59 PECADO ORIGINAL (John Wesley)

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'E viu o Senhor que a maldade do homem se multiplicara sobre a terra e que toda a imaginação dos pensamentos de seu coração era só má continuamente'. (Gênesis 6:5)


1. Quão maravilhosamente diferente é isto, dos formosos quadros da natureza humana que os homens têm esboçado em todas as épocas! Os escritos de muitos dos anciões abundam com descrições alegres da dignidade do homem; a quem alguns deles pintam, como tendo todas as virtudes e felicidade em sua composição, ou, pelo menos, estando inteiramente em seu poder, sem observar a qualquer outra existência, como auto-suficiente, capaz de viver por sua própria conta, e pouco inferior ao próprio Deus. 


2. Não se trata apenas dos pagãos; homens que são guiados em suas buscas, por um pouco mais do que uma pálida luz de razão, mas muitos deles, igualmente, que testemunham o nome de Cristo, e para os quais foram confiados os oráculos de Deus, têm falado da natureza do homem, tão magnificamente, como se ela fosse toda inocência e perfeição. 


Relatos deste tipo têm particularmente abundado no presente século; e, talvez, em nenhuma outra parte do mundo mais do que em nossa própria região. Aqui, não poucas pessoas de forte entendimento, assim como de extenso aprendizado, têm empregado as mais extremas habilidades, para mostrarem o que eles denominam de 'o maravilhoso lado da natureza humana'. E deve-se reconhecer que, se seus relatos forem justos, o homem é 'um pouco inferior do que os anjos'; ou, como as palavras podem ser mais literalmente afirmadas, 'um pouco menos do que Deus'. 


3. É de se admirar que esses relatos tenham sido tão prontamente recebidos, pela generalidade de homens? Quem não é facilmente persuadido a pensar favoravelmente de si mesmo? Assim sendo, os escritores deste tipo são mais universalmente lidos, admirados, aplaudidos. E inumeráveis são os convertidos que eles têm feito, não apenas no mundo leviano, mas no mundo ilustrado. De modo que agora é completamente fora de moda falar de outro modo; dizer qualquer coisa para a depreciação da natureza humana; a que geralmente se permite, não obstante algumas poucas enfermidades, ser muito inocente, sábia e virtuosa!


4. Mas, neste meio tempo, o que devemos fazer com nossas Bíblias? Porque esses relatos nunca irão concordar com isto. Como quer que eles agradem à carne e ao sangue, são extremamente irreconciliáveis com os relatos bíblicos. As Escrituras asseveram que 'através da desobediência de um homem, todos os homens foram constituídos pecadores'; que 'em Adão todos morreram' -- morreram espiritualmente, perderam a vida e a imagem de Deus; que aquele pecador e caído Adão, então, originou um filho à sua própria semelhança'; -- nem seria possível que ele pudesse originá-lo de outra forma, porque 'quem pode produzir uma coisa pura de uma impureza?'— que, conseqüentemente, nós estávamos, assim como outros homens, pela natureza, 'mortos nas transgressões e pecados'; 'sem esperança, e sem Deus no mundo', e, portanto, 'filhos da ira'; de modo que todo homem podia dizer, 'Eu fui moldado na iniqüidade; e, no pecado, minha mãe me concebeu'; que 'não existe diferença', em 'todos que pecaram e não alcançaram a glória de Deus'; daquela gloriosa imagem de Deus, na qual o homem foi originalmente criado. E, conseqüentemente, quando 'o Senhor olhou dos céus para os filhos dos homens, Ele viu que todos eles haviam saído do caminho; que eles haviam se tornado completamente abomináveis; que não havia um justo; não; nem um', ninguém que verdadeiramente buscasse a Deus. De acordo com isto, e o que é declarado pelo Espírito Santo, nas palavras acima citadas, 'Deus viu', quando ele olhou dos céus, antes, 'que a maldade do homem estava grande na terra'; tão grande, que 'cada imaginação dos pensamentos de seu coração era, tão somente, continuamente pecaminosa'. 


Este é o relato de Deus do homem: Do qual eu devo aproveitar a oportunidade:


I. Primeiro, para mostrar o que os homens eram antes do dilúvio:

II. Segundo, para inquirir, se eles não são da mesma maneira agora:

III. Terceiro, para acrescentar algumas inferências. 


I


1. Em Primeiro Lugar, eu vou mostrar, esclarecendo as palavras do texto, o que os homens eram antes do dilúvio. E nós podemos nos basear completamente no relato fornecido aqui: Porque Deus o viu, e Ele não pode se enganar. Ele 'viu que a maldade do homem era grande': -- Não este ou aquele homem: não apenas alguns poucos homens; não meramente uma parte maior, mas o homem em geral; os homens universalmente. A Palavra inclui toda a raça humana; todos os que fazem parte da natureza humana. E não é fácil para nós computarmos o número deles, para dizer quantos milhares ou milhões eles eram. A Terra, então, retinha muito de sua beleza primitiva e fertilidade original. A face do globo não era rachada e dividida como ela é agora; e primavera e verão eram bem definidos. É, portanto, provável que ela proporcionasse sustento para muito mais habitantes do que é hoje capaz; e esses deviam ser imensamente multiplicados, enquanto os homens criavam filhos e filhas, por setecentos ou oitocentos anos juntos. Ainda assim, em meio a todo este número inconcebível, apenas 'Noé encontrou favor com Deus'. Ele somente (talvez, incluindo parte de sua família) foi uma exceção à iniqüidade universal, que, pelo justo julgamento de Deus, pouco tempo depois, foi levada à destruição. Todos os demais foram participantes da mesma culpa, assim como, da mesma punição.  


2. 'Deus viu todas as criações dos pensamentos de seu coração'; -- de sua alma, de seu homem interior, o espírito dentro dele, o princípio de todos os seus movimentos internos e externos. Ele 'viu todas as criações': Não é possível encontrar uma palavra de um significado mais extensivo. Ela inclui o que quer que seja formado, feito, e fabricado dentro; tudo que existe ou se passa na alma; toda inclinação, afeição, paixão, apetite; todo temperamento, desígnio, pensamento. Deve-se, em conseqüência, incluir toda palavra e ação, como fluindo naturalmente dessas fontes, e sendo tanto boa quanto má, de acordo com a fonte de onde ela severamente flui.


3. Deus viu, agora, que tudo isto, o todo disto, era mal; -- contrário à retidão moral; contrário à natureza de Deus, que necessariamente inclui todo bem; contrário à vontade divina, o padrão eterno de bem e mal; contrário à imagem pura e santa de Deus, onde o homem foi originalmente criado, e, onde ele permaneceu, quando Deus, inspecionando as obras que havia criado, viu, então, que tudo era muito bom; contrário à justiça, à misericórdia, e verdade, e às relações essenciais que cada homem tem com seu Criador e seu próximo. 


4. Mas não havia bem misturado com o mal? Não havia luz misturada com a escuridão? Não; nenhuma afinal: 'Deus viu que o todo da imaginação do coração do homem era tão somente mau'. E de fato, não se pode negar que muitos deles, talvez, todos tivessem boas intenções, colocadas em seus corações; uma vez que o Espírito de Deus também 'empenhava-se com o homem', se, por acaso, ele pudesse arrepender-se, mais especialmente, durante aquele gracioso adiamento temporário, de cento e vinte anos, enquanto a arca estava sendo preparada. Mas, ainda assim, 'em sua carne não habitava coisa alguma boa'; toda sua natureza era puramente má. Ela era totalmente consistente consigo mesma, e não misturada com qualquer coisa de uma natureza oposta.


5. No entanto, ainda pode ser o caso de se perguntar: 'Não havia intermissão deste mal? Não havia intervalos lúcidos, em que alguma coisa boa pudesse ser encontrada no coração do homem?'. Nós não vamos considerar aqui o que a graça de Deus poderia ocasionalmente operar em sua alma; e, abstraídos disto, nós não temos motivos para acreditar que houvesse alguma intermissão daquele mal. Porque Deus, que 'viu que o todo da imaginação dos pensamentos de seu coração era tão somente mau', viu, igualmente, que ele sempre foi o mesmo; que ele 'era mau, continuamente'; cada ano; cada dia; cada hora; e cada momento. Ele nunca se desviou para o bem.


II


Tal é o relato autêntico de toda a raça humana, que Ele que conhece o que está no homem; que sonda o coração e testa as afeições, tem deixado registrado para nossa instrução. Tais eram todos os homens antes que Deus trouxesse o dilúvio sobre a terra. 


Nós vamos, agora, em Segundo Lugar, inquirir se eles são o mesmo agora. 


1. E isto é certo, as Escrituras não nos dão motivo para pensar de alguma forma diferente delas. Do contrário, todas as passagens das Escrituras citadas acima se referem àqueles que viveram depois do dilúvio. Acima de mil anos antes que Deus declarasse, através de Davi, com respeito aos filhos dos homens: 'Todos eles saíram do caminho da verdade e santidade; não existe alguém justo; nem um'.


E a isto, testemunham todos os profetas, em suas diversas gerações. Como Isaias, concernente ao povo peculiar de Deus, (e certamente os ateus não estavam em melhor condição): 'Toda a mente está doente; e todo o coração desfalece.  Dos pés à cabeça, não existe sanidade; mas machucaduras, e injúria, e feridas pútridas'.  O mesmo relato é dado por todos os Apóstolos; sim, através de todo o teor dos oráculos de Deus. De tudo isto, nós aprendemos, concernente ao homem em seu estado natural, não auxiliado pela graça de Deus, que 'cada imaginação dos pensamentos de seu coração é' ainda 'mau; tão somente mau', e 'continuamente mau'. 


2. Este relato do presente estado do homem é confirmado por experiências, diariamente. É verdade que o homem natural não se preocupa com ele. E isto não é de se admirar. Por quanto tempo um homem nascido cego continuar assim, ele dificilmente estará consciente de sua necessidade: Muito menos poderíamos supor um lugar onde todos que foram nascidos sem luz, pudessem estar conscientes da necessidade dela. De igual maneira, por quanto tempo os homens permaneçam em sua cegueira natural de entendimento, eles não estão conscientes de suas necessidades espirituais, e, em particular, deste. Mas, tão logo Deus abra os olhos de seu entendimento, eles vêem o estado que eles estavam anteriormente; eles estão, completamente convencidos que 'cada homem vivente', especialmente eles mesmos, é, pela natureza, 'completamente vaidade'; ou seja, insensatez e ignorância; pecado e maldade. 


3. Quando Deus abre nossos olhos, vemos que estávamos antes, sem Deus, ou melhor, éramos ateístas, no mundo. Tínhamos, pela natureza, nenhum conhecimento de Deus; nenhuma familiaridade com ele. É verdade, que tão logo começamos a usar a razão, tomamos conhecimento 'das coisas invisíveis de Deus, até mesmo seu poder eterno e Divindade, das coisas que estão feitas'. Das coisas que são vistas, inferimos a existência de um Ser poderoso e eterno, que não é visível. Mas ainda assim, embora reconheçamos sua existência, nós não temos familiaridade com Ele. 


Assim como sabemos que existe um Imperador da China, a quem ainda não conhecemos; nós sabíamos que existia um Rei de toda a Terra, ainda assim, não o conhecemos. Na verdade, não poderíamos, através de qualquer uma de nossas faculdades naturais. Através de nenhuma dessas, poderíamos obter o conhecimento de Deus. Não poderíamos percebê-lo mais do que vê-lo com nossos olhos. Porque 'ninguém conhece o Pai, a não ser o Filho, e ele a quem o Filho irá revelá-lo'. 


4. Nós lemos de um rei antigo, que, estando desejoso de saber qual era a língua natural dos homens, com o objetivo de trazer o assunto para um certo debate, fez o seguinte experimento: Ele ordenou que duas crianças, tão logo elas tinham nascido, fossem transportadas para um lugar preparado para elas, onde elas foram levadas, sem qualquer instrução, afinal, e sem nunca ouvir uma voz humana. E o que aconteceu? Aconteceu que quando elas foram, por fim, trazidas para fora do seu confinamento, elas não falaram língua alguma, afinal; apenas articulavam apenas alguns sons estranhos, como aqueles de outros animais. Que essas duas crianças foram, da mesma maneira, trazidas do útero, sem serem instruídas em alguma religião, não havia motivo para dúvida, mas (a menos que a graça de Deus se interpusesse), o evento seria justamente o mesmo. Elas não teriam religião, afinal. Elas não teriam mais conhecimento de Deus do que as bestas do campo; do que o selvagem potro. Tal é a religião natural, abstraída da tradicional, e das influências do Espírito de Deus! 


5. E não tendo conhecimento, não podemos ter o amor de Deus: Não podemos amar o que não conhecemos. A maioria dos homens fala, de fato, do Deus amoroso, e, talvez, imaginam que eles conheçam; pelo menos, alguns irão reconhecer que eles não O amam: Mas o fato é muito claro para ser negado.Nenhum homem ama a Deus, através da natureza, mais do que ele o faz a uma pedra, ou à terra que ele pisa. No que nós amamos, nós nos deleitamos: Mas nenhum homem tem naturalmente qualquer deleite em Deus. Em nosso estado natural, não podemos conceber como alguém poderia deleitar-se Nele. Nós não temos prazer nele, afinal; ele é extremamente insípido para nós. Amar a Deus! Está muito além de nossas vistas. Nós não podemos alcançar isto, naturalmente.


6. Pela natureza humana, tão somente, não temos amor, mas também, medo de Deus. Na verdade, é certo que a maioria dos homens tem, mais cedo ou mais tarde, uma forma de medo irracional e inconsciente, propriamente chamado de superstição; embora os descuidados epicuristas tenham dado a isto o nome de religião. Ainda assim, isto não é natural, mas adquirido; principalmente, através de conversa ou de exemplo. Pela natureza, 'Deus não está em todos os nossos pensamentos': Nós o deixamos manejar seus próprios assuntos, sentado-se quietamente, como imaginamos, no céu, e nos deixando na terra, para manejarmos os nossos; de modo que não temos mais temor de Deus, diante de nossos olhos, do que o amor de Deus, em nossos corações. 


7. Assim, são todos os homens 'ateus no mundo'. Mas o próprio ateísmo não nos protege da idolatria. Em seu estado natural, cada homem nascido no mundo é um idólatra completo. Talvez, não deve ser de tal maneira no sentido comum da palavra. Nós não adoramos, como os idólatras ateus, ferro fundido ou imagens esculpidas. Nós não nos curvamos a um tronco de uma árvore; ao trabalho de nossas próprias mãos. Nós não oramos para os anjos ou santos nos céus, não mais do que os santos que estão sobre a Terra. Mas o que acontece, então? Nós temos fixado nossos ídolos em nossos corações; e a estes nós nos curvamos e adoramos. Nós adoramos a nós mesmos, quando concedemos que a honra, que é devida somente a Deus, seja dada a nós. E, embora o orgulho não fosse criado para o homem, ainda assim, onde está o homem que nasceu sem ele? Assim sendo, roubamos de Deus seu inalienável direito e idolatricamente usurpamos sua glória. 


8. Mas o orgulho não é apenas uma espécie de idolatria, da qual somos todos culpados pela natureza. Satanás tem estampado sua própria imagem em nosso coração na vontade própria também. 'Eu irei', ele disse, antes de ser expulso do paraíso, 'Eu me assentarei aos lados do norte'; Eu farei minha vontade e prazer; independentemente daquela de meu Criador. 


'E tu dizias no teu coração: Eu subirei ao céu, acima das estrelas de Deus exaltarei o meu trono, e no monte da congregação me assentarei, aos lados do norte'. (Isaías 14:13)


O mesmo cada homem nascido no mundo diz, e isto, em milhares de instâncias; mais ainda, e declara isto também, sem nunca corar diante do relato; sem temer ou envergonhar-se. 


Pergunte ao homem: 'Por que você faria isto?'. Ele responderá: 'Porque eu estou inclinado a fazê-lo''.  O que é isto, senão, 'porque é da minha vontade'; ou seja, em efeito, porque o diabo e eu concordamos; porque Satanás e eu governamos nossas ações, através de um e do mesmo princípio. A vontade de Deus, neste meio tempo, não está em seus pensamentos; ela não é considerada no menor grau: embora seja a regra suprema de toda criatura inteligente; quer no céu, quer na terra, resultante da relação essencial e inalterada que toda criatura testemunhe seu Criador. 


9. Desta mesma forma, levamos a imagem do diabo, e trilhamos seus passos, Mas, no próximo passo, deixamos satanás para trás; nós seguimos uma idolatria, em que ele não é o culpado: eu quero dizer o amor do mundo; que é agora tão natural a cada homem, quanto amar a sua vontade própria. O que é mais natural para nós, do que buscar felicidade na criatura, em vez do Criador? – buscar aquela satisfação nas obras de suas mãos, e que pode ser encontrada apenas em Deus? O que é mais natural, do que o 'desejo da carne?'. Ou seja, do prazer do sentido de todo tipo? Os homens, de fato, falam magnificamente de despirem-se desses prazeres inferiores, particularmente, os homens de aprendizado e educação. Eles simulam se libertarem da gratificação desses apetites, em que eles se situam no mesmo nível que as bestas que perecem. Mas é mero fingimento; porque cada homem é consciente de que, neste aspecto, ele é, pela natureza, a mesma besta. Apetites sexuais, até mesmo aqueles do tipo mais inferior, têm, mais ou menos, um domínio sobre ele. Eles o conduzem cativo; eles o arrastam para um lado e para o outro, a despeito de sua razão ostentada. O homem, com toda sua boa educação, e outros complementos, não tem primazia sobre uma cabra: mais ainda, é para se duvidar, se a besta não tem primazia sobre ele.  Certamente, ele tem, se nós podemos ouvir atentamente a algum dos seus oráculos modernos, quem muito decentemente nos diz: Numa determinada época, as bestas também provam do amor; apenas a besta da razão é sua escrava, e, nesta insensatez, ocupa-se o ano todo.  


Uma diferença considerável, de fato, deve-se admitir, existe entre os homens (além daquela forjada pela graça preventiva), surgindo da diferença de constituição e educação. Mas, não obstante isto, quem, que não seja ignorante de si mesmo, pode aqui atirar a primeira pedra no outro? Quem pode suportar o teste da observação de nosso amado Senhor, no sétimo mandamento: 'aquele que olhar para uma mulher, para cobiçá-la, já em seu coração, cometeu adultério?'. De modo que não se sabe do que se admirar mais, se da ignorância, ou da insolência daqueles homens que falam com tal desdém daqueles que são dominados pelos desejos que todo homem tem sentido em seu próprio peito; o desejo de cada prazer do sentido, inocente ou não, sendo natural a todo filho do homem. 


10. E assim é 'o desejo dos olhos'; o desejo dos prazeres da imaginação. Esses surgem tanto dos grandes, quando dos objetos bonitos e incomuns; -- se os dois primeiros não coincidem com o último, visto que, talvez, possa parecer, numa sindicância zelosa, que nem os objetos grandes, nem os bonitos agradam mais do que aqueles que são novos; quando a novidade deles acaba, a maior parte, pelo menos, do prazer que eles proporcionavam termina; e na mesma proporção que eles se tornam familiares, eles se tornam vazios e insípidos. Mas mesmo que experimentemos isto tão freqüentemente, o mesmo desejo irá ainda permanecer. A sede inata continua fixada na alma; mais do que isto: quanto mais temos indulgência, mais ela aumenta, e nos incita a seguir atrás de outro, e outro objeto mesmo assim; embora deixemos cada um com uma esperança fracassada, e uma expectativa iludida.


11. Um terceiro sintoma dessa doença fatal, o amor do mundo, que está tão profundamente enraizado em nossa natureza, é o orgulho da vida'; o desejo do reconhecimento, da honra que vem dos homens. Os maiores admiradores da natureza humana admitem que isto seja estritamente natural; tão natural quanto ver, ouvir, ou qualquer outro dos sentidos externos. E será que eles estão envergonhados disto, mesmo os homens letrados; homens refinados e de grande entendimento? Muito longe disto, eles se gloriam neste sentido! Eles aplaudem a si mesmos, por causa do amor deles pelo aplauso! Sim; cristãos eminentes, assim chamados, não têm dificuldade em adotar o dizer do velho ateu vaidoso: 'Não considerar o que os homens pensam sobre nós, é a marca de uma mente enfraquecida e abandonada'. Assim, ir com calma e equilibrado, através da honra e desonra; através de um relato bom ou ruim, é, para eles, sinal de alguém que não está, na verdade, adequado para viver: 'Fora da terra com tal disposição'. Mas alguém imaginaria que esses homens ouviram de Jesus Cristo ou de seus Apóstolos; ou que eles soubessem quem foi que disse: 'Como você pode acreditar em alguém que recebe honra de outro, e não busca a honra que vem de Deus somente?'. Mas, se isto é realmente assim; se for impossível acreditar, e conseqüentemente agradar a Deus, por quanto tempo recebemos ou buscamos a honra de uns dos outros, e não a honra que vem de Deus apenas, então, em que condição está a humanidade! Os cristãos, assim como os pagãos; uma vez que todos buscam honra um do outro! Uma vez que seja natural para eles procederem desta forma; sendo eles mesmos os juízes; assim como é natural ver a luz que toca seus olhos, ou ouvir o som que entrar por seus ouvidos; sim, uma vez que eles consideram isto um sinal de uma mente vitoriosa, contentar-se com a honra que vem de Deus apenas! 


III


1. Eu prossigo, esboçando algumas inferências do que foi dito. Primeiro, que disto podemos aprender uma grande e fundamental diferença entre o Cristianismo, considerado como um sistema de doutrinas, e a maioria do refinado Ateísmo. Muitos dos antigos ateus têm descrito largamente a tendência habitual condenável de homens específicos. Eles têm falado muito contra a avareza, crueldade, luxúria, e prodigalidade deles. Alguns se atreveram a dizer que 'nenhum homem nasce sem essa tendência condenável, de uma espécie ou de outra'. Mas como ainda nenhum deles foram avisados da queda do homem, então, nenhum deles sabe de sua total corrupção. Eles não souberam que todo homem foi esvaziado de todo bem, e preenchido com toda forma de mal. Eles eram totalmente ignorantes da completa depravação de toda natureza humana, de cada homem nascido no mundo, em toda faculdade de sua alma; não tanto devido àquelas tendências específicas, que reinam em pessoas específicas, como por meio da inundação geral de ateísmo e idolatria, do orgulho, da vontade própria, e amor do mundo. Isto, por conseguinte, é o primeiro grande ponto de distinção entre Ateísmo e Cristianismo. Um reconhece que muitos homens estão infectados com muitos vícios, e, até mesmo, nascem com uma propensão a eles; mas supõe, além disto, que em alguns o bem natural contrabalança em muito o mal: O outro declara que todos os homens são concebidos no pecado, 'e moldados na maldade', -- que, conseqüentemente, existe em cada homem 'uma mente carnal que é inimiga de Deus; que não é, nem pode ser, objeto de' sua 'lei'; e que assim infecta toda a alma; que 'habita' nele, 'em sua carne', em seu estado natural, 'nenhuma coisa boa', mas 'cada pensamento de seu coração é mau', e tão somente mau; e isto, 'continuamente'.


2. Conseqüentemente, podemos aprender, em Segundo Lugar, que todo aquele que nega isto; que o chama de pecado original; ou por algum outro título, são ainda considerados ateus, no ponto fundamental que diferencia o Ateísmo do Cristianismo. Eles podem, na verdade, admitir que os homens têm muitos vícios; que alguns desses vícios nasceram conosco; e que, conseqüentemente, não nascemos completamente tão sábios, ou tão virtuosos, como deveria ser; existindo poucos que irão afirmar redondamente: 'Nós nascemos com propensão, tanto para o bem, quanto para o mal; e todo homem, pela natureza, é virtuoso e sábio, tanto quanto Adão foi quando de sua criação'. Mas aqui está o lema: Será que, pela natureza, o homem está preenchido com toda forma de mal? Ele está vazio de todo bem? Ele está totalmente caído? Sua alma é totalmente corrupta? Ou, para voltarmos ao texto, 'toda imaginação dos pensamentos de seu coração são tão somente maus, e isto, continuamente?'. Se admitir isto, você estará longe de ser um cristão. Negar isto, você, ainda assim, será um ateu.   


3. Nós podemos aprender isto, em Terceiro Lugar, qual é a natureza própria da religião; da religião de Jesus Cristo. A terapia da alma é o método de Deus para curar uma alma que está assim doente. Por isto, o grande Médico das almas aplica medicamentos para curar esta enfermidade, para restaurar a natureza humana, totalmente corrupta, em todas as suas faculdades. Deus cura todo o nosso Ateísmo, através do conhecimento de Si Mesmo, e de Jesus Cristo, a quem Ele enviou; nos fortalecendo na fé, uma evidência e convicção divina de Deus, e das coisas de Deus, -- em específico, desta importante verdade, 'Cristo me amou – e deu a Si mesmo por mim'. Pelo arrependimento e mansidão de coração, a doença mortal do orgulho é curada; através da resignação, humildade e submissão agradecida à vontade de Deus, a vontade própria é curada; o amor de Deus sendo o remédio soberano para o amor do mundo, em todas as suas ramificações. Agora, isto é propriamente religião; é a 'fé', assim, 'operando através do amor'; operando a mansidão humilde genuína, a morte completa para o mundo, com o amor, e a aquiescência grata nele, e conformidade para com toda a vontade e Palavra de Deus. 


4. De fato, se o homem não tivesse, assim, caído, não haveria necessidade de tudo isto. Não haveria oportunidade para este operar no coração; este renovar no espírito de nossa mente. A superficialidade da religiosidade seria, então, uma mera expressão própria, assim como a 'superficialidade da perversidade'. Porque uma religião exterior, sem qualquer religiosidade, afinal, seria suficiente para todos os intentos e propósitos racionais. Assim sendo, seria suficiente, no julgamento daqueles que negam esta corrupção de nossa natureza. Eles fazem muito pouco mais da religião, do que o famoso Sr. Hobbes fez da razão. De acordo com ele, a razão é apenas 'uma bem organizada série de palavras': De acordo com eles, a religião é apenas uma bem organizada série de palavras e ações. E eles falam consistentemente consigo, mesmos, porque se o interior não for cheio de maldade; se isto já estiver limpo, o que permanece, a não ser 'a limpeza do exterior de uma xícara?'. A reforma exterior, se a suposição deles for justa, é de fato, alguma coisa necessária.  


5. Mas nós não temos aprendido assim dos oráculos de Deus. Nós sabemos que aquele que busca o que está no homem faz um relato diferente, tanto da natureza quanto da graça, de nossa queda e nossa recuperação.  Nós sabemos que a grande finalidade da religião é renovar nossos corações na imagem de Deus; reparar aquela perda total de retidão e santidade verdadeira, que nós mantivemos, por conta do pecado de nosso primeiro antepassado. Ainda assim, sabemos que toda religião que não responde a esta finalidade; toda sorte de interrupção disto, da renovação de nossa alma na imagem de Deus, em busca da similitude Dele que a criou, não é outra do que uma pobre farsa, e uma mera zombaria de Deus, para a destruição de nossa própria alma. Oh! Previna-se daqueles professores de mentiras, que impingiria isto sobre você, como Cristianismo! Não os leve em consideração, embora eles venham até você, com toda o engano da iniqüidade; com toda lisura da linguagem; toda decência; sim, beleza e elegância de expressão; todas as declarações de boa vontade sincera para com você, e reverência para com as Santas Escrituras. Mantenha o plano da velha fé, 'uma vez, entregue aos santos', e entregue pelo Espírito de Deus aos nossos corações. Conheça a sua enfermidade! Conheça a sua cura! Você nasceu no pecado: Por conseguinte, 'você deve nascer de novo'; nascer de Deus. Pela natureza, você é totalmente corrupto. Pela graça, você está totalmente renovado. Em Adão, todos morremos: No segundo Adão, em Cristo, todos fomos trazidos à vida. 'Você que estava morto nos pecados, Ele tem vivificado'. Ele já deu a você o princípio da vida; até mesmo a fé Nele, que o amou e deu a Si mesmo por você! Agora, 'vai de fé em fé', até que toda a doença será curada; e toda aquela 'mente que esteve em Jesus Cristo, esteja também em você'. 


[Editado por George Lyons da Northwest Nazarene College (Nampa, ID), para a Wesley Center for Applied Theology.] 


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