo a despeito de reprimidas com furor. Eis um dos pontos fatais de sua inferioridade ao império de Nabucodonosor, que era perfeitamente unido e sem problemas internacionais.


5. A corte Medo-Persa, ao contrário da de Nabucodonosor, era constituída de perversos, perigosos e criminosos cortesões, como comprovado na história do sexto capítulo do livro de Daniel.

 

6. O reino Medo-Persa, ou propriamente a sua corte, era aristocrática, pelo que seus reis reinavam mas não eram absolutos como o era Nabucodonosor como soberano.


7. No reino Medo-Persa não houve aquele bem-estar geral em relação aos seus súditos, como Nabucodonosor proporcionou aos seus súditos embora como um autocrata que fora como governador mundial.


8. Nos dias do império Medo-Persa, o povo de Deus esteve em perigo, pelo que foi necessário o anjo Gabriel montar guarda na sua corte, vigiando seus monarcas durante dois séculos, como ele próprio se refere.1 No domínio de Nabucodonosor nada disso foi necessário, visto que o povo de Deus esteve bem guardado e protegido por este rei, mormente depois de sua conversão.


9. O reino Medo-Persa foi inferior ao de Babilônia porque Ciro, seu fundador, morre prematuramente, como soberano, quando o reino dele mais carecia para a sua consolidação. Depois de Ciro, a não ser Dario Histaspes, os demais monarcas foram incapazes de governar. Mesmo Xerxes, posto que chamado — o grande, não preencheu as qualidades requeridas por um soberano que se assenta no trono do mundo.


10. A maior evidência da inferioridade do império Medo-Persa sobre o de Babilônia, jaz no fato de que nenhum de seus monarcas se converteu a Deus, como o fez Nabucodonosor que promoveu o engrandecimento e a honra do nome de Deus em todo o seu reino após a sua miraculosa conversão.


A ORIGEM DO IMPÉRIO MEDO-PERSA


Este segundo Império da profecia inspirada é também chamado Império Medo-Persa, porque começou com a junção da Média e da Pérsia num só poder. Incluía o velho Império Medo e as novas aquisições de Ciro, o conquistador Persa.


A origem dos medos e persas — raça indo-européia — não é clara, mas crê-se que em torno do ano 2000 a.C. um número de tribus arianas, das quais os medos eram os líderes, começou a emergir da região que agora é o sul da Rússia, no sul do Mar Cáspio onde eles primeiro apareceram no cenário da História.


Quando as primeiras tribus arianas apareceram com o nome de Medos, eram audazes combatentes. Habitavam uma região que os produziu como forte e robusto povo guerreiro muito acostumado a sofrimentos e privações sem conta. A Média compreendia, propriamente, o país ao oriente das montanhas zagros e o sul do Mar Cáspio. 


O povo medo é apresentado como um rígido povo montanhês, descendente de Noé por seu neto “Medai”, filho de Jafet.1 A primeira referência histórica real aos medos data do tempo de Salmanazar III (859-824) e desde aquele tempo eles apareceram regularmente nas inscrições assírias e são representados como tribus bárbaras contra as quais os reis assírios batalharam repetidamente, mas foram capazes de submeter somente as tribus do Oeste. 


Sargon II, Senaqueribe e Esarhaddon da Assíria guerrearam sucessivamente contra os medos ou deles receberam tributos. Tabletes cuneiformes recentemente descobertos em Nimrod, a bíblica Calah, recordam tratados entre Esarhaddon e os príncipes medos. Depois da queda de Samária em 722 a.C., alguns dos capturados israelitas foram transportados para as cidades dos medos.2 Chamavam-se os medos a si mesmos Arianu, os “nobres”, e, sua terra “Ariana” ou Iran, palavra que ainda dá nome àquele antigo território.


Entre estes arianos estavam os persas, que se estabeleceram também nas montanhas zagros, com um território compreendendo no Nordeste as costas do Gôlfo Pérsico, limitando no Leste com Carmânia, no Norte com a Média, e no Oeste com a Susiana (Elam). 


Apareceram nos anais da História no sétimo século, e foi provavelmente lá por 675 que seus governadores se estabeleceram como reis na cidade de Anshan, — mais tarde conhecida com o nome de cidade de Ciro e de Passargadas — onde reinaram em comparativa obscuridade. Entrementes as tribus medas, com Deioces (700-647), diz Herôdoto, tornaram-se uma nação e fundaram Ecbatana por capital do reino. 


Phraortes, seu filho e sucessor (647-625), subjugou as tribus persas, e, desde aquele tempo até Ciro, o Grande, a Pérsia formou parte do Reino Medo, ainda que os reis persas continuassem a ostentar o título de “rei de Anshan”. Todavia Phraortes morreu lutando contra  a Assíria. Cyazares, seu filho e sucessor, governou a Média quarenta anos (625-588) e continuou subjugando inteiramente a Pérsia. Cyaxares tornou-se aliado de Nabopolasar, rei de Babilônia, contra a Assíria (612), aliança selada com o casamento do filho deste último, Nabucodonosor, com Amuhea, filha do primeiro.


Os dois monarcas coligados capturaram Nínive e derribaram totalmente o poder assírio. Na divisão do Império Assírio recebeu Cyaxares, como recompensa, as possessões do norte e nordeste, enquanto os babilônios ficaram com os territórios restantes. Tornou-se assim Cyaxares o primeiro grande rei dos medos. Segundo Herôdoto, batalhou contra os citas e os venceu na Ásia Menor, cujas possessões caíram em suas mãos. 


Durante seus últimos anos fez guerra aos lídios que, sob Alyattes, rei de Sardis, tinham se tornado o terceiro poder da Ásia. Um tratado de paz entre estes dois reis, deu a Cyaxares todo o território de Anatolian a leste do rio Halys, e foi fortalecido pelo casamento de Astiages, seu filho, com a princesa Aryanis, filha de Alyattes.


Astiages, sucessor de Cyaxares, reinou mais de trinta anos (585-553) e foi o último monarca real do Império Medo. Coisas bastante duras são conhecidas de seu longo reinado. Por razões que não são muito claras, seu neto, que em 553 ou 550 se tornara rei da Pérsia como vassalo de Astiages, ergueu-se em armas contra ele, e, embora vencido em duas batalhas pelo avô, na primeira das quais morreu seu pai, conseguiu triunfar no terceiro encontro, graças à tradição do Harpagus, comandante medo. Por fim, o próprio Astiages caiu nas mãos de Ciro e com ele todo o Reino Medo. (550). Assim os outróra subordinados persas tornaram-se o poder dominante no que havia sido o Império Medo.


Todavia, a conquista dos medos pelos persas não foi mais do que uma transição de poder de uma casa real à outra e da administração pública dos nobres medos à aristrocracia persa, embora a influência daqueles se fizesse sentir do princípio ao fim do período persa em muitos importantes encargos públicos. 


O que na verdade houve com a conquista da Média pela Pérsia sob Ciro, foi o enlace das duas casas reais ou a união dos dois Impérios num só com este novo nome — Império Medo-Persa. Em torno deste novo nome dos Impérios unidos, o velho prestígio medo foi refletido sobre os conquistadores de Babilônia desde os dias de Daniel até aos dias da rainha Ester ao tempo de Xerxes.1


Conquanto os persas assumissem a liderança do novo Império, foram os medos tratados com simpatia e respeito. Ciro deu o Astiages, seu avô, o governo da província de Hyrcania, ao sul do Mar Cáspio, e a seu tio Cyaxeres II, de acordo com Xenofonte, o trono da Média como um rei sombra, enquanto ele era, atrás de tudo isto, o verdadeiro soberano.


Mas Ciro rodeou-se da corte dos reis medos; trocou até traje dos persas — a vestidura de peles de carneiros e as calças de couro pela veste comprida, folgada dos medos.


O advento de Ciro na conquista e liderança duma nova ordem política no mundo, foi visto pelos judeus cativos no Oriente com grande júbilo. Eles sabiam que a profecia de Isaías o indicava como aquele que lhes daria a liberdade e autorizaria a sua volta à Judeia e a reconstrução do templo em Jerusalém. 


O capítulo dez desta dissertação de Daniel deve ser estudado e meditado, pois trata especialmente dum tremendo impasse na corte de Ciro resultante da oposição dos inimigos do povo de Deus que a todo o custo procuravam paralizar a obra de reconstrução na Judeia. Ciro esteve a ponto de revogar o seu decreto de libertação e de reconstrução em Jerusalém. Não fora a intervenção poderosa do céu, como apresentada na profecia do capítulo dez, teria ele cedido em favor dos inimigos de Deus e de Seu povo. Todavia a vitória foi concretizada pela intervenção de Gabriel e do próprio Filho de Deus na corte de Ciro.


A história das conquistas da Medo-Persa no campo internacional pode ser apreciada no capítulo sete versículo cinco.


GRÉCIA — O TERCEIRO IMPÉRIO DA PROFECIA


VERSO 39: — “... e um terceiro reino de metal, o qual terá domínio sobre toda a terra”.


ORIGEM DO IMPÉRIO GREGO


Os antigos gregos criam-se descendentes de Hellen, de quem vem o nome “Hellenes”, que eles aplicavam a si próprios nos tempos antigos, e o nome “Hellás” para a Grécia, que dá nome ao país até hoje. Porém, à verdadeira origem deste povo em “Javan”, um dos filhos de Jafet, nascido depois do dilúvio e mencionado na genealogia imediatamente depois de “Medai”, o progenitor dos medas.


Cerca do tempo quando os israelitas se estabeleceram em Canaã, tribús Indo-Européias posteriormente chamadas gregas emigraram em sucessivas vagas à região Aegeu (Grécia Continental, ilhas e costas ocidentais da Ásia Menor), conquistando ou lançando fora os primitivos habitantes. 


Primitivamente compunha-se de quatro principais grupos, que falavam diferentes dialetos de uma linguagem comum e tinham os mesmos aspectos étnicos. Eram os Achaios, Aeólios, Jônios e Dórios. Os Achais representavam a maior parte no período primitivo, e Homero às vezes alude a todos os gregos como Achaios. 


Os Jônios e os Dórios eram os mais importantes grupos étnicos dos tempos posteriores, sendo os imperadores, respetivamente, de Atenas e Sparta, as duas mais importantes cidades da Grécia Continental. Os Jônios também fundaram muitas das importantes cidades litorâneas do Oeste da Ásia Menor. O Velho Testamento chama a Grécia e os gregos pelo termo hebreu Yawan, “Jônia”, provavelmente por terem sido os jônios as mais importantes e as mais representativas de todas as tribus gregas.1


Devido à falta de primitivos documentos escritos a história grega começa somente cerca de oitavo século a.C.. Os períodos mais primitivos estão encobertos em mistérios. Algumas lendas e epopéias tratam com a primitiva idade heróica, à qual podem agora ser acrescentados os resultados das escavações em sítios pre-históricos como Mycenae e Tróia, os quais lançam luz sobre algumas das epopéias.


No tempo quando a Grécia passou para a luz da História a achamos dividida em muitas pequenas Cidades-Estados, cada qual fomentando seus próprios interêsses, embora estivessem todas unidas por uma cultura e idioma comuns. Ocasionalmente guerras tomavam lugar entre os Estados, mas os jogos olímpicos que continuavam cada quatro anos, serviam como um élo de unificação.


Quando pensamos na antiga Grécia, pensamos principalmente na “idade de ouro” da civilização grega sob a liderança de Atenas, no quinto século a.C.. Esta florescência da cultura seguiu o período do maior esforço unido das divididas Cidades-Estados — a bem sucedida defesa da Grécia contra as guerras pérsicas, quando o fundamento da literatura, arquitetura, arte e filosofia gregas estava sendo colocado. Foi esta cultura que tornou-se a progenitora de toda a cultura oriental e foi seu modêlo por séculos.


O primeiro proeminente papel da Grécia antiga na história do mundo resultou nas guerras greco-pérsicas. Estas começaram com Dario I Histaspes que incorporou ao Império Persa as cidades gregas jônias da Ásia Menor que tinham pertencido ao reino da Lídia. Mas quando os persas penetraram a pátria dos gregos, aquele  pequeno povo revelou as suas mais finas qualidades. 


Os até então invencíveis persas, que haviam subjugado as fôrças de Impérios e reinos poderosos tais como os da Média, Lídia, Babilônia e Egito, assombraram-se ao chocarem-se com uma após outra encarniçada e vitoriosa defesa dos pequenos exércitos gregos.


Com o resultado das guerras greco-pérsicas, as Cidades-Estados gregas unem-se por algum tempo sob a liderança de uma cidade — Atenas. Contudo, tão logo passou o perigo outra vez se separaram. De 479 a 431 a.C., Atenas foi o centro dos Estados gregos e conheceu sua idade de ouro, particularmente sob Péricles. Então veio a guerra do Peloponese (431-404), que começou com a disputa entre Atenas e  suas colônias, mas eventualmente envolveu todos os Estados gregos e suas frotas, e findou com a queda de Atenas e a temporária  supremacia de Sparta (404-371 a.C.). 


A supremacia de Sparta foi substituída por uma passageira supremacia de Thebas (371-362 a.C.). Porém, uns poucos anos mais tarde todas as cidades gregas caíram sob o poder de Felipe da Macedônia, uma aparentada nação do norte da Grécia, propriamente dito, e foram pela primeira vez incorporadas a um forte e unido Estado e, logo depois, pela morte de Felipe, assassinado em 336 a.C., tornaram-se parte do Império Grego- Macedônio de seu filho Alexandre, o Grande. 


O congresso da confederação foi convocado em Corinto para eleger Alexandre em lugar de seu pai. Os lacedemônios deixaram de apoiá-lo, alegando que, por um antigo costume de seus antepassados, os lacedemônios não devem obedecer as ordens de um general estrangeiro, mas eles mesmos ter o comando de algum exército formado para uma expedição estrangeira. 


Os atenienses ficaram também um tanto descontentes com tal inovação; mas apavoraram-se de tal modo com a aproximação de Alexandre, que lhe decretaram mais honras do que antes a seu pai. Ele foi escolhido supremo general dos gregos para a invasão da Ásia; e foi como comandante de Hellas, descendente de Aquiles, antes do que como um rei macedônio, que ele desejou enfrentar a Pérsia e difundir a civilização helênica. 


Assim foi Alexandre formalmente reconhecido, como supremamente o foi, o representante da Grécia. A própria profecia o declarou como “o rei primeiro” da Grécia.1 Com Alexandre, em verdade, a Grécia constituiu-se, pela primeira vez, num único reino com um único rei, rei que uniu sob um único cetro todas as suas cidades divididas e todo o país. 


Foi ele também denominado pela profecia como “a grande ponta”, da Grécia.2 Tão grande foi ele ao tomar o poder deixado por seu pai Felipe, que os gregos não tiveram outra alternativa sinão aceitarem-no imediatamente como primeiro mandatário da nação, sem a pretensão de independência política do cetro macedônio à morte do pai. 


Agora ele era o “rei primeiro” dos gregos unidos, e neste eles e  ele se honraram e se homenagearam mutuamente. Foi neste novo  papel que os helenos ou gregos, unidos com o povo macedônio, disputaram o poder mundial aos medo-persas. Embora Alexandre fosse um macedônio e como seu pai houvesse conquistado a Grécia e seu exército fosse constituído também de macedônios, contudo e em harmonia com a profecia inspirada, a Grécia foi o terceiro império do mundo e não a Macedônia.


Os soldados gregos foram admirados por suas armaduras, de bronze. Seus capacetes, escudos e alabardas eram feitos de bronze. Herôdoto diz-nos que Psâmético I do Egito viu nos piratas invasores gregos o cumprimento de um oráculo que anunciava “homens de bronze vindos do mar”.


1 Dado o símbolo de cobre ou bronze que lhe conferiu a profecia, foi o império grego inferior ao império Persa representado na prata, como este o foi ao de Babilônia representado no ouro, — já pela morte prematura de Alexandre em 323; já pelo caráter corrupto de seus sucessores que empreenderam tremendas carnificinas que fizeram correr rios de sangue pela posse do trono vago; já por terem os sucessores de Alexandre dividido o Império primeiramente em quatro e depois em dois reinos, — cujas lutas continuaram até que o esfacelado e malfadado Império foi tragado pelos romanos em ascensão na política internacional. 


Veja-se os capítulos sete versículo seis; oito, versículo cinco a oito; e onze, versículos três a quinze, — onde temos estes fatos claros e onde vê-se que, tendo o Império Grego começado com a heróica e valente Grécia de Alexandre e se imposto no inteiro orbe, transformou-se numa negra história que continuou e terminou em ódio cruel, em hipócritas ambições e em torrentes de sangue. Se o Império de Alexandre não se houvesse esfacelado, mas se tivesse conservado unido e forte, dificilmente os romanos tê-lo-iam vencido.


As conquistas de Alexandre na Ásia e sua destruição do Império Persa, podemos apreciar no capítulo sete versículo seis.