29 Sobre os Tempos Passados John Wesley

SERMOES DE WESLEY PDF


'Nunca digas: Por que foram os dias passados melhores do que estes? Porque não provém da sabedoria esta pergunta'. (Eclesiastes 7:10)



1. Não é fácil discernir alguma conexão, entre este texto e o contexto entre essas palavras, tanto aquelas que se vêm antes quanto aquelas que se seguem depois. Parece ser uma sentença destacada, independente, como muitas nos Provérbios de Salomão: E, como elas, ela contém uma verdade importante, que merece uma consideração séria. Este não é o propósito da questão? 


Não é sábio inquirir, no caso de uma suposição, a menos que a própria suposição não seja apenas verdadeira, mas claramente provada que o é. Portanto, não é sábio inquirir, no caso desta suposição, que 'os dias passados foram melhores do que estes', porque, simples como ela seja, ainda assim, não foi provada, nem de fato algum dia poderá ser. 


2. Talvez, existam poucas suposições que tenham passado mais corretamente no mundo do que esta, -- que os dias passados foram melhores do que estes; e isto, em diversos aspectos. Supõe-se geralmente que nós vivemos agora nos refugos do tempo, quando o mundo está, por assim dizer, envelhecido; e, conseqüentemente, que todas as coisas dele estão em um estado de declínio. Supõe-se, em particular, que os homens foram, algumas épocas atrás, de uma estatura bem maior do que agora; que eles igualmente tinham maiores habilidades, e desfrutavam de um entendimento mais profundo e forte; em conseqüência do que, seus escritos, de todos os tipos são mais preferíveis a estes dos tempos recentes. 


Acima de tudo, supõe-se que as gerações passadas superaram a presente, na virtude; que a humanidade, em todas as épocas, e em todas as nações tem se degenerado, mais e mais; de modo que, por fim, ela regrediu da idade do ouro, para a idade do ferro, e agora a justiça desapareceu da face da terra. 


3. Antes que consideremos a verdade dessas suposições, vamos inquirir dentro do surgimento delas. E, como para a suposição geral, de que o mundo esteve, uma vez, em um estado muito mais excelente do que ele está, nós não podemos acreditar facilmente que isto surja (como todos os relatos fabulosos dos tempos dourados) de algumas tradições confusas, concernentes aos nossos primeiros antepassados, em seu estado paradisíaco? 


Para isto, o homem recorre aos fragmentos dos escritos antigos, que os homens de aprendizado tem juntado. Portanto, nós podemos admitir que existe alguma verdade na suposição; vendo que é certo que os dias que Adão e Eva passaram no paraíso eram muito melhores do que algum em que seus descendentes passaram; ou mesmo irão passar, até que Cristo retorne para reinar sobre a terra. 


4. Mas de onde esta suposição pôde se levantar, de que os homens eram antigamente de uma estatura maior do que eles são agora? Esta tem sido geralmente uma opinião predominante, quase em todas as nações em todas as épocas. Por esta razão, a bem conhecida linha de Virgílio dois mil anos atrás: --


Qualia nunc hominum producit corpora tellus. 


[Assim, traduzida por Pitt]: --  


["Dificilmente doze homens fortes de massa ponderosa puderam surgir, tais como as desgraças desses dias sombrios e degenerados" – Edit.]

Conseqüentemente, perto de mil anos antes dele, Homero nos fala de um de seus heróis atirando uma pedra que dificilmente dez homens poderiam levantar, -- tal como os homens são agora. Nós admitimos, de fato, que houve gigantes em todas as épocas, em várias partes do mundo. Quer os antediluvianos mencionados em Gênesis foram tais ou não, (o que muitos têm questionado), nós não podemos duvidar a não ser que Ogue, o Rei de Basã [(Deuteronômio 3:11) 'Porque só Ogue, o rei de Basã, restou dos gigantes; eis que o seu leito, um leito de ferro, não está porventura em Rabá dos filhos de Amom? De nove côvados, o seu comprimento, e de quatro côvados, a sua largura, pelo côvado comum'.] foi tal, assim como Golias de Gate [(I Samuel 17:4) 'Então saiu do arraial dos filisteus um homem guerreiro, cujo nome era Golias, de Gate, que tinha de altura seis côvados e um palmo']. Tais também eram muitos dos filhos (ou descendentes) de Anaque. Mas não parece que naquele tempo ou nação, os homens em geral eram maiores do que eles são agora. 


Nós estamos muito certos que eles não eram, por muitos séculos passados, através dos túmulos e caixões que têm sido descobertos, os quais são exatamente do mesmo tamanho que aqueles que estão agora em uso. E nas catacumbas de Roma, os nichos para os corpos que foram cortados na rocha, cento e dezesseis anos atrás, nenhum deles são seis pés de altura, e alguns um pouco abaixo. Acima de tudo, as Pirâmides do Egito (aquela do rei Queóps, em particular) tem, além de qualquer dúvida razoável, permanecido, pelo menos três mil anos. Ainda assim, nenhuma das múmias (corpos embalsamados), trazidas de lá, estão acima de cinco pés e dez polegadas de tamanho.


5. Mas como, então, esta suposição veio predominar tanto tempo, e tão geralmente no mundo? Eu não sei, mas pode ser por este motivo: Grande e pequeno são termos relativos; e todos os homens julgam grandeza e pequeneza, comparando coisas consigo mesmos. Por conseguinte, não é estranho, se nós pensarmos que os homens são maiores agora, do que eles foram quando eles eram crianças. Eu me lembro de uma instância notável disto em meu próprio caso: Depois de tê-la deixado, sete anos, eu tive um grande desejo de ver a escola onde eu fui matriculado. Quando eu estava lá, eu me admirei que os garotos fossem tão menores do que eles costumavam ser quando eu estava na escola. 'Muitos dos meus colegas de escola, dez anos atrás, eram maiores do que eu; e poucos deles que estão na escola agora alcançam meus ombros'. Muito verdadeiro: Mas qual foi a razão para isto? De fato, uma razão muito simples: Não foi porque eles eram menores, mas porque eu era maior do que eu fora, dez anos antes. Eu verdadeiramente acredito que esta é a causa, porque os homens em geral supõem que a raça humana decresceu na estatura. Eles se lembram do tempo quando a maioria deles, ao redor deles eram ambos mais altos e maiores do que eles próprios. Sim, e todos os homens têm feito o mesmo nas suas sucessivas gerações. É de se surpreender, então, que todos possam incorrer no mesmo equívoco, quando tem sido transmitido, por descuido, de pai para filho, e, provavelmente irá ser assim até o fim dos tempos.  


6. Mas existe igualmente uma suposição geral de que o entendimento do homem e todas as suas habilidades mentais eram maiores, nos dias passados, do que elas são agora; e que os antigos habitantes da terra tinham talentos maiores, do que os atuais. Homens de eminente aprendizado têm pensado desta forma, e têm defendido isto com a mais extrema veemência. É afirmado que muitos dos antigos escritores, ambos filósofos, poetas e historiadores não irão facilmente ser sobrepujados, se igualados, por esses dos tempos recentes. Nós podemos exemplificar em Homero e Virgílio, como poetas; Thucydides e Livy, como historiadores. Mas, neste meio tempo, é para ser notado, concernente a maioria desses escritores que, cada um deles passou toda sua vida compondo e polindo um só livro. Que surpresa então, se eles foram maravilhosamente terminados, quando tanto trabalho foi colocado neles! Eu duvido que algum homem na Europa, ou no mundo dedicou-se tanto em terminar algum tratado: Do contrário, teria sido possivelmente igualado, se não sobrepujado, qualquer um que existiu antes. 


7. Mas nós podemos facilmente reunir, dos mais autênticos registros, que a generalidade dos homens não era um jota, mais sábia, nos tempos antigos, do que ela é no momento atual. Uma das nações mais antiga, concernentes aos quais nós temos algum relato certo é a egípcia. E que concepção nós podemos ter do entendimento e aprendizado deles, quando nós refletimos sobre os objetos de sua adoração? Não se tratavam apenas dos mais vis dos animais, como cães e gatos, mas dos alhos-porró e cebolas que cresciam em suas próprias hortas. De fato, eu conheci um grande homem (cuja maneira, era tratar com o insulto mais imundo todos que ousavam diferir dele: eu não quero dizer o Dr. Johnson – ele foi um mero bajulador, comparado com o Sr. Hutchinson) que vilmente insultou todos aqueles que eram tão destituídos de bom-senso, como acreditar que qualquer uma dessas coisas concerne a eles. Ele autoritariamente afirma, (mas sem condescender nos fornecer alguma prova) que os habitantes antigos do Egito tinham um profundo significado secreto em tudo isto. Que acredite nele, quem quiser. Eu não posso acreditar numa simples afirmação de um homem. Eu penso que eles tinham nenhum significado mais profundo em adorar gatos, do que nossos escolares têm em bater neles. E eu apreendo que os egípcios comuns eram justamente tão sábios, três mil anos atrás, como os lavradores comuns na Inglaterra e Gales são hoje. Eu suponho que o entendimento natural deles, assim como suas estaturas, eram no mesmo nível que os nossos, e o aprendizado, o conhecimento adquirido deles, era muitos graus inferiores do que destas pessoas do mesmo nível, tanto na França, Holanda quanto Alemanha.


8. De qualquer modo, as pessoas dos tempos antigos nos excederam muito em virtude? Este é um ponto da maior importância; -- o restante é ninharia em comparação a ele. Agora, não é universalmente admitido que todas as épocas ficaram cada vez piores? Isto não foi observado pelos antigos poetas pagãos, quase dois mil anos atrás? Ou seja, em verso claro:


'A época de nossos pais era mais violenta – do que de nossos avós; nossa época é mais violenta do que de nossos pais; nós somos piores do que nossos pais foram, e nossos filhos serão piores do que nós'.


9. É certo que este tem sido o clamor comum de geração em geração. E, se não é verdade, de onde ele teria surgido? Como nós podemos prestar contas dele? Talvez, um outro comentário do mesmo poeta possa nos ajudar a responder. Ele não pode ser extraído do caráter geral que ele dá aos homens idosos? 


[A seguir a tradução de Boscawen da citação de Horácio (em latim): - "Fastidioso, mal humorado, propenso ao elogio. O que se passou, quando nos seus dias juvenis. E com língua censuradora severa, corrige as loucuras dos jovens!" –Edit].


Não é uma prática comum dos homens idosos elogiarem o passado e condenarem o tempo presente? E isto pode provavelmente operar muito além do que alguém poderia a princípio imaginar. Quando esses que têm mais experiência do que nós, e, por conseguinte, nós estamos aptos a pensar que têm mais sabedoria, estão quase continuamente harpando sobre isto - a decadência do mundo; estes que estão acostumando de suas infâncias a ouvirem o quanto melhor o mundo era antigamente do que é agora, (e assim ele realmente pareceu a eles, quando eles eram jovens, e quando vieram no mundo; quando a disposição da juventude deu um ar prazeroso a tudo que estava em volta deles), a idéia de um mundo, sendo cada vez pior, naturalmente cresceria com eles. E assim ele será, até que nós, da nossa vez, fiquemos mal-humorados, inquietos, descontentes e cheios de queixas melancólicas, 'Como mundo ficou pior! Quão melhor ele era quando nós éramos jovens, nos dias dourados que nós podemos lembrar!'. 


10. Mas, vamos nos esforçar, sem preconceito ou predisposição, para darmos uma olhada em toda a questão. E, numa consideração ponderada e imparcial, parecerá que os dias passados não eram melhores do que estes; sim, ao contrário, que estes são, em muitos aspectos, além de comparação, melhores do que eles. Claramente irá aparecer que, como a estatura dos homens foi proximamente a mesma desde o começo do mundo, então o entendimento dos homens, em circunstâncias similares, tem sido o mesmo, desde que Deus trouxe a inundação sobre a terra, até a presente hora. Nós não temos razão para acreditar que as nações não civilizadas da África, América ou Ilhas do Sul, tiveram, alguma vez, um entendimento melhor; ou elas estiveram num estado menos bárbaro do que estão agora. Nem, por outro lado, nós temos alguma prova suficiente de que os entendimentos naturais dos homens eram mais fortes ou mais refinados, nas regiões mais civilizadas - Babilônia, Pérsia, Grécia, ou Itália - do que essas dos alemães, franceses ou ingleses, agora vivos. Mais do que isto, nós não temos razão para acreditar que, através de melhores instrumentos, nós temos alcançado aquele conhecimento da natureza, que poucos, se algum, dos antigos alguma vez obtiveram? De modo que, neste respeito, a vantagem (e não uma pequena) está claramente de nosso lado: E nós devemos reconhecer, com profunda gratidão ao Doador de todo o bom dom, que os tempos passados não sejam para serem comparados a esses em que nós vivemos. 


11. Mas a principal pergunta ainda permanece: 'Os dias passados' não eram 'melhores do que estes', com respeito à virtude: Ou, para falar mais propriamente, religião? Isto merece uma consideração completa. 


Por religião, eu quero dizer o amor de Deus e homem preenchendo o coração e governando a vida. O efeito certo disto é a prática uniforme da justiça, misericórdia e verdade. Esta é a mesma essência dele; a altura e profundidade da religião, destacada desta ou daquela opinião, e de todos os modelos particulares de adoração. E eu iria calmamente inquirir: 'Quais dos tempos passados foram melhores do que estes, com respeito a isto? Com respeito à religião experimentada e praticada pelo Arcebispo Fenelon, na France; Bispo Ken, na Inglaterra; e Bispo Bedell, na Irlanda?'


12. Nós não precisamos estender nossa pergunta para além do período, quando a vida e imortalidade foram trazidas à luz pelo Evangelho. Admite-se que os dias imediatamente seguintes ao derramar do Espírito Santo, no dia de Pentecostes foram melhores, até mesmo, neste aspecto; até mesmo com respeito à religião, do que qualquer um que tenha sucedido a eles.  


Mas, colocando aparte esta breve época dos dias dourados, eu devo repetir a questão: 'Quais dos dias passados foram melhores do que o presente, em cada parte conhecida do mundo habitado?'.


13. A primeira metade deste século foi melhor, tanto nessas ilhas, quanto em alguma parte do continente? Eu não conheço razão, afinal, para afirmar isto. Eu acredito que toda parte da Europa estava tão sem religião, no reinado da Rainha Anne, quanto está até hoje. É verdade que a luxúria aumenta, em um grau alto, em toda Europa: E, assim, o escândalo da Inglaterra, profanidade, em todo o reino. Mas também é verdade que a mais infernal de todas as maldades, a crueldade, decresce rapidamente. E tais instâncias dela que, nos tempos passados, continuamente ocorreram, são agora muito raramente ouvidas a respeito. Até mesmo, na guerra, esta barbaridade selvagem que foi em todo lugar praticada, tem sido descontinuada durante muitos anos. 


14. O século passado era mais religioso do que este? Na primeira parte dele, havia muito da forma de religião; e, indubitavelmente, alguns experimentaram o poder disto. Mas quão logo, o fino ouro tornou-se opaco! Quão logo, ele foi tão misturado com os objetivos mundanos, e com um total desrespeito ambos à verdade, justiça e misericórdia, quando trouxe aquele escândalo sobre todas as religiões, o que é dificilmente removido até este dia. Havia mais religião verdadeira, no século precedente, na época da Reforma? Havia, sem dúvida, em muitas regiões, uma considerável reforma das opiniões religiosas; sim, e modelos de adoração, que foram mudados para melhor, na Alemanha e diversos outros lugares. Mas é bem conhecido que o próprio Lutero queixou-se, com sua respiração moribunda: 'As pessoas que são chamadas pelo meu nome (embora eu desejasse que elas fossem chamadas pelo nome de Cristo) estão reformadas, quanto às opiniões e moldes de adoração delas; mas o seu temperamento e vida são os mesmos que eles eram antes'. Mesmo então, a justiça e misericórdia foram tão vergonhosamente pisadas, que um escritor eminente calculou o número daqueles que eram trucidados, durante estas disputas religiosas, como tendo sido não menos do que quarenta milhões, num compasso de quarenta anos!


[Uma curiosidade sobre um comentário feito pelo Sr. Wesley, em seu Diário, a respeito de um livro de Martinho Lutero, em meados de 1741, ainda no início de seu ministério de cinqüenta anos]:


 "Eu parti de Londres, e li, durante o percurso, o celebrado livre de Martinho Lutero 'Comentário sobre a Epistola aos Gálatas'. Eu me senti totalmente envergonhado! Como eu pude gostar desse livro, só porque ele tinha sido recomendado por outros; ou, melhor, porque eu tinha lido, ocasionalmente, algumas das excelentes frases, citadas dele! Mas o que eu devo dizer, agora, que eu julguei por mim mesmo? Agora que eu vejo com meus próprios olhos? Porque: (1) O autor não entende nada; (2) Não clareia qualquer considerável dificuldade; (3) É totalmente superficial, em suas observações, nas muitas passagens; (4) Em quase tudo, é lodoso e confuso; (5) Mas, principalmente, porque é impregnado com misticismo, ao longo de toda obra; (6) E, conseqüentemente, freqüentemente, e perigosamente, errado". 


[Outro momento curioso, acontece em 1749, quando o Sr. Wesley comenta uma tradução que havia feito sobre a vida Lutero]:


"Eu terminei a tradução de 'A Vida de Martinho Lutero'. Sem dúvida, ele era um homem altamente favorecido por Deus e um abençoado instrumento em sua mão. Mas oh! Que pena, que ele não tivesse um amigo fiel! Ninguém que pudesse, com todo risco, o repreender, clara e nitidamente, por seu áspero e intratável espírito, e o ácido fervor pelas opiniões, tão grandemente obstrutiva ao trabalho de Deus!". [acréscimo tradutora]


15. Nós podemos voltar atrás, em milhares de anos, sem encontrarmos tempo algum melhor. Nenhum historiador nos deu a menor notificação de algo assim, até que chegamos na época de Constantino o Grande. Deste período, diversos escritores nos têm dado os mais magníficos relatos. Sim, um eminente autor, não menos que o Dr. Newton, o recente Bispo de Bristol, tem se esforçado para mostrar que a conversão de Constantino ao Cristianismo, e os emolumentos que ele concedeu sobre a Igreja com uma mão magnânima, fora o evento que é significado na Revelação como 'a nova Jerusalém vindo dos céus!'. 


 16. Mas eu não posso, de maneira alguma, concordar com a opinião do Bispo neste assunto. Muito longe disto, há tempos, eu fui convencido, do teor total da história antiga, que este mesmo evento -- Constantino chamando a si mesmo de Cristão, e derramando aquela inundação de prosperidade e honra [poder] na Igreja de Cristo, no clero, em particular, produziu mais mal à Igreja, que todas as dez perseguições, colocadas juntas. Desde que aquele poder, riqueza e honra de todos os tipos foram empilhados sobre os cristãos, todos os tipos de maldades vieram, igualmente, como uma inundação sobre o clero e o leigo. Desde que a Igreja e Estado, os reinos de Cristo e do mundo, foram tão estranhamente e artificialmente misturados; Cristianismo e Ateísmo foram tão completamente incorporados, um com o outro, que eles dificilmente serão alguma vez separados, até que Cristo venha reinar sobre a terra. De modo que, em vez de imaginar que a glória da nova Jerusalém cobriu a terra, naquele período, nós temos uma prova terrível que ela tem, então, e desde sempre, coberto com a fumaça do abismo sem fim.


17. 'De qualquer forma, os dias antecedentes a este -- aqueles do terceiro século, -- não foram melhores, além de toda comparação, do que algum que se seguiu a eles?'. Isto tem sido universalmente acreditado. Poucos duvidam; mas, na época antes de Constantino, a igreja cristã esteve em seu auge, adorando a Deus na beleza e santidade. Mas será que foi assim, realmente? O que diz Cipriano, que viveu no meio daquele século; uma testemunha acima de toda exceção, e um dos que selaram a verdade com seu sangue? Que relato ele dá do que ele viu, com seus próprios olhos, e ouviu com os próprios ouvidos? Tal relato que alguém quase poderia imaginar que ele estaria retratando a vida, não da igreja antiga de Cartagena, mas da moderna igreja de Roma. De acordo com seu relato, tais abominações, mesmo então, prevaleceram sobre todos os comandos de homens, de maneira que não foi estranho Deus ter despejado sua fúria sobre eles no sangue, através das perseguições graves que se seguiram. 


18. Sim, e antes disto, mesmo no primeiro século; mesmo na época apostólica, que relato João deu das diversas igrejas que ele mesmo fundou na Ásia? Quão pequenas foram aquelas congregações, melhores do que muitas na Europa até este dia? Mais ainda, quarenta ou cinqüenta anos antes disto, nos trinta anos da descida do Espírito Santo, não havia tais abominações na igreja de Corinto, que 'nem mesmo eram reputadas em meio aos pagãos?'. Quão logo, 'o mistério da iniqüidade' começou a operar na igreja cristã! Tão pouca razão nós temos para apelar para 'os primeiros dias', acreditando que eles foram 'melhores do que este!'.


19. Afirmar isto, portanto, tão comumente como é feito, não é apenas contrário à verdade, mas é um exemplo de ingratidão negra a Deus, e uma afronta grave ao seu abençoado Espírito. Porque quem quer que faça uma inquisição justa e clara irá facilmente perceber que a religião verdadeira não tem, de maneira alguma, decrescido, mas grandemente aumentado, no século presente. Para exemplificar em uma ramificação imprescindível da religião, o amor ao nosso próximo. A perseguição não está quase varrida da face da terra? Em que época, os cristãos das várias denominações mostraram tanta clemência em direção uns aos outros? Quando antes, tal indulgência dos governadores, em direção aos seus respectivos súditos, foi mostrada? Não apenas na Grã Bretanha e Irlanda, mas na França e Alemanha; sim, em todas as partes da Europa? Nada como isto tem sido visto, desde os tempos de Constantino; não, nem desde os tempos dos Apóstolos. 


20. Se for dito: 'Porque este é o fruto da infidelidade geral; do Deismo que tem se espalhado por toda a Europa'; eu respondo que qualquer que seja a causa, nós temos razão grandemente para nos regozijarmos em efeito: E, se o Todo-Sábio Deus tem trazido tão grande e universal bem, dessa maldade terrível, tanto mais devemos magnificar seu poder, sabedoria e bondade, surpreendentes nisto. Realmente, até onde nós podemos julgar, este foi o caminho mais direto, por meio do qual os cristãos nominais puderam ser preparados, primeiro, para tolerar, e, mais tarde, para receber o Cristianismo verdadeiro. Enquanto os próprios governantes estiveram alheios a isto, nada, a não ser isto pôde induzi-los a permiti-lo. Ó, a profundidade da sabedoria e conhecimento de Deus; causando uma total desatenção a toda religião, a fim de pavimentar o caminho para o avivamento da única religião que é merecedora de Deus! Eu não estou seguro, se este é o caso ou não na França e Alemanha; mas é além de toda contradição, na América do Norte: A total indiferença do governo de lá, se existe alguma religião, ou nenhuma, deixou espaço para a propagação da religião verdadeira e bíblica, sem o menor obstáculo ou impedimento. 


21. Mas acima de tudo isto, enquanto a luxúria e profanidade têm aumentado de um lado, de outro a benevolência e compaixão, em direção a todas as formas de aflição humana, tem aumentado, de uma maneira não conhecida antes, desde os primeiros épocas do mundo. Como prova disto, nós vemos mais hospitais, enfermarias, e outros lugares públicos de caridade, sendo erguidos, pelo menos dentro e perto de Londres, neste século, do que em quinhentos anos atrás. E supõe-se que isto tenha sido devido, em parte, à vaidade, desejo de elogio; ainda assim, nós temos motivos para dar graças a Deus, que tanto bem tem espalhado, mesmo destes motivos imperfeitos.


22. Eu não posso abster-me de mencionar uma instância mais da bondade de Deus para conosco, na presente época. Ele tem levantado seu estandarte em nossas ilhas, tanto contra a luxúria, profanidade, e maldades de todos os tipos. Perto de cinqüenta anos atrás, Ele fez com que uma semente de grão de mostarda, por assim dizer, fosse semeada perto de Londres; e ela agora cresceu e produziu grandes ramificações, estendendo-se de mar a mar. Duas ou três pessoas pobres se encontraram, com o objetivo de ajudarem umas as outras a serem verdadeiras cristãs. Elas aumentaram às centenas, aos milhares, às miríades, até atingirem um ponto, a religião verdadeira; o amor de Deus e homem comandando todos os seus temperamentos, e palavras e ações. Eu ousarei dizer agora que, tal evento como este, considerado em todas as suas circunstâncias, não foi visto sobre a terra antes, desde o tempo que João partiu para o seio de Abraão. 


23. Nós podemos agora dizer: 'Os dias passados foram melhores do que estes?'. Deus proíbe que possamos ser tão insensatos e tão mal agradecidos! Mais do que isto; preferivelmente, vamos louvar a Ele todos os dias; porque Ele tem tratado generosamente conosco. Nenhum 'tempo passado', desde que os Apóstolos deixaram a terra, tem sido melhor do que o presente. Nenhum tem sido comparável a este, em diversos aspectos. Nós não nascemos antes do tempo devido, mas no dia de seu poder, -- um dia de salvação gloriosa, em que Ele está renovando rapidamente toda a raça humana na retidão e santidade verdadeira. Quão radiante, o Sol da Retidão tem ainda brilhado nas várias partes da terra! E quanta chuva graciosa Ele já derramou sobre sua herança! Quantas almas preciosas Ele já reuniu em seu silo, como pilhas de molhos de milho maduro! Que nós possamos estar sempre prontos a segui-las; clamando em nossos corações: 'Venha, Senhor Jesus! Venha rapidamente!'.


[27 de Junho, 1787] 

 

[Editado por George Lyons para a Wesley Center for Applied Theology.] 


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